No ano passado, 514 pedestres morreram em acidentes de trânsito na capital, segundo levantamento feito pela CET.
Por Beatriz Atihe
Há uma semana, desde 25 de agosto, três ruas da zona oeste de São Paulo tiveram a velocidade reduzida de 60 km/h para 50 km/h. A diminuição aconteceu após a enfermeira Cristiane de Abreu, 37 anos, e sua filha de 8 anos terem sido atropeladas em um domingo pela manhã em frente a um centro de cultura. O atropelamento aconteceu em 17 de agosto. A menina está bem, mas Cristiane continua internada em estado gravíssimo. O motorista estava com a carteira vencida e admitiu que dormia no momento da colisão.Segundo dados da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), somente de janeiro até abril deste ano, 178 pedestres morreram em acidentes de trânsito. Em 2013, 514 transeuntes morreram em acidentes de trânsito em toda a capital. Em oito anos, de 2005 a 2013, os óbitos diminuíram 31%, mas o pedestre continua sendo quem mais morre nas ruas paulistanas.
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“Pelo Código de Trânsito Brasileiro, o pedestre deve ter preferência nas ruas, seguido pelo ciclista e depois pelo motorista. Mas, na prática, acontece o contrário: a rua é do motorista. O pedestre fica por último, é um cidadão de terceira classe", afirma o engenheiro e presidente da Associação Brasileiro de Pedestres (Abraspe), José Ignácio.
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Ignácio explica que as principais causas dos atropelamentos são a desatenção, o sono e a ingestão de álcool ou drogas. Por isso, diz ele, diminuir a velocidade é só um passo. "É preciso que haja uma rígida fiscalização e que os pedestres sejam vistos com a real importância que eles têm”.
Mais devagar ou… menos rápido
Diminuir a velocidade de ruas e avenidas é uma estratégia internacional de transformar a cidade num espaço mais agregador. Em São Paulo, o velocímetro já baixou em algumas vias importantes. Há menos de dez anos, por exemplo, a velocidade máxima na avenida Paulista era de 70 km/h. Diminuiu para 60 km/h e, recentemente, caiu para 50 km/h. No corredor da avenida 23 de maio, que corta a cidade, o motorista também anda mais devagar: o limite passou de 80 km/h para 70 km/h e, em alguns trechos, 60 km/h.
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Um avanço ainda tímido para muitos engenheiros de trânsito, uma vez que o risco nessa rotação ainda é muito alto. Um estudo do Departamento de Trânsito britânico revelou que se um veículo atinge uma pessoa a 32 km/h, existe a probabilidade de 5% dos pedestres morrerem, de 65% sofrerem lesões e de 30% sobreviverem ilesos. Se alguém é atingido por um veículo em uma velocidade de 64 km/h, 85% podem morrer e os 15% restantes sofrem algum tipo de lesão.
Por todo esse risco, o engenheiro e especialista em transportes Sérgio Ejzenberg alerta para a importância da fiscalização. “O processo está acontecendo, mas ainda é necessário dar ênfase na fiscalização. Os radares, por exemplo, servem como uma forma de coibir atos que infrinjam a lei”.
Não foi acidente!
Sem fiscalização ostensiva, os fatos vem à tona a cada acidente que envolve excesso de velocidade e embriaguês. Ou a cada homicídio intencional, como defende o movimento Não foi Acidente, idealizado por Nilton Gurman, tio de Vitor.
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Em julho de 2011, Vitor Gurman, 24 anos, estava com alguns amigos na Vila Madalena, zona oeste, quando foi atingido por um veículo que trafegava a 98 km/h. “Era umas 3h da manhã, o Vitor estava na calçada e uma mulher passou na rua em alta velocidade. Ela não viu uma curva e acabou batendo o carro, mas antes ela acertou o Vitor”, conta Nilton.
O tio conta que, na batida, o carro capotou e acabou arrancando a placa que mostrava que a velocidade permitida naquela via era de 30km/h. “Meu sobrinho foi socorrido e levado para o hospital, onde ficou cinco dias em coma e faleceu. A mulher que dirigia o veículo está respondendo um processo por homicídio doloso (quando há intenção de matar) e perdeu a habilitação, mas um tempo depois foi flagrada dirigindo em alta velocidade e falando ao celular”.
Não Foi Acidente é um movimento contra a embriaguez no volante que trabalha na construção de um projeto de lei que sugere a redução da velocidade das vias para 30 km/h, no período das 23h às 6h. “A mulher que atropelou o Vitor se recusou a fazer o teste do bafômetro e estava a uma velocidade muito maior do que a permitida na via. Acreditamos que esse projeto vai deixar os jovens mais seguros”, conta Gurman.
O idealizador do movimento lamenta que o caso de seu sobrinho não entrou para as estatísticas. “Ele não entrou porque morreu após cinco dias do acidente e só é considerado atropelamento quando a pessoa morre até 24h depois do ocorrido”.
Bruna Baltresca, 28 anos, e sua mãe Miriam Baltresca, 58 anos entraram no cálculo. Em setembro de 2011, elas tinham ido até o shopping Villa-Lobos, também na zona oeste, e deixaram o carro em uma rua próxima ao local. Na saída do shopping, por volta das 22h30, elas estavam caminhando até o veículo quando foram atropeladas por um carro em alta velocidade. “A Miriam foi prensada contra o portão e morreu na hora. Já a Bruna foi socorrida e morreu 15 minutos após dar entrada no hospital“, conta Manuel Silvino Ferreira Fernandes, cunhado de Miriam e tio da Bruna.
O rapaz que dirigia o veículo realizou o teste do bafômetro e foi constatado que ele estava alcoolizado. “A polícia disse na época que o velocímetro tinha travado no 100km/h, mas que muito provavelmente ele estava entre 130km/h e 150 km/h no momento em que atingiu as duas“, disse Fernandes. O motorista ficou preso durante vinte dias e depois foi solto. Ele também está respondendo por homicídio doloso.
Os números ainda omitem quem sobreviveu a um atropelamento. Em 2007, a estudante de pedagogia Diana Lavander, 28 anos, foi prensada entre dois carros na mesma região em que seu pai morreu atropelado em 1989. Por causa do acidente, ela teve uma lesão na coxa.
Matéria originalmente publicada no portal iG