Uso de água para fazer comida e higiene é prioridade, mas poder público tem que admitir escassez. Apesar da crise, poucos municípios decretaram estado de emergência — medida que pode ter um alto custo político
Por HELOISA BRENHA, da Folha de São Paulo
Principal argumento do governo de São Paulo para diminuir o envio de água ao rio Paraíba do Sul, a prioridade ao consumo humano é prevista por lei, mas em casos oficiais de escassez hídrica.
"Isso depende de cada município decretar estado de emergência. Enquanto eles não fazem isso, a situação é tida como normal", afirma o professor da Unicamp Antonio Carlos Zuffo.
Ele se refere à lei 9.433 de 1997 –que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e é citada pelo governo do Estado para defender a limitação do volume de água ao rio Paraíba do Sul.
A lei diz que, quando há escassez, a água deve ter prioritariamente dois fins: atender o "consumo humano" e saciar a sede de animais.
"Consumo humano significa fornecer um volume de água mínimo suficiente às atividades básicas, como preparar alimentos e manter a higiene", explica o professor.
Apesar da crise que atinge o Estado desde o início do ano, poucos municípios decretaram estado de emergência até agora. Dois deles foram Tambaú e Casa Branca –no interior paulista, com menos de 30 mil moradores cada.
Especialistas avaliam que assumir estado de emergência pode ter um custo político alto tanto para prefeitos como para o governador Geraldo Alckmin (PSDB), que tenta a reeleição neste ano.
Isso porque os políticos poderiam ser responsabilizados por não terem tomado medidas contra o risco de colapso.
Segundo o professor do Instituto de Energia e Ambiente da USP Celio Bermann, as implicações políticas da crise da água têm paralelo com as do setor de energia, outro polo da disputa pela água no Paraíba do Sul.
"Há um receio de não tornar explícita a indisponibilidade dos recursos, que é crítica e gera riscos em ambos os setores", afirma.
Ele diz que a forte seca deste ano atingiu não só o abastecimento como a produção das hidrelétricas, que geram 75% da energia do país.
Para o professor da USP, aumentar a produção nas usinas é importante por uma questão de custo. "Mas a decisão [no impasse do Paraíba do Sul] deveria ser técnica, e não submetida ao jogo político em que está", afirma.
Matéria publicada originalmente na Folha de S. Paulo.