RODRIGO RUSSO – FOLHA DE S. PAULO
Apesar das promessas do governo Geraldo Alckmin (PSDB) de modernização e melhoria nos trens da CPTM, as falhas se tornaram mais frequentes e as viagens descumpridas quase dobraram no intervalo de cinco anos.
Dados obtidos pela Folha por meio da Lei de Acesso à Informação mostram que as partidas programadas que deixaram de ser feitas pelos trens cresceram de 4,3% do total, em 2010, para 7,9% em 2015 –ano em que a companhia transportou mais de 831 milhões de passageiros. Na prática, quando uma viagem prevista não é cumprida, a espera dos usuários aumenta nas plataformas –podendo agravar também a superlotação nos vagões.
O número de partidas programadas também subiu nesse período, de 769 mil para 933 mil, provavelmente devido à compra de mais trens. A quantidade de viagens descumpridas, entretanto, cresceu proporcionalmente ainda mais –de 33 mil, em 2010, para 74 mil, em 2015.
Embora tenha adquirido novas composições e reformado estações nos últimos anos, a CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) sofreu críticas por atrasos em investimentos de modernização.
Diferentemente do Metrô, a empresa depende de recursos do Estado para manter sua operação –só no ano passado foram necessários quase R$ 1 bilhão em subsídios para compensar a diferença entre seus gastos e a tarifa que é paga pelos passageiros. A CPTM atribui parte das viagens descumpridas às obras de modernização "intensificadas" a partir de 2011, elevando os intervalos em período de menor movimento.
A PIOR E A MELHOR
A pior situação é a da linha 7-rubi, que liga a estação da Luz ao município de Jundiaí e por onde passam, em média, 460 mil passageiros por dia. No ano passado, 15,5% das partidas deixaram de ser feitas pelos trens. Em 2010, esse índice era de 5,5%.
"É muito lotado, atrasa demais. Minha família sempre reclama", diz Marlene da Silva, dona de casa que vive em Francisco Morato, cidade por onde passa a linha 7. "É uma briga para pegar lugar e nunca melhora. Eles prometem, mas nada muda", lamenta ela, que leva até uma hora e meia para fazer sua viagem.
A lojista Evelin Marcelino, 38, mostra as consequências práticas dos problemas na CPTM. "Meus patrões não contratam mais gente que mora em Francisco Morato." Na semana passada, Evelin ficou mais de 30 minutos em um trem parado na linha 7 em pleno horário de pico. "Tem manutenção todo fim de semana, mas faz mais de quatro anos e parece que nunca acaba nem melhora."
O melhor cenário está na linha 8-diamante, que vai da estação Júlio Prestes, no centro de São Paulo, até a cidade de Itapevi e que transporta 495 mil passageiros por dia. Essa linha foi alvo de PPP (parceria público-privada) que incluiu fornecimento e manutenção da frota. O menor número de viagens cumpridas pela empresa está relacionado ainda às falhas no sistema da CPTM, que vêm se tornando cada vez mais frequentes.
As empresas metroferroviárias usam um índice chamado MKBF (média de quilômetros entre falhas, em inglês) para medir sua performance: quanto mais baixo, menores são os intervalos entre um problema e outro. De 6.856 quilômetros rodados entre falhas em 2010, esse número passou para 5.639 quilômetros em 2015, uma queda de 18% -indicando pior desempenho da frota.
Especialistas em transportes públicos que analisaram a evolução mensal do MKBF da CPTM apontam que, até meados de 2013, havia muita oscilação no índice, evidência de sistema muito instável. A partir de então, esse número se estabilizou –em tese seria positivo, mas ficou abaixo da média anterior.
O consultor de transportes Peter Alouche, especialista em trilhos, afirma que "a CPTM tenta transformar seu sistema em um metrô de superfície, em um plano ambicioso de melhorias, mas nada foi feito completamente". Alouche cita como exemplo as expectativas anunciadas pela companhia de melhor sinalização e de novas subestações elétricas.
"Os planos são bons, mas não houve sincronização entre eles. Tentando fazer tudo ao mesmo tempo, sem coordenação central, acaba-se inevitavelmente por gerar mais falhas", afirma Alouche.
OBRAS
A gestão Alckmin (PSDB) atribui parte do crescimento de viagens descumpridas pela CPTM nos últimos anos às obras nas linhas –que provocam interferências na programação dos trens.
Em relação ao aumento de falhas, a companhia estadual diz que houve um processo de renovação da frota e que "um número significativo de trens passou a operar com sistema eletrônico de diagnóstico moderno, conferindo maior precisão e detalhamento aos registros de falhas".
Segundo a CPTM, a nova tecnologia "impactou na relação de falhas por quilômetro rodado, já que o sistema registra todas as interferências no trem, mesmo aquelas imperceptíveis aos usuários e para a circulação de trens". Por outro lado, diz a empresa, "essa é uma ferramenta que permite prevenir problemas mais graves, pois detecta preventivamente de imediato qualquer defeito nos componentes da composição".
Sobre as viagens não cumpridas, a CPTM afirma que a "a partir de 2011, as obras de modernização foram intensificadas, especialmente nas linhas 7, 8 e 9". "Por esse motivo, em alguns horários os intervalos aumentaram no período de menor movimento, reduzindo o número de viagens realizadas", diz.
Os dados apontam piora nos índices inclusive nas demais linhas –10, 11 e 12. A CPTM afirma que "o atual sistema de controle de tráfego não reprograma automaticamente as viagens quando há intervenções na circulação dos trens, mesmo que estejam previstas com antecedência, como as obras de manutenção, modernização, passagens de trens de carga ou veículos de manutenção, entre outras interferências possíveis".
Quando isso ocorre, diz a CPTM, "a regulação da circulação de trens é feita através de simulador computacional utilizando mapeamento digital para a busca de menores impactos na circulação". "Esse fator é o principal motivo da diferença entre as viagens programadas e as realizadas."
Ainda segundo a companhia, "o processo de modernização prevê, para os próximos anos, a implantação de novas tecnologias que farão a reprogramação automática das viagens diretamente na circulação quando houver intervenções agendadas".
O valor do investimento na modernização da CPTM nos últimos cinco anos foi de cerca de R$ 4 bilhões. As obras incluem implantação de novos sistemas de sinalização, de energia e rede aérea, comunicação, via permanente e modernização de estações.
Matéria publicada originalmente na Folha de S. Paulo.