Prefeitura de São Paulo pode fazer dívidas de até R$ 23 bi

Renegociação com a União fez Município ganhar capacidade de obter empréstimos

Adriana Ferraz, O Estado de S. Paulo

A renegociação da dívida do Município com a União, liderada pelo prefeito Fernando Haddad (PT), vai permitir que seu sucessor, João Doria (PSDB), possa contrair até R$ 23,8 bilhões em empréstimos para custear obras em São Paulo, como projetos de mobilidade urbana e drenagem. O valor poderá ser buscado com investidores internacionais e nacionais, como os Bancos Mundial, Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

O teto, no entanto, não deverá ser alcançado por Doria. Caso sejam firmados empréstimos, eles não devem ultrapassar R$ 8 bilhões nos próximos quatro anos, ou seja, R$ 2 bilhões por ano. Esse é o valor considerado possível pela gestão Haddad, tendo em vista as altas taxas de juros cobradas nesse tipo de negócio. Caso contrário, a nova dívida pode tornar-se impagável, comprometendo novamente a capacidade de investimento da Prefeitura.

Com a renegociação da dívida com a União, em vigor desde fevereiro, o débito com o governo federal foi reduzido em R$ 45 bilhões. A mudança no indexador fez o saldo a pagar passar de R$ 74 bilhões para R$ 29 bilhões, em valores atuais, abrindo a possibilidade de a cidade contrair novos empréstimos. Isso porque a Lei de Responsabilidade Fiscal determina que um Município só possa buscar financiamento se não tiver endividamento superior a 1,2 vez da receita corrente líquida. Hoje, esse valor está em 0,8.

Para a gestão atual, captar mais de R$ 2 bilhões por ano em empréstimos, apesar de possível de acordo com a lei, poderia comprometer a capacidade de solvência a longo prazo. Foi o que aconteceu, por exemplo, com a dívida firmada com a União antes da renegociação. Haddad e sua equipe calculavam que, se não houvesse mudança no indexador, o débito se tornaria impagável, chegando a R$ 200 bilhões em 2030.

Para o advogado Adib Kassouf Saad, da Comissão de Direito Administrativo da OAB-SP, São Paulo tem a ganhar com esse horizonte que se abre à administração. “Temos agora a possibilidade de usar o cheque especial, mas não quer dizer que temos de fazer isso. Contrair empréstimo deve ser opção apenas em caso emergencial, não rotina. O pagamento de juros sangra as finanças públicas e sai do bolso do povo”, diz.

Futuro secretário de Serviços e Obras, Marcos Penido confirma que contrair empréstimos por enquanto não está em pauta, mas não descarta o uso de novos empréstimos. “A Selic (taxa básica de juros) está em 13,75% ao ano. Isso significa que em cinco anos se paga o valor total do crédito só em juros.”

Ativos 

A medida considerada mais importante por Doria para elevar a capacidade de investimento da Prefeitura é a viabilização da chamada transferência de ativos. A ideia é pleitear do governo federal um abatimento do saldo restante que o Município tem a pagar, de R$ 29 bilhões, em troca do aluguel nunca pago pela União pelo uso do Campo de Marte, por exemplo, ou do repasse de créditos que a cidade tem a receber, a chamada dívida ativa.

O imbróglio jurídico envolvendo o Campo de Marte já dura 56 anos. Atualmente, a decisão sobre quem é proprietário da área de 2 milhões de m² está no Supremo Tribunal Federal (STF). A última decisão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), foi favorável à cidade. Caso isso se confirme, a União, que utiliza a área, teria de pagar uma espécie de aluguel retroativo milionário à Prefeitura.

E aí que entra a possibilidade de acordo ou transferência de ativos. Doria quer convencer o presidente Michel Temer e sua equipe econômica a “trocar as dívidas”. Caso avance, a proposta poderia render cerca de R$ 130 milhões mensais extras no Orçamento, valor que o Município deixaria de pagar pelo abatimento da dívida restante.

Outra possibilidade estudada pelo tucano é a de oferecer a Temer cerca de R$ 40 bilhões em impostos que a cidade tem a receber de bancos nacionais, como Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil. / COLABOROU BRUNO RIBEIRO 

Matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo.
 

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