Por Paulo Saldiva, Mariana Veras e Nilmara de Oliveira Alves
Nas últimas semanas, estamos com a impressão de que o Brasil foi colocado em uma panela quente. Andar pelas ruas é um exercício de sudorese, os ônibus lotados fazem as vezes de sauna e dormir passou a ser uma experiência desafiadora.
Além do desconforto pessoal, a presente situação climática introduziu em nosso cotidiano importantes temas ambientais. O aspecto ambiental mais facilmente percebido é a imagem de reservatórios de água quase vazios. O nível diário do sistema Cantareira passou a ocupar as primeiras páginas dos jornais e a frequentar conversas de rodas de amigos.
Há, no entanto, outras consequências menos evidentes desse período de clima bicudo: os frutos da combinação das emissões de poluentes (usinas térmicas e emissões veiculares) aliada às altas temperaturas e radiação solar, que resultam na deterioração da qualidade do ar.
A mistura complexa desses diversos poluentes liberados para a atmosfera faz da nossa cidade um verdadeiro caldeirão químico que, sob o efeito da radiação solar, forma outros poluentes, sendo o ozônio seu integrante mais ilustre.
Vale ressaltar que o ozônio é formado naturalmente nas camadas mais altas da atmosfera, onde ajuda a proteger a vida na terra filtrando raios ultravioleta. Entretanto, na superfície terrestre o ozônio é altamente danoso à saúde humana.
Muitas pessoas se surpreenderam recentemente com a indicação de qualidade do ar da Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental de São Paulo), exposta nos relógios digitais espalhados por São Paulo, indicando nível ruim ou péssimo, seu pior nível.
No gráfico abaixo, dados diários de ozônio e temperatura estão correlacionados. Em São Paulo, de janeiro de 2008 até a metade de janeiro de 2015, é evidente o aumento deste poluente fotoquímico nos dias mais quentes como os que vivemos atualmente (círculo em vermelho).
Altas temperaturas favorecem a formação de ozônio na atmosfera
Hoje, sabemos que a exposição a níveis moderados e elevados de ozônio está associada a uma grande variedade de efeitos negativos sobre a saúde, desde uma simples irritação na garganta até a redução de expectativa de vida. Crianças, idosos e pessoas que tenham alguma doença pulmonar pré-existente, como asma, bronquite crônica e enfisema, são as que mais sofrem.
Além do acúmulo dos poluentes produzidos pelas reações químicas na atmosfera, há o efeito direto da temperatura em nossa saúde. Importante ressaltar que a faixa de conforto térmico varia de região para região do planeta, não sendo a mesma, por exemplo, para Teresina ou Copenhague.
Em particular, para a cidade de São Paulo, a média da zona de conforto térmico é de 22 a 25ºC. A faixa de conforto térmico é definida tanto pelo padrão construtivo de nossas casas, como também pelos sistemas que regulam a nossa temperatura corpórea.
Nós, seres humanos, temos que manter nossa temperatura corporal em uma faixa muito estreita, entre 36,5 e 37,2°C, e para isso temos um sistema que funciona como um "termostato", mas que possui um limite de tolerância. Indivíduos mais idosos e crianças são aqueles que têm a saúde mais comprometida quando a temperatura ambiente fica fora da zona de conforto térmico, pois seu intervalo de tolerância é geralmente menor.
Pessoas portadoras de doenças como diabetes, desordens cerebrovasculares ou cardiovasculares também devem tomar mais cuidado com as altas temperaturas, pois o risco nessas condições é maior. No calor nossos vasos dilatam e perdemos muita água corporal para mantermos nossa temperatura estável, por isso, ficamos desidratados mais rapidamente.
Isso pode provocar um aumento da viscosidade sanguínea e outras mudanças fisiológicas que, quando agravadas, podem levar a morte. Alterações de mecanismos de regulação endócrina, de arquitetura do sono, de pressão arterial e do nível de estresse também podem ser relacionadas com esses dias mais quentes.
A atual condição climática tem feito com que nós sejamos frequentemente compelidos a conviver com temperaturas muito acima da nossa faixa de conforto térmico, com potencial prejuízo à nossa saúde.
Portanto, nestes dias mais quentes e muito ensolarados, associados a uma qualidade do ar ruim, alguns cuidados podem ser tomados para proteger sua saúde. Por exemplo, evite exposições ao ar livre nos períodos mais quentes do dia, concentre as atividades físicas no período da manhã e ao anoitecer. Beba muita água ao longo do dia para manter-se hidratado.
Uma dica simples para verificar o nível de hidratação é olhar a cor da urina. Uma urina mais escura do que o habitual deve acender uma luz dizendo beba mais água, se ainda este raro fluido for disponível em nossos anêmicos reservatórios.
Matéria originalmente publicada no portal Uol Notícias