Valor das multas é cobrado nos repasses mensais feitos às Organizações Sociais. Só em janeiro, o corte foi de R$ 13 milhões
ADRIANA FERRAZ – O ESTADO DE S. PAULO
Descumprir a regra que determina equipe mínima para assegurar o atendimento nas unidades de saúde geridas por Organizações Sociais (OSs) já causou descontos de R$ 51 milhões nos contratos assinados pela gestão Fernando Haddad (PT) de 2014 até hoje. De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde, o valor das multas é cobrado nos repasses mensais feitos às entidades. Só em janeiro, o corte foi de R$ 13 milhões.
Apesar da punição, o déficit de médicos ainda é alto nos postos de saúde terceirizados. Na Assistência Médica Ambulatorial (AMA) Castro Alves, na Capela do Socorro, na zona sul, por exemplo, dados oficiais mostram que faltam oito pediatras para cumprir plantões de 12 horas por dia. Na Unidade Básica de Saúde (UBS) Vargem Grande, em Parelheiros, também na zona sul, a procura é por médicos generalistas. O posto tem três profissionais a menos do que o número determinado pela Prefeitura.
A fiscalização sobre o andamento das contratações feitas pelas entidades faz parte do modelo de organização criado pela gestão Haddad em 2013. Os primeiros contratos, já sob as novas regras, foram assinados em outubro do ano seguinte. Segundo a secretaria, há agora instrumentos jurídicos que permitem à Prefeitura maior controle do trabalho das OSs. A médio prazo, a expectativa municipal é de que o número de multas diminua e a qualidade do atendimento aumente.
A pasta afirma que o conceito de equipe mínima fez com que o déficit de médicos em toda a zona sul caísse 58% em cerca de um ano e meio – passou de 96 para 40. As organizações chegam a perder 15% dos repasses na fase inicial do serviço por descumprir a regra.
“Os descontos começam altos quando a OS está assumindo as unidades. Depois isso vai caindo. Quanto mais antigo o contrato, menos buracos temos nas equipes”, afirma a chefe de gabinete da pasta, Mariana Almeida, que classifica o controle atual como “supereficiente”. Ao ter o repasse descontado, diz ela, a entidade se esforça para concretizar a contratação dos médicos.
O objetivo final é melhorar os índices de realização de consultas e demais serviços médicos. Levantamento feito pela reportagem em 2013 mostrou que as OSs realizaram naquele ano só 7 de cada dez consultas de especialidades pelas quais foram pagas pela Prefeitura.
Meta
Especialistas ouvidos pelo Estado, no entanto, discordam da relação direta entre os descontos efetuados pela Prefeitura e a garantia de atendimento à população, principalmente quando se trata da qualidade nos serviços.
“Essas multas aplicadas pela falta de médicos certamente representam um maior controle dos contratos. É um avanço. É preciso investigar se os que não faltam estão dando conta de realizar as metas de consultas e a contento”, diz Oswaldo Tanaka, professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP).
Os contratos atuais de gestão preveem outros dois tipos de desconto, ambos relacionados ao cumprimento de metas de atendimento e com qualidade. Os números de consultas e exames realizados são estudados a cada três meses pela secretaria. A entidade corre o risco de ser multada caso não consiga cumprir ao menos 85% dos atendimentos previstos.
O presidente do Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp), Eder Gatti Fernandes, alerta para a sobrecarga sofrida por médicos que atuam em equipes incompletas. “Para cumprir as metas estabelecidas pela Prefeitura, eles acabam trabalhando além do tempo e sob pressão da chefia”, afirma.
Fernandes defende a padronização dos contratos efetuada pela gestão Haddad, mas ressalta que a padronização não pode ser feita por baixo. “A equipe mínima virou a equipe padrão, é claro. E, na saúde, você não pode trabalhar sempre no limite. Isso não é bom para ninguém.”
Gastos
Tema polêmico nas últimas eleições municipais, a contratação de OSs para gerenciar unidades de saúde foi ampliada ao longo da gestão petista. Com Haddad, os gastos com repasses às entidades cresceram 35%. Em 2013, quando assumiu a Prefeitura, os repasses eram da ordem de R$ 2,3 bilhões. No ano passado, o número fechou em R$ 3,1 bilhões.
Matéria publicada originalmente no jornal O Estado de S. Paulo.