“André Franco Montoro Filho: O custo da (falta de) mobilidade urbana” – Folha de S.Paulo

Uma das mais importantes razões dos protestos que mobilizaram a população é a morosidade dos deslocamentos urbanos na região metropolitana de São Paulo.
 
Mas, afinal, qual é o custo dessa lentidão? Não é muito difícil fazer um cálculo aproximado.
 
De início, estima-se quanto tempo, em média, é perdido por causa dos congestionamentos. Esse é um tempo produtivo perdido, pois o trabalhador já saiu de sua residência, mas não começou a trabalhar.
 
Algumas pesquisas indicam que, na região metropolitana de São Paulo, o tempo médio gasto na locomoção da residência ao emprego e retorno é superior a duas horas. Para muitas pessoas, chega ao absurdo de três horas ou mais.
 
Podemos aceitar como tempo normal, com muita boa vontade, uma hora diária. Assim, o tempo médio perdido com os congestionamentos em São Paulo é superior a uma hora por dia. Sendo a jornada de trabalho igual a oito horas, é fácil verificar que o tempo perdido é cerca de 12,5% da jornada de trabalho.
 
Para calcular o valor monetário desse tempo perdido, deve-se verificar o valor da produção da região. Estima-se que seja de 18,9% do PIB nacional. Sendo que este, em 2012, foi de R$ 4,4 trilhões, a produção na Grande São Paulo foi superior a R$ 800 bilhões. Desse total, cerca de 65% é devido ao fator trabalho, o que representa mais de R$ 500 bilhões. Assim, o valor monetário do tempo perdido é 12,5% desse valor, ou seja, R$ 62,5 bilhões por ano.
 
Esse é o custo social anual da lentidão do trânsito em São Paulo.
 
Também é possível calcular quanto cada trabalhador paga pelo tempo perdido. De acordo com o IBGE, em março de 2013, o rendimento médio mensal recebido na Grande São Paulo foi de R$ 1.995,90. A esse montante é preciso adicionar o valor dos encargos sociais.
 
Segundo o professor José Pastore, esses encargos somam 102,06%, de forma que podemos, conservadoramente, calcular em R$ 4.000 o valor mensal dos salários mais encargos em São Paulo. Isso se traduz em quase R$ 17 a hora trabalhada –R$ 4.000 divididos por 30 dias de oito horas.
Como o tempo perdido no trânsito é superior a uma hora, podemos afirmar que cada trabalhador paga pelo tempo perdido R$ 20 por dia.
 
Esse é o "pedágio invisível" já cobrado. Só que ele é tremendamente injusto, pois paga quem usa carro particular viajando sozinho e paga quem anda espremido em um transporte público. E é um dinheiro/custo perdido para a sociedade.
 
Se conseguirmos reduzir a quantidade de veículos em circulação, os congestionamentos diminuiriam.
 
Algumas iniciativas, como o rodízio, os corredores para ônibus, a proibição de circulação de automóveis ou caminhões em determinadas áreas ou horários, procuram reduzir a circulação de veículos. Mas tais soluções são parciais, insuficientes e ineficientes.
 
A solução abrangente é cobrar um pedágio urbano pelo uso de vias públicas congestionadas para reduzir a circulação de veículos. Ao mesmo tempo, utilizar recursos arrecadados para investimentos no transporte público, especialmente o metrô.
 
Um efeito fundamental dessa medida seria a maior fluidez do trânsito. Os ônibus passariam a circular com maior velocidade. Isso representaria substancial redução no seu custo de operação e, assim, viabilizaria expressiva redução no valor das passagens.
 
Toda mudança envolve custos e coragem. Os custos são mais do que compensados pelos benefícios da eliminação dos congestionamentos. E a coragem que os manifestantes mostraram é a que pedimos para os nossos governantes.
 
ANDRÉ FRANCO MONTORO FILHO, 69, doutor em economia pela Universidade Yale (EUA), é professor titular de economia do setor público da USP. Foi secretário estadual de Economia e Planejamento de SP (1995-2002) e presidente do BNDES (1985-1988)
 
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