ARTUR RODRIGUES E PAULO SALDAÑA – FOLHA DE S. PAULO
Desempregada, Joyce Dias Gomes, 19, conta que se assustou ao encontrar na bolsa do filho, Dhereck, 2, um comunicado anunciando que receberia apenas um quarto do leite que costuma levar da creche municipal onde ele estuda, na capital paulista.
"Fiquei desesperada, vai fazer muita falta para mim e para outras mães aqui do bairro", diz Joyce, moradora da zona norte de São Paulo que perdeu o emprego de atendente no começo do ano.
O comunicado enviado pela gestão Fernando Haddad (PT) aos pais informou que os beneficiados pelo Leve Leite receberiam só um quilo de leite em pó na remessa mais recente. Normalmente, 900 mil crianças recebem o lote com quatro quilos no bimestre.
O corte, a menos de três meses do fim do mandato, ocorre devido "às restrições orçamentárias pontuais surgidas com a queda de arrecadação fiscal, fruto da crise econômica pela qual passa nosso país, com impacto em todos os Estados e municípios", segundo a carta aos pais.
"Fui até a escola falar com a diretora e ela disse que não tem o que fazer. Tem uma mãe lá que tem três filhos, imagina o que ela vai gastar. Tanta coisa para cortarem e vão tirar o leite das crianças", diz Joyce, cujo filho estuda na escola Cantinho da Serra, no Jardim Peri, extremo norte.
O peso também será grande no orçamento da família de Helio Moreira de Souza, 60, desempregado, que passará a receber menos leite para a neta Ana Clara, 2.
"Esse leite ajuda muito em uma região carente como a nossa", diz ele, que mora no Jardim Vista Alegre, também na zona norte. "É muito estranho isso. O prefeito perdeu e a primeira pancada dele é na periferia", reclama.
Líder comunitário da zona norte, Henrique Deloste afirma que tem recebido reclamações de mães indignadas. "Os mais prejudicados são os que moram na periferia. É uma falta de respeito com quem elegeu essa gestão."
Os pais ainda se queixam da falta de clareza a respeito do período em que vão ficar com as entregas irregulares.
"Na escola da minha filha, vi todo mundo falar que serão por três meses. Eu estou muito preocupada porque dependo desse leite", disse a atendente de telemarketing Keti Santana Soares, 37, moradora da Brasilândia (zona norte) e mãe de Kemilly Santana de Castro, 3. "Há um mês perdi o meu emprego e as minhas condições financeiras ficaram ainda piores", disse.
OUTRO LADO
Questionada, a gestão Haddad afirma que a alteração ocorreu no final do quinto ciclo de entrega (são seis ao ano) e que "trabalha para normalizar os serviços".
Ela diz que o problema é temporário, mas não especifica por quanto tempo. O leite é enviado bimestralmente, mas já vinha sofrendo atrasos. Para receber o leite, as crianças precisam ter 90% de frequência na escola.
Matéria publicada na Folha de S. Paulo.