Por Érika Fraga
A Sabesp, empresa de saneamento paulista, estuda propor uma revisão tarifária extraordinária além do reajuste pela inflação previsto para abril, a fim de tentar mitigar a forte deterioração de sua situação financeira.
A revisão extraordinária teria de ser aprovada pela Arsesp, autoridade regulatória do setor. O principal argumento para o reajuste acima do previsto é o aumento do custo de energia elétrica que não estava previsto no plano de negócios da empresa, aprovado em 2014.
Se efetuado, o pedido fará parte de um arsenal de medidas que a Sabesp tem adotado para tentar manter seu equilíbrio financeiro em meio a choques negativos que incluem, além da crise hídrica, o aumento de sua dívida em dólar, que não conta com proteção contra desvalorização cambial (hedge).
"Claramente, a Sabesp está sob uma situação de estresse financeiro. Estamos reagindo com unhas e dentes para manter a situação financeira sustentável", disse à Folha Rui Affonso, diretor financeiro e de relações com investidores da empresa.
A crise hídrica afeta as contas da empresa por dois canais principais.
Por um lado, tem levado a forte redução da receita em consequência da diminuição do consumo de água e do desconto concedido a clientes que conseguem economizar.
Por outro, tem obrigado a Sabesp a fazer investimentos emergenciais para tentar garantir o fornecimento de água.
Falta de proteção
Além disso, quase 40% da dívida da empresa –que somava R$ 9,6 bilhões no terceiro trimestre de 2014– é denominada em moeda estrangeira, principalmente dólar. Mas a Sabesp não conta com instrumento financeiro que protegeria esse tipo de endividamento de uma desvalorização cambial (hedge). Isso significa que a depreciação recente do real tem feito o valor da dívida aumentar.
Como a maior parte do endividamento externo da empresa é de longo prazo e contraída a juros baixos em instituições multilaterais, seu aumento tem pouco impacto no caixa da empresa, pois não implica amortizações substancialmente maiores.
No entanto, a depreciação do real afeta o balanço da Sabesp, piorando seus indicadores financeiros. Contribui, por exemplo, para um aumento da relação entre o valor da dívida e o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização).
Importante indicador de saúde financeira de uma empresa, essa relação, que já tinha subido de 2,3 para 2,9 entre o primeiro e o terceiro trimestres de 2014, piorou.
O risco que a empresa tenta evitar é que a deterioração dos indicadores financeiros a leve a descumprir cláusulas contratuais com credores (chamadas "covenants") que visam protegê-los do risco de insolvência.
Segundo Affonso, a empresa tem conseguido manter os indicadores ainda longe dos níveis que levariam à quebra dessas cláusulas.
"Precisamos evitar isso de toda forma porque prejudicaria o acesso da empresa a crédito, que é fundamental para garantir os investimentos da empresa", afirma Affonso.
Em 2014, a Sabesp cortou R$ 1,1 bilhão em despesas para compensar a deterioração das suas finanças.
"Tudo o que podíamos cortar cortamos. Despesas que não atendiam a prioridade absoluta de manter a população abastecida foram postergadas." Em 2015, segundo o diretor financeiro da Sabesp, os cortes serão aprofundados.
Os investimentos emergenciais serão cobertos pelo caixa da empresa e pela antecipação de desembolsos de dívida que ocorreriam à frente.
Reajustes anteriores
É nesse contexto de administração espartana das contas que a empresa estuda pedir outra revisão tarifária extraordinária em 2015.
Um reajuste desse tipo já havia ocorrido no ano passado, parte de revisões feitas a cada quatro anos para garantir o equilíbrio financeiro das concessionárias.
O reajuste deveria ter sido aplicado em abril de 2014, mas foi postergado para dezembro e ficou em 6,49%.
Para abril deste ano, está previsto, com autorização da Arsesp, um reajuste apenas para repor a inflação. O mercado estima um aumento da tarifa de cerca de 5,5%.
Mas a Sabesp considera solicitar uma revisão extraordinária, que pode ser concedida quando custos imprevistos no plano de negócios ameaçam as contas.
O argumento estudado pela empresa é que o reajuste da energia elétrica –custo importante na operação de abastecimento de água– não era previsto na magnitude em que tem ocorrido.
Segundo Affonso, a Sabesp esperava que o custo de energia estivesse cerca de 15% abaixo do atual. Além disso, pondera, aumentará mais.
"Manter a estabilidade financeira da empresa também é uma das funções da agência reguladora", afirma.
Fazendo água
R$ 1,5 bi
Foi a perda de receita da Sabesp em 2014 com o programa de bônus na conta
R$ 1,1 bi
Foi o corte de gastos feito pela empresa para compensar despesas imprevistas
Matéria originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo