Apesar do acesso pelo portão da rua Marquês de Paranaguá, parque estará dividido por tapumes isolando a área em que as construtoras pretendem erguer empreendimentos.
O Parque Augusta, no centro de São Paulo, será reaberto ao público quarta-feira (1º) em cumprimento a uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, que acatou recurso de moradores do bairro e ativistas, reivindicando o acesso à área e o cumprimento da Lei 15.941, de 2013, que criou o parque.
O acesso disponível, conforme a Justiça, será o da rua Marquês de Paranaguá, mas o terreno estará dividido por tapumes, isolando o bosque da área em que as construtoras proprietárias do terreno, Cyrela e Setin, pretendem erguer empreendimentos. “A gente questionou esse lance de adotar tapumes, inclusive em forma de dossiê, pois não é isso o que a população quer e não é isso a que temos direito, não é a forma legal de se fazer”, afirma Henny Freitas, representante do movimento Organismo Parque Augusta, que reivindica toda a área do terreno, de cerca de 24 mil metros quadrados, integrada ao espaço público.
Conforme prevê a liminar concedida para a ação civil pública, a data de 1º de julho foi definida em publicação no Diário Oficial de 29 de maio, dando 30 dias de prazo para o cumprimento. Os portões estavam fechados desde 29 de dezembro de 2013, por conta de uma arbitrariedade das construtoras, segundo os advogados que apoiam o movimento, "que não explicaram ao público a razão do fechamento". "Nunca vi ou soube nada sobre isso”, afirma Iberê Bandeira de Mello, advogado colaborador do Organismo Parque Augusta.
A lei que criou o parque foi sancionada no dia 23 de dezembro de 2013, portanto, cinco dias antes de os portões aparecem trancados. Em janeiro deste ano, os ativistas ocuparam a área e a Justiça determinou a reintegração de posse em 4 de março.
Mas, apesar da abertura na próxima semana, a luta da população por 100% do terreno destinado ao parque continua. Na última quinta (18), os ativistas e representantes dos moradores tiveram reunião com o prefeito Fernando Haddad na qual discutiram sobre a demanda de toda a área ser destinada ao parque. A reunião vinha sendo solicitada havia mais de um ano. “Ele (o prefeito) disse que o melhor encaminhamento possível é analisar tudo o que a gente já fez, esgotar essa parte jurídica e marcar uma nova reunião para discutir o que foi analisado”, afirma Henny, ao explicar que foram entregues ao prefeito dossiês sobre as irregularidades cometidas no espaço do parque, principalmente crimes ambientais.
“As multas que deveriam ter sido aplicadas pelo fato de os portões estarem fechados, e mais as multas sobre o descaso ambiental, que também era algo que eles deveriam ter respeitado, porque na matrícula do terreno fala que a mata deve ser preservada e ampliada, tudo isso está no dossiê”, diz Henny, destacando que nada foi feito pela municipalidade ante o fechamento dos portões.
Henny, no entando, diz que saiu da reunião “superanimada”: “Conseguimos cumprir com nosso objetivo, que era mostrar a inviabilidade de qualquer construção lá dentro. Saí com um sentimento de missão cumprida. Também fiquei contente de ter transparecido que estamos alinhados, tanto politicamente quanto juridicamente, me tranquilizou bastante. Em outras palavras, o Haddad deixou claro que nada vai ser feito enquanto o viés jurídico não for esgotado. Ele disse que os processos estão parados”, conta a ativista.
O confronto jurídico entre as construtoras e a população remete à história do terreno, que desde o seu surgimento como propriedade privada, em 1902, com a construção do Palacete Uchoa no local, tem a área de parque público destinada à cidade. No fim dos anos 60, a propriedade, que pertencia a uma ordem religiosa, foi vendida e a área de espaço público constou mais uma vez em cláusula colocada no contrato, lembra Bandeira de Mello. A voracidade da especulação imobiliária na cidade, no entanto, fez com que o casarão fosse destruído e o merecido tombamento, das construções remanescentes, veio apenas em 2004.
Enquanto a população tem a seu favor a história e vocação da área, as construtoras contam com o projeto imobiliário de três torres aprovado em janeiro deste ano pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp). “Tivemos uma reunião recentemente lá no Conpresp, junto com a Nádia (Nádia Somekh, presidenta do Conpresp) e a assessoria dela, e nós pedimos a revogação dessa decisão”, afirma Henny. Segundo a ativista, a presidenta do Conpresp “disse que isso não era possível, mas que seria possível sim entrar com novos processos de tombamento da área”.
A ativista também diz que a decisão do Conpresp não é final. “Não existe nada deferido por parte da Secretaria do Verde, nem de licenciamento. A construção só ocorre no local quando eles têm o alvará, que é a permissão para a construção, e isso está bem longe de acontecer. O Haddad falou que está tudo parado, que ele já tinha dito para o Ministério Público que não tem aprovação nenhuma, que nada vai ser feito lá enquanto esse viés jurídico não for esgotado. Então, a decisão do Conpresp não vale nada”, defende Henny.
Durante a reunião com Haddad, segundo a ativista, foi discutida também a dificuldade que existe em obter informações sobre o parque. “Ele está direcionado à Secretaria do Verde e Meio Ambiente, Secretaria da Cultura, várias outras, e essas secretarias não se conversam”, diz Henny. “Mostramos essa questão para o prefeito e ele se comprometeu a concentrar todos os dossiês e estudos que entregamos para a Procuradoria-Geral do Município, e que ela dará a devolutiva dizendo o resultado dessa análise.”
Matéria originalmente publicada no portal da Rede Brasil Atual