“Não me sinto cúmplice”, diz fotógrafo de ´suicídio` de Herzog

Fonte: Portal da Câmara Municipal de São Paulo

“Não me senti cúmplice, mas me senti muito mal”. Assim respondeu Silvaldo Leung Vieira, fotógrafo que registrou a imagem forjada de Vladimir Herzog na prisão, durante o regime militar, aos questionamentos em relação a um possível remorso diante do que fez. Em seu depoimento à Comissão da Verdade nesta terça-feira (28/5), o santista radicado em Los Angeles disse que se arrepende do que fez, e que hoje vê que “poderia ter sobrevivido de outras formas”.

Foi esse sentimento diante do que viveu desde que ingressou na escola de fotografia da Academia de Polícia de São Paulo que fez Silvaldo deixar o país, tão logo juntou algum dinheiro. “Passei três anos focado em me desvincular daquele trabalho”, lembrou. Quando conseguiu, pegou férias e não voltou mais. “Foi abandono de serviço. Acredito que isso tenha me fechado portas”, observou.

Antes de partir, ele ainda fotografou mais vítimas da repressão na Grande São Paulo e em Santos. Quando se recusou a fazer o serviço, foi suspenso. “Fiquei 30 dias sem entregar fotos, está tudo no meu prontuário”, disse. Sobre a foto de Herzog, ele confessou sentir “nojo” do que viu ali. Ele teve certeza, desde o início, que não se tratava de “encontro de cadáver”, como haviam explicado, e sim de uma cena montada, e comentou isso com colegas e familiares na época.

Segundo Vieira, desde o início deixaram claro que se tratava de uma tarefa sigilosa, tanto que ele não pode se movimentar pela sala em que estava o corpo do jornalista, nem fotografar outras dependências do DOI-Codi. Em visita ao local nesta segunda-feira (27/05), ele não conseguiu reconhecer onde a cena ocorreu.

Corpo inimigo

O jornalista Sérgio Gomes, que, assim como Vladimir Herzog, esteve preso no DOI-Codi em outubro de 1975, depôs à Comissão da Verdade nesta terça-feira. Gomes foi uma das testemunhas no processo que a família de Vlado moveu em 1978, para que a União fosse responsabilizada pela sua morte.

Gomes contou que, quando esteve preso, sofreu choques com a cabeça coberta por um capuz embebido em amoníaco. “A pessoa fica confusa, incontrolável e é obrigada a inalar aquilo”, explicou. “É uma aflição máxima, pois seu maior inimigo é seu corpo, que faz algo diferente do que a cabeça manda”.

Para ele, Herzog sofreu o mesmo tipo de tortura. “Vivi isso e senti me aproximar de situação limite. Disse e reafirmo que Vlado morreu nessas circunstâncias, porque uma forma de se livrar da loucura é morrendo”, afirmou. Na época do processo, ele chegou a propor a exumação do jornalista, para que se analisasse a presença de amônia no corpo. (Thais Lancman)

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