POR LEANDRO MACHADO – FOLHA DE S. PAULO
Na unidade do Albert Einstein no Ibirapuera (zona sul de São Paulo), uma funcionária do hospital dá expediente na calçada para consultar cada motorista na entrada engarrafada do estacionamento. "Vacina da gripe ?", questiona ela, para logo alertar: "Está demorando duas horas e 40 minutos".
Hospitais e clínicas particulares da capital paulista enfrentaram nesta terça-feira (29) uma corrida frenética pela vacina contra a gripe H1N1: salas de espera e estacionamentos lotados; força-tarefa de atendimento; e pais impacientes com a demora para a chamada das senhas.
O surto da doença ocorreu dois meses antes do previsto e já resultou em 45 mortes este ano no país, 38 delas em São Paulo. A quantidade de infectados até agora já supera a de 2015 inteiro.
A vacina será antecipada para parte da rede pública paulista a partir de 11 de abril, mas só para grupos de maior risco. Enquanto isso, tem sido disputada em filas de cerca de três horas nas unidades de saúde particulares que já dispõem dos novos lotes.
O estacionamento no Einstein do Ibirapuera não aguentou a demanda: as filas de carros com crianças começavam do lado de fora, onde uma funcionária já fazia a triagem. "Ninguém está desistindo [da vacina]", disse.
A naturóloga Tainá Almeida, 28, aguardou por mais de duas horas para conseguir vacinar seu marido, ela própria e a babá de seu filho de seis meses. O bebê, porém, ainda não pôde receber a dose. "Virou um caos, né? Não sei nem se é pra tudo isso, mas todo mundo está assustado com as notícias [de surto da doença] e ninguém quer correr risco", afirmou.
Essa unidade do Einstein só recebeu nesta terça-feira a vacina tetravalente, pela qual cobra em torno de R$ 200 e que imuniza contra quatro tipos de vírus influenza. A rede pública terá apenas a trivalente, contra três tipos. Em ambos os casos está embutida a proteção contra H1N1.
'PEDIMOS PACIÊNCIA'
Na clínica Cedipi, na região da avenida Paulista, a fila da vacina também chegava na calçada pela manhã. As doses acabaram. "Estaremos aguardando novos lotes", dizia a mensagem no site da clínica à tarde, junto com um alerta de congestionamento das linhas telefônicas devido à grande procura: "pedimos paciência e compreensão."
Na Pro Matre, a sala de espera também estava lotada. "Acho uma vergonha a rede particular já ter a vacina e a pública, não", reclamava a securitária Maria Cristina Wicher, 46. Ela e a filha Luana, 5, aguardaram por duas horas a vez de receber a imunização no hospital. "Achei assustador, gente sendo internada com gripe, e preferi pagar".
No centro de imunização do complexo, que abrange também as vacinas aplicadas pelo hospital Santa Joana, a média habitual de doses contra a gripe H1N1 era de 10 mil no período de cinco meses a partir do início do outono. Só na última semana, no entanto, foram vacinadas 3.000 pessoas pelo grupo. Para os próximos meses, os dois hospitais esperam triplicar a quantidade em relação ao outono e ao inverno de 2015.
LUGAR NA FILA
Ainda faltava cerca de uma hora para a vacina finalmente sair. Isso se o tempo estimado pela clínica Cedipi –três horas– fosse cumprido à risca. A empresária Mônica Piccinin, 41, esperava sentada com a filha Maria Fernanda, 2, do lado de fora.
A babá de garota aguardava na fila dentro da clínica. "Quero evitar que a Maria Fernanda pegue outras doenças", disse a empresária, em referência ao risco de contaminação em uma clínica lotada de crianças. A família chegou às 10h40 e recebeu o aviso: no mínimo, três horas de espera. "Que situação a gente se coloca por essa vacina", disse.
Na segunda (28), a empresária não havia conseguido imunizar a criança no hospital Albert Einstein, no Morumbi (zona oeste), onde mora. A fila estava "impraticável". "A gente conversa com mães do colégio. Algumas crianças pegaram a gripe. Aí rola aquele desespero dos pais", diz Mônica.
Na unidade do Einstein do Ibirapuera (zona sul), mães e pais criaram estratégias para amenizar a fila também de quase três horas. Faziam a ficha de inscrição, pegavam a senha e voltavam para casa. Só retornavam ao hospital duas horas depois.
Foi o caso da naturóloga Tainá Almeira, 28. "Eu vi que iria demorar. Acabei voltando para casa e esperei lá." O marido de Tainá estava trabalhando. Quando a senha estava perto de ser chamada, foi correndo para o Einstein e recebeu a vacina.
POR TABELA
Quem foi a clínicas e hospitais particulares nesta terça (29) aproveitava para vacinar todos do círculo familiar, não só as crianças. Pai, mãe, irmãos e babá também recebiam as doses. Os arquitetos Juliana, 37, e André Scovoli, 40, se vacinaram junto com os dois filhos. Levaram também uma amiga das crianças.
No Cedipi, mesmo quem não foi pela vacina da gripe acabou pegando fila "por tabela". A fisioterapeuta Camila Bueno, 37, levou o filho Lucas, 1, para tomar outra imunização. Esperou duas horas. "Está cada dia pior", diz ela, em relação às filas. Para a proteção contra a gripe, Camila resolveu esperar por uma dose da tetravalente, mais completa, ainda não disponível na clínica.
Matéria publicada originalmente na Folha de S. Paulo.