Doria quer ‘destravar’ projetos de habitação popular com parcerias

POR GIBA BERGAMIM JR. – FOLHA DE S. PAULO

Para fazer andar a histórica e longa fila por moradia na cidade de São Paulo, o prefeito eleito João Doria (PSDB) apostará suas fichas em projetos de habitação que estão travados nos últimos anos.

São eles o federal Minha Casa, Minha Vida e o estadual Casa Paulista, criado por seu padrinho político, o governador Geraldo Alckmin (PSDB).

Atualmente, estima-se que sejam necessárias 368 mil moradias novas na cidade. Na fila, porém, só aparecem as 120 mil famílias inscritas e com cadastro atualizado neste ano. Para atacar essa demanda, o tucano não estabelece metas e afirma que pretende acabar com a fila "o quanto antes".

Promete, por exemplo, parcerias público-privadas (PPPs) por meio do projeto estadual de habitação, algo que não tem andado sob Alckmin na capital paulista.

Por meio do Casa Paulista, somente 126 moradias serão entregues até o fim deste ano, resultado de um primeiro contrato de PPP que previa cerca de 3.600 apartamentos na região central.

O plano, numa parceria de Estado e prefeitura para levar moradores de baixa renda ao centro, foi anunciado em 2013, mas a assinatura do primeiro contrato só ocorreu em 2015.

A secretaria estadual de Habitação diz que, além dos 126 entregues, há 91 em construção e outros 1.200 que dependem de licenças para serem iniciados.

Tanto o Casa Paulista como o Minha Casa, Minha Vida padecem sob a crise econômica, com falta de verba e de empresas interessadas em parcerias, assim como trâmites burocráticos para desapropriação de terrenos. Cenário, aliás, que tende a permanecer ao menos no início da gestão Doria.

O atual prefeito, Fernando Haddad (PT), prometera a construção de 55 mil novas moradias. Mas, até agora, em especial devido à paralisia do Minha Casa na gestão Dilma Rousseff (PT), somente 12.585 foram entregues –outras 23.624 ainda estão em obras.

FILA LONGA

Acabar com um déficit que inclui pessoas cadastradas há mais de três décadas levaria quase 70 anos, segundo o secretário municipal de habitação, João Whitaker.

"Isso se fossem investidos cerca de R$ 800 milhões ao ano [média de investimentos na área nos últimos anos]", diz ele, que é professor da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo) da USP.

Segundo a prefeitura, desde o fim de 2014, nenhum contrato do Minha Casa é assinado. Um ano antes, Dilma prometeu enviar R$ 1,4 bilhão para a construção de cerca de 18 mil moradias. Até o fim de 2015, os valores repassados alcançaram pouco mais da metade disso (56%)–aproximadamente R$ 780 milhões.

Segundo especialistas ouvidos pela Folha, o complexo déficit habitacional depende de uma série de iniciativas que só vão funcionar se município, Estado e União estiverem afinados. Não só na entrega de imóveis com acesso a transporte público, mas em processos de reurbanização.

"Não vamos resolver o problema a curto prazo e com uma solução só. É uma tarefa de gerações, com um cardápio de medidas", afirma Alex Abiko, professor da Escola Politécnica da USP.

Para ele, as PPPs são uma iniciativa positiva, que deve ser somada a investimentos na reurbanização de favelas –essa última iniciativa também sofreu com falta de verbas previstas, que beneficiariam parte das 811 mil famílias nessas condições.

LOCAÇÃO SOCIAL

Em palestra na Associação Comercial de SP semana passada, o arquiteto Valter Caldana defendeu outra medida: a locação social, prevista no plano de habitação atual.

Nesse modelo, prédios da Cohab serão revitalizados por empresas e entregues para população de baixa renda, que pagará aluguel equivalente a 10% de sua renda. O restante do aluguel seria subsidiado pela prefeitura, que repassará o valor para as companhias vencedoras ao longo de 20 anos.

"Não dá para achar que, em pleno século 21, a gente resolverá o problema da habitação transferindo propriedade. É fundamental trabalhar com locação", disse Caldana.

O secretário estadual de Habitação, Rodrigo Garcia diz que, atualmente, a grande aposta do Casa Paulista é o apoio financeiro ao Minha Casa. Ele diz acreditar, porém, que as PPPs poderão decolar com Doria.

"O mercado imobiliário comprou a ideia, e nós conseguimos assinar o contrato de PPP de Habitação, que foi o primeiro do país. É uma realidade, um novo caminho de habitação de interesse social para o país", afirma Garcia.

O Estado diz que investiu R$ 140 milhões em 2014-2015 para a construção de 7.600 unidades do Minha Casa.

Para levar adiante seu projeto de parcerias, Doria convidou para a secretaria da área um representante do mercado imobiliário, o ex-presidente do Secovi (sindicato da Habitação), Claudio Bernardes. Não há resposta ainda.

Matéria publicada na Folha de S. Paulo.
 

Compartilhe este artigo