Levantamento do ‘Estado’ mostra que, em pelo menos 30 municípios, leis que punem desperdício, como sugerido pelo governador, não avançaram; na capital, aprovou-se até um texto mais rígido em 1ª votação, mas repercussão negativa adiou decisão.
Por Fabio Leite e Pedro Venceslau
Proposta em dezembro pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) como uma das medidas para enfrentar a crise que ameaça o abastecimento de 20 milhões de pessoas na Grande São Paulo, a minuta de projeto de lei municipal que estabelece multa para quem desperdiçar água potável, lavando carros ou calçadas, foi ignorada por prefeitos e vereadores da região metropolitana.
Levantamento feito pelo Estado mostra que nas 30 maiores cidades da região, incluindo a capital, o projeto de lei não avançou nas Câmaras Municipais. Na maioria dos casos, a proposta nem sequer foi enviada pelo prefeito ao Legislativo. As cidades de Guarulhos, Guararema, Itapevi e Ferraz de Vasconcelos, por exemplo, informaram que nem receberam a minuta elaborada pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).
A ideia do projeto “padrão” era que as cidades assumissem a fiscalização e ficassem responsáveis pela aplicação de multas que vão de R$ 250 a R$ 1 mil. A resistência de prefeitos e vereadores em aprovar o projeto se explica pelo temor de que acabem dividindo a “fatura política” da crise hídrica com o governo estadual. Procurados, Sabesp e governo do Estado preferiram não comentar.
ABC
Os prefeitos reunidos no Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, que agrupa sete municípios, posicionaram-se em bloco contra a multa. Eles defendem que, antes de “penalizar a população”, o governo Alckmin deve “apresentar um plano de contingência” e realizar campanhas informativas sobre o problema.
O Consórcio de Desenvolvimento dos Municípios do Alto Tietê (Condemat), que agrupa dez cidades, também optou por agir unido e não implementou a multa. “Nenhuma cidade levou adiante (o projeto de Alckmin). Optamos pela conscientização”, diz Marco Aurélio Bertaioli (PSD), prefeito de Mogi das Cruzes e presidente do grupo.
Os prefeitos do consórcio da Região Oeste, que reúne oito cidades, incluindo Barueri, Cotia, Carapicuíba e Osasco, também rejeitaram a proposta. Segundo a Secretaria de Comunicação de Carapicuíba, “todos os prefeitos do consórcio foram unânimes na decisão de não adotá-la (a multa), pois a responsabilidade da cobrança e aplicação é da Sabesp”.
“Os municípios não podem assumir a culpa pela falta de investimentos na modernização do sistema da distribuição”, disse o prefeito em exercício de Cajamar, Marcos Lima (PSDB).
Só Mairiporã informou que o projeto está em tramitação na Câmara e Itaquaquecetuba disse que o departamento jurídico avalia a proposta. As assessorias de outros nove municípios menores não responderam.
Capital
A reação negativa dos prefeitos à iniciativa de Alckmin foi impulsionada pela dificuldade de o projeto avançar na Câmara Municipal de São Paulo. Para evitar desgaste político, o prefeito Fernando Haddad (PT), que deve disputar a reeleição em 2016, preferiu deixar a iniciativa do projeto de lei para os vereadores. Estes, por sua vez, chegaram a aprovar uma proposta até mais rígida do que o do governador em primeira votação. Depois da repercussão negativa, porém, passaram a postergar a decisão final.
“Estão fazendo jogo de cena. O governo Haddad quer arrastar isso”, diz o vereador Andrea Matarazzo, líder do PSDB na Casa. “Talvez o projeto seja votado nesta quarta-feira (hoje). Eu defendo que a Câmara autorize a Sabesp a multar”, afirma o vereador Arselino Tatto, líder do governo na Câmara.
Em Campinas, que adotou a multa em fevereiro de 2014, nenhum morador foi autuado.
Matéria originalmente publicada no jornal O Estado de S. Paulo