Por Eduardo Geraque
Um volume de água equivalente a metade da vazão atual do sistema Cantareira é retirado do subsolo da Grande São Paulo a cada segundo.
Enquanto os cerca de 12 mil poços artesianos da região bombeiam 10 m³ de água por segundo, a Sabesp retira hoje 21 m³ por segundo do Cantareira para abastecer quase 9 milhões de pessoas. Antes da crise, a retirada dos reservatórios era de 31 m³/s.
Os dados revelam que a água subterrânea é hoje o quarto maior manancial usado em São Paulo –considerando-se também reservatórios superficiais da Sabesp e a água estocada entre rochas.
Como existem estimativas de que a quantidade de água retirada dos aquíferos (reservatórios subterrâneos) da Grande São Paulo poderia até dobrar, especialistas apontam que os poços artesianos devem ser considerados nas discussões sobre o problema de abastecimento de água.
"A saída passa pelo uso integrado de reservatórios superficiais e subterrâneos", diz o geólogo Ricardo Hirata, professor da USP e um dos principais especialistas em águas subterrâneas do país.
Segundo Hirata, o poder público e os órgãos envolvidos no tema dão pouca atenção aos poços artesianos, que em geral são mantidos por usuários privados.
"Precisa haver uma atuação mais forte para ajudar aqueles que queiram usar a água subterrânea", diz o pesquisador. "Os poços não podem ser administrados pelo poder público, é inviável. Mas o produtor privado precisa de orientação e fiscalização."
De acordo com Hirata e o hidrólogo Waldir Costa Filho, presidente nacional da ABAS (Associação Brasileira de Águas Subterrâneas), a situação atual não é positiva.
Para eles, a falta de cuidado com o tema permite que empresas pouco sérias apareçam e sobrevivam.
"Poço é poço. É diferente de um furo qualquer, que pode resultar em vários problemas, inclusive em água contaminada", afirma Costa Filho, que vive em Recife.
Segundo ele, é comum que condomínios residenciais, por exemplo, não se preocupem com a qualidade de seus poços, mas sim com o preço do serviço a ser realizado.
"Várias cidades, como Recife, Fortaleza, Maceió e Mossoró, estão buscando soluções nas águas subterrâneas, mas é preciso que isso seja feito com qualidade", diz.
De acordo com Hirata, além de contaminação da água, há o risco de rebaixamento de um aquífero se ele for muito usado. "Isso já acontece em algumas áreas, como na zona oeste da Grande São Paulo. Como existem muitos poços, o risco de o lençol freático ficar mais baixo é maior", diz.
Com uma fiscalização frágil e inexistência de regras claras, o setor de águas subterrâneas vive na ilegalidade, dizem os especialistas.
"A estimativa, hoje, é que 60% dos poços artesianos na zona metropolitana sejam ilegais", estima Hirata.
Em São Paulo, é preciso obter no Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) uma licença para perfuração e utilização de poço artesiano.
Matéria originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo