O Plano Diretor pensa a cidade para diminuir o uso de veículos. Já o governo federal anuncia medidas de incentivo a sua venda.
Enquanto os vereadores de São Paulo votavam, nesta segunda-feira, um plano urbanístico para incentivar o uso do transporte, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciava uma vez mais que o governo federal abre mão de parte do imposto cobrado sobre a venda de automóveis para mantê-los a um preço atraente ao consumidor. Num ano de PIB baixo e de geração de emprego nem tão generosa, a medida pretende minorar os impactos negativos que representam a queda de 7,56% nas vendas de carro entre janeiro e junho deste ano, uma notícia preocupante para um país dependente do setor automobilístico.
O Governo fatura com a venda de veículos, uma vez que ao menos 30% do preço do carro corresponde a impostos diretos, que engordam a arrecadação nacional. Mesmo com a queda do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI), que teve seu desconto estendido nesta segunda-feira, o caixa do Governo sobe com a melhora nas vendas de veículos, uma vez que outros tributos federais continuam sendo cobrados integralmente. Por isso, a equipe econômica de Dilma Rousseff achou por bem estender o desconto do IPI, que começou a ser dado no final de 2008, quando tomava forma o furacão financeiro que assolou o mundo com a crise que estourou nos Estados Unidos naquele ano.
Seis anos atrás, no entanto, a solução adotada fazia todo sentido. Ao invés de recuar, e encarar fórmulas austeras, o Governo Lula avançou com os incentivos para inverter a curva de pessimismo global daquele momento. E deu certo. A indústria bateu recorde de vendas, precisou contratar gente em meio à crise para dar conta dos pedidos, e o PIB em 2009 caiu 0,2% (muito menos que o resto do mundo), para avançar 7,5% no ano seguinte – a indústria avançou fantásticos 10,5% em 2010.
O benefício macroeconômico, porém, está diretamente ligado ao prejuízo social encarado agora nas grandes cidades. O aumento da venda de carros, que praticamente dobrou entre 2006 e 2013, provocou os engarrafamentos monstruosos que afetam em especial os paulistanos, uma vez que o transporte público continua avançando a passos de tartaruga numa metrópole de 11 milhões de habitantes. Foi essa uma das fagulhas que acendeu o barril de pólvora das manifestações do ano passado, e colocou na cartilha de todos os discursos políticos deste ano as soluções urbanas.
A sociedade do século XXI rechaça o carro como de centro do universo das cidades. Exatamente a distorção que o Plano Diretor tenta desfazer agora. Como fechar essa conta?
Matéria originalmente publicada no jornal El País