Especialistas discutem Urbanismo Ecológico em diferentes áreas

Acadêmicos e especialistas discutiram formas de incluir ecologia, verde e meio ambiente no planejamento urbano. Para eles a participação cidadã é essencial para a eficácia dos projetos.

Por Luana Copini, da Rede Nossa São Paulo

A Rede Nossa São Paulo e o Programa Cidades Sustentáveis foram correalizadores do Simpósio Internacional Urbanismo Ecológico. O evento, que contou com especialistas nacionais e internacionais, aconteceu na última terça-feira (14/10) em São Paulo, e teve três atividades relacionadas: simpósio, lançamento do livro “Urbanismo Ecológico” e exposição.

Durante o encontro arquitetos, planejadores e urbanistas, teóricos, políticos e líderes do terceiro, discutiram Urbanismo Ecológico nas mais diferentes áreas: social, política, econômica e cultural. O Programa Cidades Sustentáveis também foi abordado durante o encontro e Oded Grajew, coordenador geral da RNSP e do PCS, fez suas considerações. (Clique aqui e leia mais)

Confira alguns assuntos debatidos durante o evento:

Educação é tudo

Em qualquer âmbito de discussão sobre políticas públicas, especialistas exaustivamente entram em um acordo: a educação é a base de tudo. A cultura é transformada pela educação, os direitos podem ser reivindicados quando há conhecimento e informação. Segundo Alexandre Delijaicov, da Universidade de São Paulo, algumas iniciativas já mostram que estamos mudando a cultura. “O que precisamos agora é investir, não apenas financeiramente, mas em esforços na educação e na cultura, pois é de forma democrática e participativa que vamos viabilizar o urbanismo ecológico”.

“A educação é a única maneira de mudarmos o curso das coisas. Temos que entender a cidade como um ecossistema. As cidades demandam e descartam. Como podemos transformar as cidades, sendo que a natureza não é opcional e sim essencial? O maior desafio que temos ainda é a orientação econômica. Devemos refletir e reintroduzir a biodiversidade ecológica para dentro do planejamento urbano” destaca Cecília Herzog, da PUC-RIO.

Do local para o global

A questão do verde e da ecologia não é só ambiental, é política e sociopolítica. De acordo com Joana Carla Gonçalves, da Universidade de São Paulo, damos ênfase aos modelos de fora sem considerar que são realizados em outros contextos e em outras culturas. “A cidade está passando por um momento histórico e precioso, com o Plano Diretor, por exemplo, estamos construindo uma cidade em conjunto, há mais participação nas assembleias públicas e mais interesse. O sucesso destas ações vai depender do rigor no planejamento e execução”.

Gareth Doherty, da Harvard Graduate School of Design, explica que existem outros desafios encontrados pelos especialistas que atuam internacionalmente, como a língua e a cultura. “Em árabe, por exemplo, a palavra paisagismo não existe, temos que encontrar outras definições para conseguir entender os processos das cidades, e depois planejar… Nas metrópoles a educação e a cultura fazem com que as crianças sejam preparadas para viver em lugares mais urbanizados, e isto se torna um problema ao pensarmos nas Bahamas, por exemplo…”. Para ele há necessidade de uma adaptação às culturas locais, primeiro conhecer e depois planejar.

Neste mesmo raciocínio, Diane Davis, da Harvard Graduate School of Design, garante que sem planejamento ecológico, arranjos institucionais e políticos, e conhecimento dos desafios, não é possível construir diretrizes para o Urbanismo Ecológico. “Temos que pensar em novos recursos financeiros, sociais e políticos. O Chile, Brasil e México estão em direção a uma nova era, a riqueza está matando o tecido urbano, criando prioridades que concorrem com outras. Será possível acomodar os diferentes cidadãos, de diferentes classes e culturas, numa cidade mais justa e sustentável? E assim garantindo a promoção da qualidade de vida? Precisamos encontrar maneiras para que os cidadãos se envolvam dede o planejamento até a aplicação para termos cidades mais justas”.

