Prefeitura vai alterar nomes de ruas de SP relacionados à ditadura

Homenagem a Costa e Silva é uma das que foram retiradas; outros 21 locais terão nova denominação.

Por Felipe Resk

O Elevado Costa e Silva deve oficialmente passar a se chamar Minhocão. Esse e outros 21 logradouros foram incluídos no programa do prefeito Fernando Haddad (PT), chamado Ruas de Memória, para alterar o nome de ruas, pontes, praças e viadutos relacionados à ditadura militar – uma recomendação da Comissão Nacional da Verdade. A maior parte dos nomes deve ser escolhida após discussão com moradores. 

O atual nome do Minhocão é uma homenagem ao Marechal Arthur da Costa e Silva, presidente de 1967 a 1969, período conhecido como “anos de chumbo”, por causa do AI-5, o mais radical dos atos institucionais. Para mudar essa denominação, porém, nenhum morador será ouvido. A Prefeitura vai aproveitar um projeto de lei de 2013, do atual secretário municipal de Cultura, Nabil Bonduki, que tramita na Câmara.

Outras ruas terão projetos de lei específicos. Dois deles foram enviados para a Câmara Municipal nesta quinta-feira, 13. O primeiro propõe a alteração do Viaduto 31 de Março, na Liberdade, que marca o início do golpe militar, para Viaduto Therezinha Zerbini, ativista e referência feminina pela anistia. O segundo vai proibir novas nomeações em homenagem a repressores.

“O debate já existia com iniciativas de vereadores, mas, quando o Executivo pauta esse debate, ele ganha outra qualidade”, disse o presidente da Câmara, Antonio Donato (PT). Ainda não há prazo para mudança dos nomes. O prefeito Haddad, contudo, acredita que o processo será rápido, uma vez que existiria consenso na Casa. “Nós vamos pedir aos vereadores uma atenção especial.”

Para Haddad, o projeto reafirma valores “democráticos” e “libertários”. “A liberdade é cara demais, é uma conquista preciosa demais para ser colocada em risco. O ministro-chefe da secretaria de Direitos Humanos, Pepe Vargas, disse que o programa é uma “reparação histórica às vítimas da ditadura”.
 
“Um povo que não tem direito à verdade não consegue nem sequer construir um presente que garante democracia e respeito aos direitos humanos”, disse Pepe Vargas. No discurso, também se mostrou contrário à prescrição de crimes políticos.

Ao todo, são 12 ruas, quatro praças, três avenidas, dois viadutos e um elevado. Onde há moradores, a Prefeitura vai se reunir com eles para discutir o nome atual e coletar sugestões de substitutos. A primeira mobilização foi na Rua Golberi do Couto e Silva (fundador do Serviço Nacional de Informação e ministro-chefe da Casa Civil nos governos Ernesto Geisel e João Figueiredo), em que os cidadãos propuseram a troca por Padre Giuseppe Pegoraro, que atuou no bairro.

Apesar de considerar o projeto importante, o ex-deputado Adriano Diogo, que presidiu a Comissão Estadual da Verdade, acredita que deveria ter sido “melhor articulado” com vítimas, familiares, especialistas e vereadores. “O projeto nasceu de cima para baixo”, disse. Para ele, um dos riscos é a proposta travar na Câmara.

Gafe

A Prefeitura cometeu uma gafe ao mapear os logradouros que passariam por mudança de nome. Entre os locais selecionados estava o Viaduto General Euclides de Figueiredo, em Moema, na zona sul. No texto de apresentação do programa, a gestão Haddad afirmava: “geógrafo, político e general do Exército Brasileiro, foi o último presidente do regime militar, 1979 a 1985”. O problema é que Figueiredo nem sequer estava vivo quando houve o golpe de 1964. Na verdade, ele foi um dos comandantes da Revolução Constitucionalista de 1932 e integrou o grupo militar chamado de “jovens turcos”, que defendeu reformas no Exército. Também era o pai de João Figueiredo – este sim o último presidente do período ditatorial. A Prefeitura afirma que o logradouro já foi retirado da lista do programa.

Outro impasse aconteceu na Rua Sergio Fleury, na zona oeste. Fleury atuou como delegado na repressão política e é um símbolo do regime. Os moradores do local, entretanto, não apoiaram a mudança. A via saiu da lista.

Matéria originalmente publicada no jornal O Estado de S. Paulo

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