Por Pedro Ribeiro Nogueira
“Se eu não conseguir levantar a grana até o fim do prazo da campanha de arrecadamento virtual, não vai ter jeito, ela vai ter que fechar”, afirma triste e resignado Alexandre Cabral, fundador da BECEI, uma biblioteca comunitária em Paraisopólis, na zona sul de São Paulo. Segundo ele, a biblioteca comunitária mais antiga do país.
Fundada em setembro de 1995, quando Alexandre tinha apenas 14 anos, a BECEI vem se mantendo como pode desde então. Começou com 13 livros e uma estante. Após ser descoberta pela mídia, em 1995, passou a receber doações e, em pouco tempo, chegou a mais de 4 mil volumes, que já não cabiam na casa do então adolescente.
“Eu já dava aulas de alfabetização desde cedo, aqui na casa da minha mãe. Resolvi montar uma biblioteca com os poucos livros que tinha e foi um sucesso. Estava sempre tudo alugado”, relembra Alexandre sobre a época em que a biblioteca funcionava na janelinha de seu barraco.
Desde então, mais de vinte anos se passaram. A visibilidade da iniciativa do jovem Alexandre ajudou a montar e a manter a biblioteca, aumentar o espaço. Doações contribuíram para a construção da sala onde hoje estão guardados os 8 mil volumes – segundo Cabral, 4 mil estão emprestados -, localizada no terreno da casa da sua mãe. Alexandre viajou pelo Brasil, foi à Amazônia auxiliar na montagem de bibliotecas comunitárias em comunidades ribeirinhas e até criou um instituto que tem como missão fundar bibliotecas em comunidades vulneráveis do Brasil.
Uma biblioteca em cada favela
“Se tem uma coisa que eu gosto de São Paulo é a literatura e a literatura de periferia da cidade é fantástica, com expoentes como Ferréz, Sérgio Vaz e Marcelino Freire e seus incontáveis saraus. Uma vez o Ferréz me pediu para ajudar a fundar uma biblioteca numa casinha do Capão Redondo e até hoje ela é super procurada. Então, eu queria pedir mais bibliotecas na periferia para que esse movimento continue”, relatou Paulo Lins durante o Seminário Cidades Rebeldes, em junho deste ano.
Para o autor de “Cidade Deus”, uma das prioridades do poder público na metropóle paulistana deveria ser garantir o direito à educação e à cultura para todos. A impressão de Lins é reforçada pelos dados: segundo o Mapa da Desigualdade, da Rede Nossa São Paulo, 36 distritos paulistanos não têm acervo próprio de livros para crianças e 37 não têm bibliotecas para adultos. Enquanto a Unesco recomenda 2 livros disponíveis por habitantes, a cidade de São Paulo tem hoje 0,19.
A Biblioteca de Paraisopólis é a única em toda a região. Alexandre recorda que, quando era jovem e precisava estudar, tinha que ir até Santo Amaro. “Hoje a biblioteca se tornou um ponto de referência na comunidade. As pessoas vem aqui para fazer pesquisa e estudar, mas também pelo prazer. E essa foi uma das grandes conquistas disso aqui: mostrar que o brasileiro gosta sim de ler, só lhe falta oportunidade”, contempla Alexandre.
O espaço também é amplamente usado pelas escolas da região – uma EMEI funciona há cem metros dali – como lugar de pesquisa e aprendizado.
No entanto, esse pequeno lugar de resistência cultural, encrustado na comunidade de mais de 120 mil pessoas, corre o risco de desaparecer. Após perder a contribuição mensal que recebia de um benfeitor, no início do ano, a biblioteca já amarga uma dívida de R$17 mil. Se eles conseguirem vencer esse desafio, ainda terão que embarcar numa nova jornada para garantir a sustentabilidade do espaço, que abre de domingo a domingo, para todos e todas interessadas em uma boa leitura.
Quem tiver interesse ou conhecer alguém que possa contribuir de forma permanente com a proposta, deve entrar em contato direto com a Biblioteca BECEI. Para apoiar financeiramente, com doações a partir de R$10, basta acessar a campanha de financiamento colaborativo, hospedada na plataforma Kickante.
Matéria originalmente publicada no Portal Aprendiz