Por Monique Oliveira e Edílson Dantas
Enquanto um prédio em construção no centro da cidade desperdiça água de seu lençol freático sarjeta abaixo na rua Augusta, faxineiros que trabalham na região chegam a encher dez baldes por dia na "água da guia" para garantir a limpeza e a descarga dos banheiros.
A água é transparente e aparentemente limpa.
Em tempos de escassez, quem sobe a Augusta em direção à rua Dona Antônia de Queirós, porém, se assusta com a abundância que escorre pela sarjeta 24 horas por dia -o cenário fica ainda mais contrastante porque há falta de água na própria Augusta, que tem sofrido com a redução de pressão na rede à tarde.
Sem água para fazer a limpeza da loja em que trabalha ou mesmo para dar descarga no banheiro, a faxineira Maria Helena Zuim, 66, viu no que ela chama de "água da guia" a solução.
"É uma água que está indo embora, não é? Então, estou reaproveitando", diz. "Está mais limpa que a da torneira."
Maria Helena conta que há 15 dias não há água em seu trabalho. A única torneira que há no local tem "apenas um fiozinho de água meio marrom", conta. "Não chega na caixa e não há água só da rua."
Ela chega a tirar mais de dez baldes de água da sarjeta. "É muita gente para ir ao banheiro. Tem que dar descarga toda hora."
Também o faxineiro Damião Pereira, 59, que trabalha em um prédio residencial na Augusta, está aproveitando essa água.
Ele afirma que o abastecimento no prédio para às 13h e só volta no dia seguinte, às 9h. Pereira, então, recorre à água da sarjeta para lavar a calçada e passar pano no prédio. "Quem faz limpeza aqui perto está usando essa água."
Outra a utilizá-la é Carol Siqueira, 29, zeladora e moradora da rua Augusta.
"Eu uso duas vezes por dia para dar descarga no banheiro e limpar os corredores", conta. "Quando a portaria está fedendo pelo lixo, também lavo com essa água."
Matéria originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo