Adensar e verticalizar o centro surge como aposta, mas técnicos defendem restringir espaço dos automóveis.
Por Valéria França
Longas filas de carros e ônibus em vias congestionadas virou cenário recorrente em centros urbanos do Brasil. Belém, Salvador e Rio de Janeiro são cidades que possuem problemas de mobilidade parecidos com os paulistanos. “Há dez anos, isso era questão quase exclusiva de São Paulo”, diz Ailton Brasiliense, presidente da Associação Nacional de Transportes Públicos. “Nesse período, a frota brasileira de veículos dobrou.” Hoje há 70 milhões de carros circulando no Brasil.
São Paulo e Rio de Janeiro investem mais em trens metropolitanos para desafogar as ruas do que outras capitais. A malha paulistana tem 260,7 km de trilhos, quase 9 km a menos que a carioca. Utilizam o metrô em São Paulo 4,5 milhões de pessoas diariamente – e a rede está em expansão.
“A capital paulista também tem muito ônibus, mas são mal distribuídos”, diz Brasiliense. Em algumas regiões, eles passam seguidamente, em outras, os intervalos ultrapassam meia hora. A Fundação Getúlio Vargas calculou o prejuízo dos moradores da cidade em horas produtivas perdidas. De 2002 para 2010, o prejuízo subiu de R$ 10 bilhões para R$ 30 bilhões.
Habitação
Para resolver o problema da mobilidade a capital paulista agora começa a apostar numa outra organização de cidade. O novo Plano Diretor, aprovado mês passado, estimula o adensamento em regiões centrais, e no entorno de estações de metrô e trem. Prevê moradias verticalizadas, mistas, para diferentes faixas sociais, além de comércio e serviços.
“É o efeito bumerangue. Primeiro os gestores empurraram os cidadãos para longe do centro, agora, querem trazê-los de volta”, diz Regina Meyer, do Laboratório de Urbanismo da Metrópole (Lume), da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. “Será preciso analisar com seriedade se a infraestrutura desses locais comportam tal adensamento. Tem que planejar direito para não causar outro problema.”
A ideia é aproximar o trabalho da residência. A média de tempo do deslocamento do paulistano da casa para o emprego é de 42,6 minutos. Quem mora em Francisco Morato, na zona leste, leva mais de uma hora. Além de ser uma cidade espalhada, São Paulo tem um traçado de ruas desorganizado.
Com modelo de vias parecido com o de Buenos Aires, Curitiba virou exemplo de mobilidade urbana. “O desenho permite que o deslocamento de carros e coletivos por ruas paralelas que seguem para o mesmo destino”, diz Brasiliense.
“O desafio das cidades brasileiras e o maior medo dos governantes é pedir de volta o espaço que os carros ocupam”, diz Ricky Ribeiro, presidente do Mobilize. “Os motoristas foram mimados por vários gestores. Hoje o carro é um modelo antieconômico.” Ribeiro aponta como exemplo de sucesso Nova York. “Na última década, pintou faixas exclusivas de ônibus, criou praças em antigos estacionamentos, melhorou as calçadas e implantou uma extensa rede de ciclovias, com 410 km. A cidade melhorou.”
Matéria originalmente publicada no jornal O Estado de S. Paulo