POR RODRIGO RUSSO – FOLHA DE S. PAULO
Usuários do transporte público paulistano têm enfrentado prejuízos e longas filas após a recente decisão da Rede Ponto Certo de pôr fim ao serviço de autoatendimento para recarga do Bilhete Único em estações de metrô e terminais de ônibus. A empresa é líder do setor na cidade.
Nesta segunda-feira (14), a Folha percorreu diversos pontos da rede de transporte e constatou a insatisfação dos passageiros com o desligamento das máquinas para recarga. Das 61 estações de metrô, 21 têm pontos de venda fora de funcionamento.
Na estação Palmeiras-Barra Funda, dez equipamentos estavam fora de serviço –uma das máquinas fora inclusive danificada por vândalos. Enquanto isso, só dois atendentes faziam o carregamento do Bilhete Único nos guichês de bilheteria.
Em frente à fila que não se dissipava, mesmo na hora do almoço, duas moças faziam publicidade de um aplicativo recém-lançado para recarga on-line do cartão.
"Fica muito ruim, a pessoa se atrasa para o trabalho. Eu já tive que ligar avisando meu chefe que ia demorar", afirmou Daniel, 19, que não quis informar o sobrenome.
Na estação Vergueiro, duas máquinas de outra empresa estavam em funcionamento. Somente uma delas, contudo, aceitava pagamento em dinheiro –quando aceitava. A ampliação das filas e a mudança de um ponto de recarga ao outro após descobrir o problema eram inevitáveis.
Algumas pessoas desistiam do carregamento do cartão e compravam o bilhete para a viagem na bilheteria do próprio Metrô. Com isso, abriam mão do benefício de pagar menos pela integração com o ônibus, por exemplo.
Recorrer à bilheteria tradicional também era a única opção de quem passava pela estação Paraíso, onde não havia autoatendimento nem guichês para o Bilhete Único.
De acordo com a Rede Ponto Certo, a suspensão das atividades nos terminais de autoatendimento ocorreu porque a taxa bruta de remuneração pelos serviços prestados é muita baixa e não estava sendo reajustada, apesar de reuniões para renegociação. No mês de novembro, o índice foi de 1,82%.
Em comunicado, a empresa lamentou "ser obrigada a tomar esta decisão" e afirmou que "estes órgãos [SPTrans e Metrô] estão inviabilizando as redes atuais".
Para atuar, as empresas se credenciam na SPTrans (empresa municipal de transportes), que gerencia o Bilhete Único e paga comissões diferentes de acordo com o tipo de crédito: 3% para o comum, 2% para o estudantil e 0,8% para o vale-transporte.
Caso desejem instalar guichês ou terminais de autoatendimento no Metrô, as prestadoras de serviço precisam pagar aluguel pelo espaço, segundo a metragem que ocupam nas estações, e oferecem um percentual variável sobre as vendas.
"Não entendo. Está todo mundo recarregando, a fila é sempre terrível, e as empresas dizem que a grana é baixa", observou Diogo Jean Pedro, 30, desempregado, enquanto esperava sua vez de ser atendido na Barra Funda.
A Ponto Certo seguirá com recargas na rede de pontos comerciais, como bancas de jornal, padarias e farmácias. Outras duas empresas, a Perto e a ProData, devem assumir os terminais no metrô.
OUTRO LADO
Por ter abandonado o contrato de venda de créditos do Bilhete Único nos terminais de autoatendimento dispostos em estações, fato que prejudica milhares de usuários, a Rede Ponto Certo foi multada pelo Metrô em R$ 508 mil.
Nas 21 estações em que o serviço não está disponível, a companhia afirma que indica aos passageiros os pontos de venda mais próximos.
A decisão de abandonar os terminais sem aviso prévio foi recebida com estranheza no Metrô, que informa que em outubro a empresa manifestou interesse em continuar explorando o serviço nas estações nos próximos dois anos.
No âmbito da SPTrans, que gerencia o transporte público da cidade, a empresa não sofrerá punições.
O órgão municipal, sob responsabilidade da gestão Fernando Haddad (PT), diz que, como o serviço é oferecido com base em sistema de credenciamento, os interessados têm liberdade para tomar suas decisões comerciais e deixar de operar sem necessidade de aviso prévio.
Há outras oito companhias nesse ramo em São Paulo, embora nenhuma tenha o tamanho ou a capilaridade da Ponto Certo –que responde pela arrecadação de 28% da recarga do Bilhete Único e detém 54,8% dos cerca de 10 mil pontos de atendimento ao usuário na cidade (inclui os localizados em pontos comerciais, como padarias).
A SPTrans informa ainda que as máquinas de autoatendimento operadas pela Ponto Certo nos terminais de ônibus estão sendo gradativamente substituídas por equipamentos das outras empresas credenciadas.
Matéria publicada originalmente na Folha de S. Paulo.