Sabesp descumpre limite e capta mais água da poluída Billings

Por Fabrício Lobel

Em desacordo com norma estadual, a gestão Geraldo Alckmin (PSDB) está captando mais água do que deveria da poluída represa Billings, na zona sul de São Paulo.

Portaria do órgão regulador impõe limite de 2.190 litros de água por segundo na média anual que a Sabesp pode retirar da Billings para transferir ao sistema Guarapiranga, que abastece mais de 5 milhões de pessoas.

Mas, desde janeiro, a empresa tem captado 40% a mais –em torno de 3.800 litros de água por segundo.

O descumprimento da regra fixada em 2000 e ratificada em 2010 e em julho de 2015 aumenta, segundo especialistas, os riscos de parte do corpo poluído da Billings ir parar no Guarapiranga.

Principal produtora de água após a crise hídrica, a represa Guarapiranga abastece hoje as torneiras de bairros das zonas sul, oeste e centro –parte dos quais antes servidos pelo Cantareira, que esteve à beira de um colapso.

"O risco é de que a água poluída do corpo principal da Billings seja arrastada e captada pelas bombas", diz Carlos Bocuhy, ambientalista.

"Se houver bombeamento maior do que a capacidade de recomposição de água no braço em questão, poderá haver entrada de água de pior qualidade [vinda do centro da represa]", afirma Carlos Tucci, hidrólogo da Universidade Federal do RS.

Flexibilização

Diante do aumento de captação da água da Billings, a represa Guarapiranga conseguiu atingir confortáveis 85,9% de sua capacidade –contra 13,3% do Cantareira.

A diferença do limite de captação da Billings e a quantidade de água que está sendo retirada pela Sabesp é suficiente para abastecer 500 mil moradores.

A estatal paulista argumenta que um ofício de julho deste ano do Daee (Departamento de Águas e Energia Elétrica, órgão do governo estadual) abriu margem para a flexibilização da regra durante um ano.

A Billings chegou a ser apontada pelo governo como uma das soluções para contornar a crise hídrica –que impõe racionamento a milhares de moradores, de até 20 horas sem água por dia.

Alckmin chegou a chamar a Billings de "caixa-d'água de São Paulo", já que sua capacidade supera a do sistema Cantareira. A gestão estudou transferir água entre ela e a represa Rio Grande. Mas os altos custos para tratar a suja água da Billings (que tem no rio Pinheiros sua principal fonte) inviabilizou a ideia.

A última revisão formal feita pelo Daee nas regras de captação da água da Billings, em julho deste ano, permitiu que a Sabesp pudesse coletar até 5.000 litros de água por segundo em determinados instantes. Mesmo assim, a estatal só poderia captar esse volume se respeitasse os tradicionais 2.190 litros por segundo na média anual.

Em tese, essa revisão já flexibilizava a captação da Sabesp na Billings, permitindo que ela pegasse mais água em meses chuvosos e menos em menos secos. Mas isso não tem sido obedecido.

Mesmo que a Sabesp decida parar sua captação na Billings agora, não conseguirá que a média anual fique abaixo de 3.170 litros.

O Guarapiranga atendia antes da crise hídrica apenas porção da zona sul de São Paulo. A Sabesp fez com que parte de bairros como Brooklin, Jabaquara, Pinheiros, Vila Olímpia e Vila Mariana deixassem de ser atendidos pelo Cantareira e passassem ao domínio do reservatório.

Outro lado

A Sabesp, responsável pela captação de água nesse braço da represa Billings, diz que cumpre acordo firmado por meio de uma troca de carta com o superintendente do Daee (Departamento de Águas e Energia Elétrica), também vinculado ao governo do Estado de São Paulo.

Para a estatal da água, essa carta, assinada pelo departamento, revê a autorização que havia sido dada previamente à empresa e que já havia sido publicada no "Diário Oficial" do Estado de SP.

O acordo foi firmado por meio de um ofício nunca antes tornado público.

Essa carta usa como justificativa a "criticidade dos níveis de armazenamento que abastecem" a Grande SP para praticamente dobrar a quantidade de água que pode ser captada da Billings.

Decisão pública

"Não é assim que uma outorga [autorização para captação] funciona", diz o professor de hidrologia da Unicamp Antônio Carlos Zuffo.

"Essas decisões devem ser públicas e têm que ser submetidas ao comitê de bacias e publicadas no Diário Oficial".

O professor diz ainda achar estranho que o ofício tenha vindo apenas 15 dias após o próprio Daee promover uma revisão sobre a autorização de captação do Taquacetuba.

Matéria originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo

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