Por Eduardo Geraque para a Folha de S. Paulo
No curto prazo, redução de consumo e chuvas torrenciais são as únicas soluções para evitar um colapso
O uso do volume morto do sistema Cantareira, uma das saídas cogitadas pelo governo de São Paulo para evitar o racionamento de água em parte da Grande São Paulo, não será tecnicamente viável antes de aproximadamente seis meses e pode custar caro, segundo especialistas.
Volume morto é o estoque das represas que só pode ser utilizado com o auxílio de técnicas que exigem obras.
Ou seja, para usar essa água –que tem muito lodo e está no fundo dos reservatórios, abaixo dos dutos de captação– será preciso instalar equipamentos.
Para técnicos, isso levará até o meio deste ano.
Ontem, o nível do Cantareira chegou aos 16,8% de sua capacidade.
Alguns técnicos, em conversas reservadas, defendem a tese de que o governo deveria começar a fazer um racionamento brando.
A ideia de sugar o fundo das represas, que abastecem quase 15 milhões de pessoas na Grande São Paulo e na região de Campinas, está cada vez mais cristalizada dentro do governo paulista.
O próprio governador Geraldo Alckmin (PSDB) disse que deu ordem para que tudo fique pronto até o inverno, caso seja necessário realmente secar as represas.
Mesmo que o martelo seja batido, não é uma solução mágica para resolver a crise atual de falta de água no curto prazo, dizem os técnicos.
Apesar de considerar o uso do volume morto uma estratégia importante, o pesquisador Rubem La Laina Porto, da Escola Politécnica da USP, diz que o "governo não pode relaxar as medidas de contenção de consumo".
O sistema Cantareira está sendo operado no alto risco. Isso significa que as chuvas e a economia da população são mais importantes no curto prazo que o volume morto, que nunca foi usado antes.
Outra questão técnica a ser resolvida, diz Malu Ribeiro, da Rede das Águas da ONG SOS Mata Atlântica, é quanto tempo vai demorar para que o sistema seja recuperado, se toda a água das represas for usada neste ano.
"As represas do sistema Cantareira têm muitas áreas ao redor delas que estão desmatadas. Isso favorece a erosão, por exemplo, e prejudica muito o armazenamento de mais água", diz.
Outro problema grave é o lançamento desenfreado de esgotos nos rios e represas. "A represa Billings, se não fosse poluída, seria uma grande alternativa ao Cantareira. O que sai mais caro? Preservar a mata ou despoluir as águas?"
Matéria originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo