“Empresários e protestos ameaçavam concorrência de ônibus em SP” – Folha de S.Paulo

Mario Cesar Carvalho e André Monteiro, de São Paulo
 
Pressionado pelas manifestações de rua e pelos empresários de ônibus, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), decidiu cancelar a licitação do transporte público, negócio estimado em R$ 46 bilhões por 15 anos.
 
O contrato seria o maior da história da prefeitura.
 
Os empresários ameaçavam boicotar a licitação e entregar "envelopes em branco", o que poderia resultar até na falta de ônibus nas ruas.
 
Segundo a Folha apurou, as empresas calculavam que a licitação diminuiria seus ganhos em cerca de 10%.
 
Com a licitação de 2003, cujos contratos vigoram até 17 de julho, cada ônibus rende R$ 38 mil por mês. A nova licitação derrubaria o valor para R$ 35 mil, segundo as empresas.
 
Já os manifestantes do Movimento Passe Livre cobravam a abertura do que chamam de "caixa preta" do setor. Há também as pressões da investigação do Ministério Público sobre as empresas e da articulação para abertura da CPI do transporte na Câmara.
 
Nesse cenário, Haddad decidiu dividir o ônus da concorrência com um Conselho Municipal de Transportes, a ser criado para discutir, entre outros pontos, regras da licitação. Ele será composto por usuários, empresários e governo.
 
A dificuldade em mudar o sistema esbarra na falta de concorrência. O setor é dominado há anos por poucas empresas familiares –principalmente pelas do grupo do empresário português José Ruas Vaz.
 
O edital da nova concorrência foi lançado em junho, após uma única audiência pública.
 
Inicialmente a prefeitura queria reduzir de oito para três o número de lotes da concessão, mas desistiu ante a reclamação dos empresários, que teriam que se organizar em novos consórcios.
 
O Movimento Passe Livre também questionava o fato de um negócio bilionário ser fechado com a realização de apenas uma audiência.
 
As empresas que prestam serviços hoje terão seus contratos prorrogados até a conclusão de um novo certame –não prazo definido.
 
O principal foco da licitação era aumentar a qualidade nos serviços de ônibus.
 
Para reduzir o desconforto, a prefeitura criou uma nova fórmula de remuneração das empresas. Hoje, o pagamento é feito exclusivamente pelo número de passageiros transportados, o que favorece maior lotação.
 
A entidade que representa as empresas disse que não iria comentar o cancelamento.
 
Para o presidente da NTU (associação nacional das empresas), Otavio Cunha, Haddad agiu motivado pela pressão política, mas o setor dificilmente teria a ganhar discutindo a licitação enquanto a tarifa é alvo de protestos.
 
"O momento não é oportuno, porque o setor foi colocado na berlinda. Um açodamento poderia implicar até na continuidade dos serviços. Está todo mundo querendo aparecer, sejam os políticos, sejam aqueles à frente dos movimentos", disse.
 
Colaborou JOSÉ ERNESTO CREDENDIO
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