Por Giba Bergamim Jr.
Um futuro condomínio de moradias populares na zona oeste de São Paulo virou espaço livre para pichadores. Na zona sul, um empreendimento também voltado para a população de baixa renda nem passou da terraplanagem.
Embora estejam "em obras" no balanço de metas da gestão de Fernando Haddad (PT), em nenhum desses locais se veem operários.
Os dois exemplos mostram que travou a construção de habitações de interesse social, uma das principais promessas do prefeito, fazendo surgir na paisagem "esqueletos" de edifícios, sem previsão de entrega a moradores.
O prefeito prometeu 55 mil novas moradias populares até o final de 2016, mas neste penúltimo ano de mandato só 8.072 (15%) estão entregues.
Levantamento da Folha em 223 obras previstas na área de habitação revela que 127 (57%) ainda não saíram do papel. Das 54 (24%) "em obras", 37 não receberam investimentos entre 2013 e 2015. Somente 42 (19%) delas foram concluídas até agora.
A reportagem esteve em sete obras nas zonas oeste, sul e norte. Quatro estavam paradas, duas em ritmo lento e uma na fase de acabamento.
Na Estrada das Lágrimas, em Heliópolis, na zona sul, a placa da prefeitura indica que até o final de 2012, último ano da gestão anterior, de Gilberto Kassab (PSD), um condomínio que beneficiaria 187 famílias seria construído.
Haddad o colocou entre as suas metas. No papel, 67,5% da obra está "concluída". Mas quem passa por lá vê somente alguns blocos de concreto espalhados num terreno vazio. Em vez de operários, um segurança evita que a área seja ocupada. "Só tem placa. Obra, nunca teve", diz o comerciante Maurício Viana, 38, que há cinco anos viu a instalação da placa.
Na zona oeste, outra obra herdada da gestão passada segue a passos lentos. Chamado de Viela da Paz, o conjunto de dois prédios está de pé, mas sem previsão de término.
"Disseram que era para entregar em janeiro deste ano. Mas já fez tempo que quase ninguém entra aqui", disse a ambulante Maria Jozélia, 45, que mora numa favela próxima e espera ser beneficiada.
Na mesma zona oeste, um edifício à beira da marginal Tietê chama a atenção pelo abandono. A pintura amarela que já havia sido feita na parte externa ganhou pichações. "Parou faz mais de seis meses", diz o morador de uma casa na rua atrás do prédio.
Causa e efeito
A prefeitura culpa a falta de repasse de recursos pelo governo federal.
Só em Habitação, a gestão previa receber R$ 3,5 bilhões, mas apenas R$ 400 milhões (11%) chegaram.
Uma das consequências do atraso é o crescimento dos gastos com a bolsa-aluguel, benefício mensal de R$ 400 pago a desabrigados. Sob o comando de Haddad, o programa teve aumento de 44% nas despesas, como a Folha mostrou na semana passada.
Prefeitura culpa falta de recursos prometidos pelo governo federal
A gestão Fernando Haddad (PT) afirma que obras de habitação estão paradas ou em ritmo lento porque não ocorreram os repasses de verba do governo federal, responsável pela maior parte dos investimentos na área.
A gestão Haddad afirma que tem usado verba própria para manter as obras.
"A queda de arrecadação no município, Estado e União repercute nas questões de execução orçamentária. Os recursos do PAC [Programa de Aceleração do Crescimento] não vieram ou vieram com dinheiro abaixo do esperado", disse o secretário municipal de Habitação, José Floriano de Azevedo Marques.
Segundo ele, convênios com o governo do Estado também tiveram verba reduzida, caso do condomínio Jardim Lidiane, na zona norte. Sobre a obra que ganhou pichações perto da marginal Tietê, Marques disse que ela foi motivada pela falência da construtora. Uma nova empresa deve retomar a construção até o fim do ano.
O secretário afirmou que a gestão se compromete a deixar 100 mil unidades viabilizadas até o ano que vem.
União
O Ministério das Cidades, comandado pelo ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD), afirma que a liberação dos recursos em parceria com Estados e municípios só começa a ocorrer após o efetivo início das intervenções.
"Os repasses correspondem, além da disponibilidade orçamentária, ao ritmo de execução das obras que, por serem de grande complexidade, têm perfil de médio e longo prazos", diz nota.
Já a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano), do governo estadual, afirma que os repasses de recursos referentes a convênios com a prefeitura estão sendo efetuados de acordo com o cronograma. No caso do empreendimento Jardim Lidiane, a construção das 235 unidades habitacionais ainda está no prazo, diz a companhia.
A CDHU diz que já repassou R$ 8,7 milhões (59%) dos R$ 14,6 milhões previstos ali e que está em dia com os pagamentos.
Matéria originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo