Paulistano enfrenta ‘guerra’ por espaço

Ciclistas, corredores e pedestres quase sempre levam a pior quando entram na disputa por um lugar nas ruas e avenidas de São Paulo.

Por Paulo Saldaña

Se você, motorista, gostaria de uma rua só sua – principalmente no meio do congestionamento – vá sabendo que em São Paulo isso é de fato impossível. Mesmo se cada carro ganhasse uma rua para si, a via teria de ser dividida com outros 116 automóveis. Em uma cidade com uma frota de 7,6 milhões de veículos, a disputa por espaço é brutal – e quando ciclistas, corredores e pedestres entram na cena, eles quase sempre levam a pior.

No sábado passado, um acidente com um morto e quatro feridos expôs essa disputa em um dos lugares mais emblemáticos desse convívio. O analista de sistema e atleta Alvaro Teno, de 67 anos, morreu ao ser atingido por um motorista bêbado no câmpus da Universidade de São Paulo (USP).

Com ciclistas e equipes de corrida espalhados por ruas arborizadas, a Cidade Universitária, na zona oeste, parece um parque à primeira vista. Mas o tráfego é livre, com movimento diário de 55 mil carros, segundo registro mais recente. Por ter autonomia, nem a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) tem operação por lá. O subprocurador-geral de Justiça, Arnaldo Hossepian, corre todos os sábados na USP. Segundo ele, as regras do câmpus devem ser definidas, mas falta conscientização. “Há irresponsabilidade quando alguém corre ouvindo música e se distrai. Mas falta entender que em uma cidade como São Paulo há poucos espaços para se exercitar”, diz. “A rua é pública, pede responsabilidade compartilhada.” A USP já informou a intenção de criar ciclovias e faixas de ônibus, além de aumentar a fiscalização. Pesquisa de tráfego e campanha educativa também serão realizadas.

Salto

Não é impressão que o número de ciclistas e corredores tem aumentado. Segundo a pesquisa Origem e Destino do Metrô de 2007, a Região Metropolitana de São Paulo tem 6,3 ciclistas por mil habitantes – 40% maior do que registrado em 1997. Em relação aos corredores, o número de provas de rua é revelador: só no ano passado houve 323 provas no Estado, salto de 49% em cinco anos.

Na Avenida Sumaré, ciclistas e pedestres aprendem a conviver. Há anos o canteiro central da avenida é usado como pista de caminhada, com a presença de alguns ciclistas. Mas agora a pista é compartilhada – recebeu até plaquinha com o desenho de uma bicicleta e uma pessoa. “Aqui é o único lugar que tem para andar com ele Max, o cachorro. Com as bicicletas até agora não teve problema; o pior é o ar poluído”, diz a universitária Victória Ferreira, de 19 anos.

Ciclistas têm prioridade sobre outros veículos. Pedestres têm prioridade sobre ciclistas. É o que define o Código Brasileiro de Trânsito. “Se não tem ciclovia, eu vou pela rua, nunca pela calçada. Ciclista também tem seus deveres”, diz o vendedor Flavio Queiroz, de 32 anos, que há quatro anos tem a bicicleta como veículo principal.

O trecho na Sumaré integra os 83 km de ciclovias da cidade. A gestão atual instalou 10,5 km desde junho e pretende chegar a 400 km. As faixas vermelhas já estão pintadas na Rua Líbero Badaró, no centro, mas ainda não se viam bicicletas na última sexta. As estudantes Luiza Bronzatto e Tatiane Carvalho, de 23 anos, aproveitavam o espaço para caminhar. “Só vai ter efeito na próxima geração”, diz Tatiane. A amiga vai mais longe. “O problema é que a rua, o trânsito, a calçada, tudo é ruim. Bom mesmo em São Paulo são só os bares.”

Matéria originalmente publicada no jornal O Estado de S. Paulo

Compartilhe este artigo