Queda brusca de volume do Rio Atibaia obrigou cidade a pedir ‘socorro’ para DAEE e ANA
Por Ricardo Brandt
A liberação emergencial de mais água do Sistema Cantareira para o interior evitou que Campinas – com mais de 1 milhão de habitantes – tivesse de entrar em racionamento a partir desta semana.
A Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) foi obrigada, desde o domingo, 22, a aumentar em 30% o volume de água que as represas do sistema deixam correr rio abaixo para suprir uma queda abrupta registrada no nível do Atibaia – manancial que abastece 95% de Campinas. A medida agrava o cenário de escassez hídrica na Região Metropolitana de São Paulo – onde 47% usam o Cantareira. Nesta terça-feira, 24, os reservatórios atingiram 21,7% da capacidade (somando o “volume morto”).
A queda repentina do nível do Rio Atibaia começou a ser verificada na sexta, quando a vazão média era de 5,25 mil litros de água por segundo, volume suficiente para abastecer Campinas, que usa 3,7 mil litros de água por segundo. No sábado, a vazão caiu para 4,6 mil litros por segundo e chegou ontem a 4,1 mil litros por segundo. Abaixo disso, a cidade não teria opção, a não ser iniciar o rodízio.
No fim de semana, a Agência Nacional de Água (ANA) e o Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE), em uma resolução conjunta, atenderam pedido da Sanasa e determinaram que no domingo o volume de água que o Cantareira manda para o interior paulista subisse de 3 mil litros por segundo para 4 mil litros por segundo.
O adicional evita o racionamento em Campinas no momento, mas não afasta riscos de racionamento futuro. Ontem, a vazão do Atibaia continuava baixa porque o volume a mais liberado só chegará ao ponto de captação da Sanasa hoje. A liberação extra é emergencial, não tem prazo de validade e deve ser revista, assim que acabar o risco de desabastecimento.
Em Campinas choveu no mês de maio quase um terço da média esperado para o mês. Em junho, choveu 8,9 milímetros de água, quando a média prevista para o mês todo era de 47,2mm.
O DAEE e a Sanasa começaram a investigar a queda de água no Atibaia. A Sanasa, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que o problema havia sido registrado em outros momentos neste ano. A empresa ressaltou que, juntamente com o DAEE, vai tentar identificar possíveis captações clandestinas no sistema e em seus afluentes, que pode ser feita por indústrias ou agricultores. Um sobrevoo de helicóptero será realizado para ajudar nessa busca.
Uso alternado
Prevendo um agravamento da crise no Cantareira durante o pico da estiagem (entre julho e setembro), o Consórcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ) – entidade que representa empresas e prefeituras usuárias da água – vai apresentar uma proposta hoje, de acordo para uso alternado da água.
Pela proposta, que será discutida em reuniões na Refinaria Replan, em Paulínia, e amanhã, em Americana, cada setor usaria água por um período determinado do dia, sem ocorrerem retiradas simultâneas. A medida tem de ser aceita pelas empresas e agricultores e ser aprovada pelos órgãos gestores do sistema.
O diretor do Departamento de Hidrologia da Faculdade de Engenharia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Antônio Carlos Zuffo, apresentará no encontro uma simulação em que mostrará que, a partir da próxima semana, o Cantareira terá zerado seu volume útil – passando a depender exclusivamente do volume morto.
Em cem dias, segundo seus cálculos, essa água do fundo das represas secará, caso a queda diária permaneça como está hoje. “Se considerarmos o sistema do Cantareira sem o ‘volume morto’, ele deve zerar entre os dias 6 e 8. No nível de queda que tem sido registrado, de 0,18 (mil litros de água por segundo), em cem dias, essa água extra também poderá acabar”, afirmou Zuffo.
Na pior seca já registrada em São Paulo, cálculo do Consórcio do PCJ indica que desde o início do ano choveu 300mm a menos do que a média histórica esperada para o período.
Sem risco
A Sabesp informou que cumpre determinações da ANA e do DAEE e a água do “volume morto”, mais as medidas adotadas de incentivo ao uso racional e redistribuição dos recursos dos demais sistemas serão suficientes para a demanda.
Matéria originalmente publicada no jornal O Estado de S. Paulo