Por Agência Brasil
A maioria dos brasileiros (74%) é a favor de ações que reduzam o espaço do veículo particular nas ruas se o motivo for dedicar esse espaço para ciclovias, corredores de ônibus e calçadas, apontou pesquisa sobre mobilidade urbana encomendada pelo Greenpeace ao Instituto Datafolha.
A pesquisa foi realizada com 2.098 entrevistados de 16 anos ou mais, em 132 municípios de todas as regiões do país. Inicialmente, a pesquisa consultou a população sobre três medidas, em perguntas separadas, que desestimulariam o uso do carro.
Aquela que teve maior aceitação foi a de redução do número de vagas para carros nas ruas, que teve o apoio de 47% da população. Uma fatia de 41% foi contrária à medida, 9% são indiferentes e 3% não responderam.
A segunda questão foi sobre a redução do número de faixas para carro nas vias, que apresentou tendência inversa: 40% foram a favor da medida e 49%, contra. A parcela de indiferentes é de 8%, e 4% não souberam opinar.
O fechamento de determinas ruas para carros, que corresponde à terceira pergunta, foi a questão que teve maior resistência entre os brasileiros: 36% a favor, 52% contra a medida, e os demais indiferentes (8%) ou não responderam (3%).
Após essas questões apresentadas, a pesquisa consultou os entrevistados sobre o motivo para que houvesse a redução do espaço para carros particulares e, somente então, veio a maior aceitação, com 74%.
“Primeiro perguntamos para as pessoas o que elas achavam de cada uma dessas três medidas e em seguida perguntamos para as pessoas se, [por meio] dessas medidas de redução, fosse dado espaço para esses outros meios de transporte, se ela era contra ou a favor. A diferença é que a primeira vez perguntamos só com a medida em si. Mas quando explicamos que isso vai ser usado para dar espaço para outros modos de transporte, as pessoas são a favor”, explicou Vitor Leal, da campanha de Mobilidade Urbana do Greenpeace.
De acordo com ele, as pessoas tendem a concordar com a redução do espaço para os carros quando enxergam um benefício para os outros modelos de transporte.
No início, segundo Leal, as pessoas veem essas medidas como uma perda, porque estão tirando espaço do carro, mas depois conseguem ver o benefício de se fazer isso. Segundo ele, é necessário a abertura de diálogo entre o governante e a população para esclarecer a questão.
“Uma das coisas que vemos que é importante a partir desse cenário é que o poder público precisa dialogar mais com a sociedade, explicando melhor para que servem as coisas e não tirar o espaço sem explicar o que está acontecendo. Fazer uma discussão dizendo olha, vamos colocar mais corredores de ônibus, isso significa que vai ter menos pistas para os carros, mas isso vai diminuir o trânsito, isso vai garantir um transporte de qualidade”, disse.
Preferências
Questionados sobre qual meio de transporte seria escolhido para circular na cidade, se houvesse infraestrutura adequada, o ônibus seria a escolha de 42% dos entrevistados, seguido por carro (23%) e bicicleta (21%) – na prática, os dois últimos estão empatados pela margem de erro de dois pontos da pesquisa.
Para Leal, foi uma grande surpresa perceber que as pessoas valorizam o transporte público. “São dados importantes para vermos que há uma valorização do transporte público e aí entendemos que o poder público não está respondendo adequadamente a isso, porque boa parte dos investimentos vai para espaços para o automóvel”, disse.
“O que está faltando então é as pessoas sentirem que é possível: um ônibus de qualidade, uma tarifa justa, ônibus que não poluam tanto e que não façam tanto barulho, ciclovias, infraestrutura para bicicleta e para pedestre. As pessoas escolhem o carro muitas vezes porque sentem que os outros meios de transporte não tem qualidade suficiente”, acrescentou.
Ele ressalta que boa parte da discussão dos candidatos à eleição na capital paulista se dá em torno da redução de velocidade nas vias, especialmente as Marginais Tietê e Pinheiros, no entanto, não é um tema que atinge a maior parte da população.
“É um tema que importa para uma parcela pequena da população, que é a que usa carro e que vai para a marginal e que é contra [a redução de velocidade]”.
“O que fica claro para mim é que as pessoas estão interessadas em como garantir a mobilidade delas e, se significa tirar espaço do carro para dar para outros modos de transporte, isso é ótimo, mas continuamos vendo os discursos de candidatos do Brasil inteiro que continuam falando só para quem anda de carro e, de vez em quando, falam um pouco sobre ônibus de um jeito genérico”, avaliou.
“Eu gosto de chegar logo”
O músico Daniel Daibem, 43, mora na Consolação, região central da capital paulista, e escolheu utilizar ônibus e andar a pé para se locomover pela cidade.
“Hoje a minha resposta seria irônica para a pergunta 'por que você prefere o ônibus e não o carro?'. Porque eu gosto de chegar logo. É uma resposta que podemos dar nos últimos três anos por causa dos corredores”, disse.
Os motivos para essa decisão incluem a economia do ônibus em relação ao carro particular e a possibilidade de realizar outras tarefas enquanto está sendo conduzido, como falar ao telefone, mandar e-mail e trabalhar. Ele utiliza aplicativos de celular que o ajudam a se organizar.
Por meio deles, Daniel pode consultar que linhas de ônibus o levam para cada destino e ainda para saber a que distância está o ônibus que ele pretende pegar.
Sobre o congestionamento caótico da capital paulista, ele dá uma dica. “Hora do rush não é hora de entrar no trânsito. Hora do rush é hora de fazer inglês, hora de ir na terapia, hora de tomar sorvete, hora de fazer qualquer coisa, menos entrar no trânsito. [As pessoas] poderiam ter essa iniciativa de se organizar, de não se enfiar no trânsito”.
Matéria publicada na Exame.