Por Vandson Lima e Raquel Ulhôa
Reforma tributária no primeiro ano de governo. Vaga garantida em escolas de tempo integral a todas as crianças e jovens do país em quatro anos. Essas duas ambiciosas promessas, feitas pelo candidato do PSB à Presidência, Eduardo Campos, provocaram os mais entusiasmados aplausos da militância da sigla quando da convenção partidária que confirmou sua candidatura, no dia 28.
Quem ouviu, deve guardá-las com zelo, pois tais propostas não foram incluídas nas diretrizes gerais registradas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pela chapa cinco dias depois, na quinta-feira. Não é uma situação incomum: a entrega de documentos apinhados de generalidades e que destoam daquilo que os candidatos dizem no dia a dia de campanha é uma constante no momento do registro de candidatura.
Fortalecimento, reestruturação, estímulo. Os termos permeiam todos os documentos registrados, com raros compromissos marcados com datas ou metas. É tudo tão parecido que provavelmente ninguém, nem os próprios formuladores das diretrizes, notariam qualquer diferença se fossem embaralhados trechos dos documentos relativos a Direitos Humanos ou desenvolvimento regional, por exemplo. "Estímulo à implantação de Agricultura de Baixo Carbono", soa como algo do programa de Eduardo de Marina. Mas está no de Aécio Neves (PSDB), que também falou em apresentar um modelo de reforma tributária no primeiro semestre de governo, o que não aparece no documento. "Rigor da gestão fiscal, (…) incentivo ao investimento privado e fortalecimento das parcerias entre Estado e iniciativa privada'' parece conversa de tucano, mas está no programa da presidente Dilma Rousseff.
Ao lado do coordenador-geral do seu programa de governo, Antonio Anastasia, Aécio anunciou que as diretrizes registradas no TSE representariam apenas o início de um "debate enorme" com a sociedade sobre o programa de governo que pretende adotar, caso seja eleito. Ou seja, o documento registrado deve ser visto apenas como uma espécie de carta de intenções.
Nela, Aécio prega autonomia operacional do Banco Central, "que irá levar a taxa de inflação à meta de 4,5% ao ano''. Quando? Não diz. Promete transformar o Bolsa Família em política de Estado, incorporando-o à Lei Orgânica de Assistência Social; investimento massivo no acesso e qualidade dos serviços de saúde, saneamento básico, educação; manutenção e ampliação de programa habitacional nos moldes do Minha Casa Minha Vida e redução da carga tributária sobre exportações também constam nas diretrizes, mas a propalada reforma não ocupa meia página das 76 do documento.
No caso de Dilma, as diretrizes assumem caráter retrospectivo e comparativo ao cenário de 2002, anterior ao governo petista. O documento, mais enxuto (25 páginas), dedica-se em sua maior parte (15 páginas) a rememorar todas as ações dos governos Dilma e Lula, para então postular: "Estamos lançando um novo ciclo histórico de prosperidade, oportunidades e de mudanças'' a ser realizado em uma nova gestão. "Para nós é urgente e necessária uma ampla e profunda reforma política cujo objetivo é resolver as distorções do nosso sistema representativo. Para assegurá-la será imprescindível a participação popular, por meio de um plebiscito que defina a posição majoritária sobre os principais temas''. E para por aí. Nenhum planejamento nesse sentido é exposto.
A diretriz da candidatura petista diz ainda que "para mudar ainda mais o Brasil, propomos enfrentar o desafio da realização de uma reforma federativa que defina melhor as atribuições dos entes federados – União, Estados e Municípios'', compromisso também presente nos documentos dos outros dois candidatos.
No caso do PSB, o documento de 60 páginas varia entre passagens bem-intencionadas, mas pouco conclusivas, (como "as políticas sociais devem contribuir de modo decisivo para o combate das desigualdades, para a melhoria da distribuição de renda e riqueza, para a ampliação da felicidade") a outras francamente incompreensíveis: "modernizar estruturas organizacionais departamentalizadas, transformando-as em matriciais e orgânicas", em trecho relativo à reforma da administração pública.
A ausência de previsão legal sobre punição ao não cumprimento das metas contribui para a situação. Por um dispositivo incluído em 2009 na Lei Eleitoral (Lei nº 9.504, de 1997), quem concorre a prefeito, governador e presidente da República é obrigado a apresentar suas propostas ao registrar as candidaturas (prazo encerrado no dia 5).
Matéria originalmente publicada no jornal Valor Econômico