Por Adriana Franzin – Portal EBC*
Para ganhar um relógio exclusivo com a ilustração de um famoso personagem de animação, os participantes da campanha “Gulosos” teriam que comprar cinco pacotes de bolacha e pagar mais cinco reais. Na opinião do ministro Humberto Martins, relator do processo no Superior Tribunal de Justiça, a proposta configura venda casada que “aproveita da ingenuidade das crianças”.
O ministro Herman Benjamin, considerado autoridade em Direito do Consumidor, disse que o caso é paradigmático, e concordou: "Temos publicidade abusiva duas vezes: por ser dirigida à criança e de produtos alimentícios. Não se trata de paternalismo sufocante nem moralismo demais, é o contrário: significa reconhecer que a autoridade para decidir sobre a dieta dos filhos é dos pais. E nenhuma empresa comercial e nem mesmo outras que não tenham interesse comercial direto, têm o direito constitucional ou legal assegurado de tolher a autoridade e bom senso dos pais. Este acórdão recoloca a autoridade nos pais."
"Se pensarmos em termos estritamente jurídicos, isso aqui é uma aberração. Porque a criança não tem consentimento jurídico capaz de completar o negócio jurídico, mas tem o poder de convencimento – do berro a outros atos mais sutis em supermercado, fora do supermercado, o bullying dos colegas -, essa pobre criança que os pais tentam a todo custo educar ao seu modo", ressaltou o ministro.
"Não me impressiona o argumento de que milhares de anúncios similares são feitos. São mesmo. Por isso, a necessidade do Superior Tribunal de Justiça dizer para toda a indústria alimentícia: ponto final, acabou", complementou.
A ação civil pública proposta pelo Ministério Público Estadual de São Paulo foi baseada na denúncia feita pelo Projeto Criança e Consumo do Instituto Alana, que chegou a notificar a empresa, na época (em 2007). Em 2013, o Tribunal de Justiça de São Paulo condenou a Pandurata a pagar R$ 300 mil de indenização pelos danos causados à sociedade pela campanha publicitária. A empresa recorreu e o caso chegou ao STJ.
Segundo informações do STJ, no julgamento, a empresa alegou que a campanha publicitária era dirigida aos pais e negou se tratar de prática enganosa, abusiva e ilegal. Mas em decisão unânime os ministros integrantes da Segunda Turma, que avaliaram o caso, defenderam o contrário.
Para a ministra Assusete Magalhães, presidente da Segunda Turma, é “caso típico de publicidade abusiva e de venda casada, igualmente vedada pelo CDC, numa situação mais grave por ter como público alvo a criança”.
*Com informações do Superior Tribunal de Justiça e do Criança e Consumo.
Matéria publicada originalmente no portal EBC.