Direito à cidade

Carlos Vainer, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, retrata um cenário contrário ao que os especialistas julgam ser o caminho. “O direito à cidade é negado para muitas pessoas, as periferias são um exemplo disso. Temos cidades assimétricas, desiguais, há pouco debate sobre desenvolvimento urbano nas cidades. A cidade está sendo destruída porque ela já não pertence a todas as pessoas. Aqui no Brasil e em outros países, na Espanha, Japão e outros, algo está começando, algo está nascendo nas praças [manifestações]. Reconquistar a Polis é uma tarefa política, espero que façamos algo importante”.

Segundo os especialistas pensar a cidade como um lugar comum é o primeiro passo. Milton Braga, da Universidade de São Paulo defende que a construção de espaços públicos de convivência também depende de uma mudança cultural e não apenas de investimentos públicos. “Como criar espaços verdes com esta cultura do medo, em que as pessoas compartilham o medo da cidade, pela violência e falta de segurança?”, no mesmo pensamento destaca ainda que a necessidade de um lugar seguro e digno afeta diretamente a cultura: “Sem casa não se pode defender nada. Antes do público tem que existir o doméstico”.

Público x Privado x Interesses

Para os palestrantes não se trata apenas da gestão pública e ou privada, mas também da iniciativa pessoal e da consciência ecológica. “A gente não pode prescindir dos governos. Não acredito que sozinhos consigamos construir cidades melhores. A maior mobilização que já fizemos foi justamente pelo estado, pela democracia, não podemos nos perder”, destaca Pedro Rivera, da Studio-X.

O surgimento das bordas é um movimento que atende a interesses políticos, principalmente do mercado imobiliário. “A cidade do planejamento urbano é o centro. Os pobres não cabem no mercado imobiliário. É falta de lei? É falta de plano? A cidade não é só palco das relações sociais, é mercadoria. Falta vontade política, porque o mercado é altamente especulativo, rentista. Se não mudarmos o mercado no centro, não poderemos mudar a periferia”, alerta Ermínia Maricato, da Universidade de São Paulo.

Ela destaca ainda que a função social da propriedade vem se perdendo, varrendo pessoas com direitos em detrimento a interesses de grupos. “É preciso aplicar lei ao mercado para que os pobres não fujam para a periferia. É preciso uma reformulação no sistema”, completa.

“Não existe um projeto por trás da definição destas bordas. A borda é uma transição de identidades e esta procura de definição, cidade ou rural, ou periferia, ou margem, coloca um desafio que terá que ser enfrentado nos próximos anos. Precisamos romper os limites, pensar diferente e recuperar estas bordas” destaca José Armênio de Brito Cruz, da Escola da Cidade.

Um problema de saúde

Para o médico patologista e pesquisador da USP, Paulo Saldiva, Urbanismo Ecológico também está relacionado às políticas de saúde. “São Paulo cresceu mais do que podia e se transformou em uma cidade doente, com constantes diarreias aquosas despejadas nos rios, diabetes devido ao baixo gasto de energia, bronquite crônica ocasionada pela poluição e patologias neurológicos que fazem com que se esqueçam das promessas de campanhas, e claro a impotência”, destaca Saldiva fazendo uma analogia entre a cidade e o corpo (população). Ele afirma ainda que “o que pode salvar esta realidade é a força represada em cada deficiência, em cada barraco ou em cada ônibus lotado”.

Lançamento do livro e exposição

Na exposição, todas as páginas do livro Urbanismo Ecológico foram impressas em tecido, penduradas em uma estrutura de 1,70m de altura e expostas ao ar livre no jardim suspenso do Centro Cultural São Paulo.

O livro, editado por Mohsen Mostafavi e Gareth Doherty, parte de um enfoque interdisciplinar no qual se unem os olhares de arquitetos, planejadores e desenhistas urbanos, teóricos, economistas, engenheiros, artistas e cientistas, entre outros profissionais.

Ele surge da urgente necessidade de abordar o urbanismo sob um enfoque da ecologia como método prático e criativo para enfrentar a realidade da cidade, e assim se constitui em uma aposta deliberada pela consolidação definitiva do conceito de “urbanismo ecológico” por meio da compilação de uma série de textos-chave sobre a matéria.

O resultado é um amplo panorama que contribui para desenhar a imagem plural, complexa e repleta de nuances que o sistema urbano assume quando estudado sob a ótica ecológica. Em suma, trata-se de uma contribuição importante que atesta o nascimento de uma nova ética e estética do meio urbano. 

Confira algumas fotos:  

  

  

  

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