Por Fernando Exman | De Brasília
O governo Dilma Rousseff deu início a discussões com a indústria, o comércio e entidades que representam os consumidores para tentar frear o consumo de sacolas plásticas no país. Devido à falta de uma legislação específica sobre o assunto, o Executivo busca obter nesses debates subsídios para o "disciplinamento normativo" do uso sustentável do produto. Pelo menos por ora, as reuniões não ocorrem em clima de embate. Mas tampouco há um consenso: indústria e comércio têm posições divergentes. Integrantes da sociedade civil organizada defendem, por sua vez, fórmulas que não gerem maiores custos aos consumidores.
As discussões ocorrem mensalmente no âmbito de um grupo de trabalho criado pelo Ministério do Meio Ambiente no fim do ano passado. Desde o dia 30 de janeiro, o colegiado já se reuniu três vezes. Ele tem um prazo de seis meses, prorrogável uma vez por um igual período de tempo.
"O grupo vai trabalhar na base de recomendações", afirmou ao Valor uma autoridade do Ministério do Meio Ambiente, segundo quem o colegiado pode apresentar sugestões a projetos que já tramitam no Congresso ou elaborar a minuta de um anteprojeto a ser apresentado ao Parlamento. "A questão é a gente ultrapassar toda a discussão maniqueísta que envolve o assunto."
Além da falta de um marco regulatório nacional e da existência de leis estaduais e municipais divergentes sobre o assunto, não há estatísticas oficiais sobre a situação do setor de sacolas plásticas no país. Segundo dados apresentados pelos representantes da indústria no grupo de trabalho, o número de unidades consumidas pela população brasileira em 2012 foi de aproximadamente 12 bilhões, ou 0,2% dos resíduos sólidos do país. Em 2011, o consumo teria sido de 13,2 bilhões de sacolas.
Em contraste, a Associação Brasileira de Supermercados (Abras) estimou em 13,9 bilhões de unidades o consumo de sacolas plásticas no Brasil em 2011. Segundo relatos de participantes dos encontros, alguns representantes do comércio chegaram a defender o fim da distribuição gratuita das sacolas plásticas. Representantes de redes varejistas argumentaram que as sacolas produzidas no Brasil são mais caras que as importadas. Ressaltaram também que os consumidores precisam se conscientizar que usar sacolas plásticas de material não reciclado para embalar lixo representa um desperdício. Integrantes do colegiado relataram ainda que, segundo os representantes do comércio, a simples cobrança pelas sacolas mudaria os hábitos de consumo no Brasil.
"O primeiro passo é a conscientização", disse ao Valor Adriano Manoel dos Santos, diretor da Abras e coordenador do comitê de sustentabilidade da entidade. "A Abras é a favor de uma distribuição que não prejudique o meio ambiente, mas não é a favor de abolir as sacolas."
Um acordo fechado entre a Abras e o Ministério do Meio Ambiente busca a redução do consumo de sacolas plásticas em até 40% entre 2010 e 2015. Em 2010, tal consumo nos supermercados foi de 14,9 bilhões de unidades. Sem medida alguma para atenuar esse quadro, o setor estima que o consumo chegaria a 16,5 bilhões de sacolas em 2015. A conta considera uma expectativa de crescimento de vendas de 2% ao ano.
Para neutralizar os argumentos das redes varejistas, a indústria tem ponderado que as bases da discussão devem se dar a partir do lema "reduzir, reutilizar e reciclar". O setor produtivo argumenta que o problema é o descarte inadequado, acrescentando que o desafio do país é criar as normas técnicas necessárias ao aumento da capacidade de transporte dessas embalagens. A ideia é que os clientes do comércio varejista não precisem usar mais de uma sacola para carregar os produtos adquiridos, iniciativa que reduziria o desperdício. Para a indústria, as sacolas reutilizáveis feitas de pano são menos higiênicas para o transporte de alimentos, argumento refutado pelos comerciantes e ambientalistas.
A indústria de embalagens plásticas flexíveis argumenta ainda que a produção de sacolas consome menos energia que a de embalagens de alumínio, aço e vidro, além de não produzir desmatamento. Os industriais sustentam que as sacolas plásticas são "inertes". Ou seja: só acabam em locais indevidos e prejudicam o meio ambiente se o descarte for inadequado. Além disso, alertam os porta-vozes do setor produtivo no grupo de trabalho, o eventual banimento das sacolas plásticas eliminaria uma cadeia importante da indústria nacional.
"É interessante a gente ter a possibilidade de discutir um marco legal", ponderou Wanderley Baptista, especialista de política e indústria da Gerência de Meio Ambiente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), lembrando que hoje há leis diferentes em Estados e municípios sobre o assunto. "Isso cria uma insegurança para a indústria."
Todos os lados envolvidos citam a Política Nacional de Resíduos Sólidos como um avanço na chamada "logística reversa" do lixo produzido no país. Mesmo assim, a destinação desse tipo de embalagem continua sendo uma preocupação do Ministério do Meio Ambiente. A pasta considera a sacola plástica um problema por seu papel como "fator agravador de enchentes", na morte de animais aquáticos, na poluição visual das cidades e por dificultar a degradação de resíduos úmidos e orgânicos descartados pela população.
O Congresso também debate o assunto. Tramitam na Câmara e no Senado diversos projetos que buscam assegurar a distribuição de sacolas sem custos adicionais aos consumidores, proibir o seu fornecimento por estabelecimentos comerciais ou substituir esse tipo de embalagem por produtos ecológicos.
Enquanto isso, as entidades de defesa dos direitos dos consumidores acompanham a pauta com o objetivo de evitar maiores prejuízos ao usuário final. Segundo João Paulo Amaral, pesquisador do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a cobrança pelo uso de sacolas nos supermercados não fere a legislação. Por outro lado, essa cobrança precisa ser devidamente divulgada e os clientes não podem ser surpreendidos ao chegarem aos caixas. Uma proposta interessante, diz Amaral, é a concessão de descontos aos clientes que não demandarem as sacolas na hora de embalar as suas compras. "O que deve ser considerado no grupo de trabalho é um modelo de cobrança justo", disse o pesquisador do Idec.
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