Projeto de Haddad prevê anúncio em banca de jornal

Texto que está na Câmara é criticado por idealizadora do Cidade Limpa

DO "AGORA"

A gestão Fernando Haddad (PT) quer liberar a publicidade nas cerca de 4.500 bancas de jornais da capital paulista. Um projeto do prefeito, que deve ir para segunda votação na Câmara Municipal na semana que vem, é alvo de críticas dos autores da Lei Cidade Limpa –que barrou a publicidade em outdoors na cidade em 2006, na administração Gilberto Kassab (PSD).

Para a urbanista Regina Monteiro, idealizadora da lei, essa propaganda permitirá a volta da poluição visual. A prefeitura nega. Argumenta que a publicidade nas bancas –que são consideradas parte do mobiliário urbano– já estava prevista na própria Lei Cidade Limpa.

Pelo projeto, os donos das bancas (que têm concessão pública) poderão negociar diretamente com os anunciantes ou por intermediação do sindicato da categoria, sem necessidade de licitação. Cada banca terá direito de exibir até quatro painéis nas faces externas, com medidas de até 90 cm de largura por 1,80 m de altura. Serão permitidas imagens impressas iluminadas, mas estão proibidos telões ou televisores.

Os donos de banca terão que pagar uma contrapartida à prefeitura, além de reformar as bancas para adaptá-las ao modelo. O valor da contrapartida, que ainda será definido, irá para um fundo destinado à paisagem urbana.

A prefeitura poderá ocupar até um quarto do espaço destinado aos anúncios para campanhas próprias durante 12 semanas do ano.

O secretário de Relações Governamentais da gestão Haddad, José Américo Dias, diz que a previsão é arrecadar R$ 8 milhões já no primeiro ano do programa. Ele estima que 2.000 bancas devem aderir à ideia inicialmente. "Hoje as bancas estão muito deterioradas. Esse projeto prevê uma sobrevida para as bancas, que, com a internet, perderam seu papel", afirma.

A urbanista Regina Monteiro diz que é a favor da padronização das bancas, mas contra a publicidade. Segundo ela, a concessão da propaganda só pode ser feita por meio de licitação e, embora façam parte do mobiliário, as bancas de jornal não são apropriadas como vitrine publicitária. Ela afirma que, se o texto for aprovado, entrará com uma representação no Ministério Público.

Atualmente, a exploração publicitária do mobiliário urbano ocorre nos relógios e pontos de ônibus. Em ambos os casos, houve licitação e a concessão ficou a cargo de consórcios de empresas.

QUEDA DE MULTAS

O número de multas aplicadas pela prefeitura por descumprimento da Lei Cidade Limpa, em vigor desde 2006, vem caindo desde que Fernando Haddad (PT) assumiu a prefeitura, em 2013. Em 2012, último ano da gestão Gilberto Kassab (PSD), foram feitas 2.555 autuações sob a lei. Em 2013, as multas foram 366. No ano passado, foram 433, e neste ano, até maio, houve 243 autuações.

A lei começou a valer em 2007, e foi considerada a marca da gestão Kassab. Nas ruas comerciais, as faixas, cavaletes e banners voltaram. Nesta segunda-feira (20), a reportagem encontrou irregularidades na rua 12 de Outubro, na Lapa, na zona oeste, e nas ruas Salvador de Medeiros e avenidas Arlindo Colaço, Afonso de Sampaio e Souza e Mateo Bei, na zona leste.

Atualmente, a fiscalização depende de reclamações de moradores. A reportagem entrou em contato com as subprefeituras de São Miguel Paulista (zona leste), Lapa (zona oeste) e Santo Amaro (zona sul). Nas três, funcionários afirmaram que a fiscalização só é feita quando há alguma denúncia.

Em junho do ano passado, ao ser questionada pelo "Agora" em razão do baixo número de multas, a prefeitura afirmou que havia feito uma operação contra a poluição visual. Mas comerciantes ouvidos pela reportagem dizem que a fiscalização não é comum.

"Há anos um fiscal da prefeitura veio aqui e disse para retirarmos o logotipo da empresa da fachada, mas nunca mais vieram", contou o gerente de uma loja de cosméticos na avenida Mateo Bei. O comércio tinha diversas faixas irregulares na fachada.

"Nunca veio ninguém aqui falar sobre nenhuma irregularidade", afirmou o gerente de uma loja de roupas na mesma via, que tinha faixa, banner e cavalete com propaganda.

A Secretaria de Coordenação das Subprefeituras afirmou que criou uma equipe com dez pessoas para fiscalizar a Cidade Limpa. "Desde maio, equipe uma exclusiva da secretaria intensificou o trabalho de remoção de cavaletes, placas, faixas, banners, lambe-lambes e outros em todas as regiões da cidade", disse o secretário adjunto das Subprefeituras, José Rubens Domingues Filho.

Ele negou que os fiscais só autuem irregularidades mediante denúncia. "Vou apurar o motivo de terem informado que a fiscalização só atua após avisada dos problemas", disse. A Associação Comercial de São Paulo disse que orientou seus associados. "Creio que o número de multas caiu também porque o comércio regular assimilou a lei", disse o superintendente institucional da entidade, Marcel Solimeu.

O atual ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Gilberto Kassab (PSD), em cuja gestão a lei começou a valer, criticou a falha na fiscalização. "Nosso objetivo nunca foi multar mas sim despoluir a paisagem urbana da cidade", afirmou o ministro. "Lamento saber que a fiscalização foi praticamente extinta, pois isso acaba indiretamente estimulando o desrespeito", afirmou Kassab.

Matéria publicada na Folha de S. Paulo

 

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