Por Letícia Casado, do jornal Valor Econômico
Na noite de sexta-feira, 2 de maio, cerca de 15 ônibus saíram de diferentes acampamentos do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) em São Paulo em direção a um terreno perto do estádio de Itaquera, na zona leste. No fim de semana, moradores do bairro deixaram suas casas e se juntaram ao acampamento. Quando o Valor visitou o local, quinta-feira, 2,5 mil pessoas estavam acampadas, disse Guilherme Boulos, líder do MTST.
O movimento pleiteia a desapropriação do terreno, que pertence à incorporadora Viver. A inclusão de uma emenda que classifique a área como de "interesse social" no Plano Diretor é uma das bandeiras do MTST, que promete pressionar os vereadores até a segunda votação do plano.
Foi o que o MTST fez pela Nova Palestina, na zona sul. No dia da primeira votação do plano, o grupo protestou em frente à Câmara. O ato terminou em confronto com a polícia e a votação foi adiada. Na véspera da nova sessão, o MTST fez uma vigília na Câmara. E conquistou a inclusão da área como "de interesse social" no Plano Diretor.
A pressão do MTST em Itaquera já resultou em reunião marcada às pressas pela presidente Dilma Rousseff em São Paulo na semana passada – ela ouviu as demandas do movimento. E a Justiça adiou a reintegração de posse do terreno.
Itaquera ganhou o estádio da Copa do Mundo e obras viárias, e os preços subiram. Agora, estão incompatíveis com a renda de muitas famílias, dizem os sem-teto. Elisângela Duarte, 33, tem duas filhas, está desempregada e paga R$ 450 de aluguel em Itaquera. Ela diz não encontrar lugar mais barato para morar no bairro e decidiu acampar com o MTST.
O MTST critica a valorização por falta de planejamento. A especulação imobiliária estaria empurrando famílias carentes para regiões periféricas. O metro quadrado para aluguel de imóvel residencial com dois cômodos custa até 20% a mais em Itaquera do que em São Miguel Paulista e 45% a mais do que em São Mateus, segundo dados de março do Secovi-SP.
A inflação obrigou Alexandre Bezerra, 32, a deixar o aluguel de R$ 550 em Itaquera e mudar com esposa e filhas para a casa do sogro – são três cômodos e, agora, nove pessoas. Bezerra deixou a família e acampou no terreno da Viver.
Batizado de "Copa do Povo", o acampamento reúne inúmeras histórias como as de Elisângela e Bezerra. O repórter da TV alemã RTL, Benjamin Fuchs, visitou o local; segundo ele, os alemães ficaram curiosos sobre "o outro lado do Brasil" que emergiu nos protestos de 2013. A violência retratada em fotos que rodaram o mundo despertou o telespectador europeu, pois brasileiros deixaram o futebol da Copa das Confederações para ir às ruas, diz Fuchs.
Matéria publicada originalmente no jornal Valor Econômico.