Descrédito da política, custos e burocracia de partidos fazem aspirantes suspenderem planos
Gilberto Amendola – O Estado de S.Paulo
Allan Victor, de 26 anos, quase foi candidato a vereador. Formado em Rádio e TV, sentiu o gostinho da militância política em 2013, quando participou das já históricas manifestações de junho. Ainda sob o impacto das jornadas, decidiu procurar um partido para chamar de seu. “Quando contei para amigos e parentes sobre meu projeto de ser candidato, a reação foi 99% negativa. Diziam coisas como ‘nesse meio só tem ladrão’ ou ‘não vai se meter nisso’ e ‘não é ambiente pra você”, lembra Victor.
Mas ele não deu ouvidos aos apelos e filiou-se ao PV. “Entrei no PV porque buscava algo que não fosse muito extremo, que não estivesse nem muito à direita nem muito à esquerda”, completa. Ao concluir o primeiro passo de uma possível candidatura, Victor começou a enfrentar outras barreiras.
“O partido exigia que eu participasse de todas as reuniões. Mais do que isso, que levasse pelo menos cinco conhecidos em cada reunião, além de condicionar minha candidatura a participações em eventos como ‘a noite da pizza’, em que eu tinha que pagar convites de R$ 150”.
A má-fama dos políticos, a pressão familiar, a burocracia partidária e a falta de recursos financeiros fizeram com que Victor desistisse. Sobre os dois últimos itens da desistência, o presidente estadual do PV, Marcos Belizário, se manifestou.
“O partido exige participação em reuniões e, eventualmente, alguma ajuda financeira via venda de convites para a participação de eventos. O que não procede é essa versão de que o partido condiciona uma candidatura ao dinheiro. O que fazemos é uma capacitação de quem pretende se candidatar”, rebate Belizário o comentário de Victor.
Descrédito
Para o coordenador do movimento Rede Nossa São Paulo, Oded Grajew, o momento seria propício para o aparecimento de novos candidatos, mas… “Alguns partidos funcionam como cartórios. Existe pouca democracia interna e as escolhas acabam sendo as mesmas em todas as eleições. É uma pena. Existe uma sensibilidade, uma vontade de renovação, que as siglas não captaram”, analisa. “Felizmente, essa geração também está entendendo que existe participação política fora do âmbito eleitoral ou partidário”, acrescenta Grajew.
Sobre o carimbo de corrupto que tem acompanhado quem tenta ingressar no universo político-partidário, ele lamenta. “Pior do que qualquer dinheiro desviado, essa criminalização da política é o grande estrago que Cunhas (Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados) deixaram como legado.”
Já para o consultor de marketing político Marco Iten, as pessoas desistem de suas candidaturas porque os partidos não são acessíveis. “A pessoa não consegue descobrir sequer como encontrar a sede de um partido, com quem precisa falar ou quais são as regras de uma candidatura. Não se tem conhecimento das regras mínimas de uma eleição”, diz. “Não conhecer as regras, faz muita gente desistir.”
Marcos Vinícius de Campos, um dos coordenadores da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps), um centro de formação de quadros políticos próximo da Rede, PSB, Partido Novo e outras legendas, afirma que o aspirante a candidato precisa ter formação política para não se transformar em um “inocente útil” dentro dos partidos. “É preciso que esse candidato tenha dimensão do que é uma eleição, que não queira entrar no jogo político movido apenas por falsas e irrealistas expectativas”, sugere. O pior, diz, é quando o quase candidato faz de uma eleição uma busca por um emprego. “Esse tipo de candidato acaba sendo iludido”, diz Marcos Vinícius.
Incumbentes
Outro motivo fez o presidente estadual do PV, dono de quase 14 mil votos na última eleição à Câmara Municipal, ficar de fora dessa corrida. “Eu tenho fígado. Faço política com o fígado. Pra mim não dá mais. Eu também tenho uma vida profissional que não posso abrir mão. Hoje, para ser candidato, você precisa abrir mão da sua vida profissional e pessoal”, diz Belizário.
Quem também não vai ser candidato a nada nestas eleições é Alexandre Schneider, que em 2012 foi o vice na chapa de José Serra. “Tenho me dedicado à sociedade civil. Atualmente, minha contribuição não é política partidária, mas de uma forma mais conectada com a sociedade mesmo. Não quer dizer que amanhã eu não possa voltar”, avisa o ex-vice-candidato.
Desafiantes
Quem é novo no segmento e não desistiu, precisou se organizar. É o caso da Bancada Ativista, formada por oito pré-candidatos a vereador, oriundos de partidos como PSOL e a Rede. A união suprapartidária tem como mote a “oxigenação da política” através de nomes novos e de pessoas ligadas às questões sociais e ambientais. Ao se estruturar como um coletivo, a Bancada Ativista tenta evitar as armadilhas do processo e consolidar candidaturas novas.
“Não é fácil entender e navegar com segurança no processo eleitoral. As dinâmicas partidárias e as regras eleitorais são muitas e frequentemente têm múltiplas interpretações. Uma candidatura só supera essas fragilidades se tiver recursos para investir, e isso determina a desigualdade e a ausência de diversidade nas disputas e na ocupação dos espaços de poder”, afirmou em nota.
Matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo.