Por Claudia Collucci e Gabriel Alves
Só 30% dos idosos com mais de 80 anos que vivem em São Paulo têm um envelhecimento tido como "ótimo", ou seja, sem problemas funcionais ou cognitivos.
Os dados vêm de estudo inédito da USP, feito partir de projeto que monitora há 14 anos o envelhecer na capital.
Manter contato social, ser ativo fisicamente, não ter depressão ou outra doença mental, possuir mais de quatro anos de escolaridade e renda suficiente são os fatores que aumentam as chances de envelhecer bem.
Foram avaliados 363 idosos de várias regiões do município, acompanhados no Sabe (Projeto Saúde, Bem-Estar e Envelhecimento). A amostra representa a população octogenária da cidade.
Esse grupo é o que mais cresce entre os idosos da capital. Em 2000, as pessoas com 80 anos ou mais representavam 12% dos 972 mil idosos paulistanos. Em 2010, essa faixa pulou para 15,3%.
"Não ter depressão é um dos principais fatores para um envelhecimento ótimo. A doença é muito subnotificada no idoso e negligenciada pelos serviços de saúde. As pessoas acham que é normal ficar 'tristinho' na velhice", diz a pesquisadora Yeda Duarte, professora da USP.
Dos idosos "ótimos", só 4,7% relataram ter depressão. Na outra ponta, dos que não estão envelhecendo bem, 73,5% relataram a doença.
A dona de casa Rosa Wainberg, 82, conhece bem os dois lados da moeda. Após a morte do marido, em 2002, retraiu-se. Não saía mais de casa. Via-se presa a uma vida triste e monótona. "Eu sei o que é ter depressão", diz.
Dois anos depois, decidiu dar uma guinada na vida. Matriculou-se na Universidade Aberta da Terceira Idade da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e hoje coordena um grupo de meditação.
"Tem é que tirar as coisas ruins da cabeça para permitir a entrada das novas", afirma ela, que tem um filho, mas prefere morar sozinha.
O estudo aponta que, embora as mulheres vivam mais anos, os homens estão envelhecendo melhor: 42% deles tiveram o conceito "ótimo", contra 23,7% das mulheres.
Outros estudos já demonstraram que homens que chegam até a idade avançada tendem a ser mais ativos e independentes que mulheres da mesma faixa etária.
"Quanto mais idade, mais isso fica claro. Entre os centenários, é evidente. É um fenômeno universal", diz a geriatra Maysa Seabra Cendoroglo, professora da Unifesp. Segundo ela, fatores genéticos e ambientais que podem contribuir para isso ainda estão sendo estudados.
Outro tema bastante pesquisado são as atividades e hábitos de vida que podem colaborar para um envelhecimento saudável.
O papel da atividade física como fator de proteção física e mental já está bem documentado. Mas agora estudos em modelos animais têm demonstrado que a interação social também produz benefícios semelhantes.
"A interação com o outro produz desafios constantes. Usamos recursos mentais e emocionais, o que estimula o aprendizado, a sair da zona de conforto", explica Maysa.
Doenças
Envelhecer bem não significa não ter doenças. A grande maioria (84,4%) dos idosos "ótimos" têm uma ou mais doenças de base, como diabetes e hipertensão.
"Manter essas doenças bem controladas é fundamental para viver mais anos sem comprometimento funcional", explica a geriatra Maria Lúcia Lebrão, coordenadora do Sabe. Isso significa poder vestir-se, comer, ir ao banheiro e tomar banho sozinha, por exemplo.
Outro estudo, também com dados Sabe, mostrou que as chances de declínio cognitivo aumentam duas vezes e meia entre os idosos com dificuldades em desempenhar essas atividades diárias.
Matéria originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo