PAULO SALDAÑA – FOLHA DE S. PAULO
Prefeito eleito de São Paulo, João Doria (PSDB) assumirá em janeiro a responsabilidade pela educação da maior rede municipal do país, com mais de 900 mil crianças e adolescentes matriculados, sendo 425 mil deles no ensino fundamental, e o restante em creches e pré-escolas.
Os níveis de qualidade tiveram avanços na gestão de Fernando Haddad (PT), mas ainda estão longe do ideal. O salto nos índices de reprovação é o que mais preocupa.
Doria não apresentou metas específicas para o ensino fundamental. A equipe de Alexandre Schneider, escolhido para assumir a pasta da Educação, pretende reverter a situação e está inclinada a rever os critérios de retenção.
O Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) de 2015 mostrou avanço nos anos iniciais (1º ao 5º ano), superando a meta, mas teve queda nos anos finais (6º ao 9º ano). Nesta etapa, está abaixo da meta desde o Ideb de 2009 –compreendendo o período em que Schneider foi secretário municipal no governo Gilberto Kassab (PSD).
O Ideb é calculado a cada dois anos e leva em conta os índices de aprovação das escolas e as notas de português e matemática em uma avaliação federal. A explicação para a queda no indicador dos anos finais foi a reprovação, uma vez que as notas médias dos alunos melhoraram.
A taxa de retenção chegou a 9,6% em 2014 e ficou em 7,5% em 2015. Em 2012, esse percentual era de 3,3%. No 7º ano, por exemplo, a taxa ficou em 13,2% em 2015.
Haddad implementou um novo programa para o ensino fundamental a partir de 2014. A principal mudança foi a reorganização dos ciclos, o que ampliou as possibilidades de reprovação de dois para cinco momentos do ensino. Antes, só era possível reprovar ao fim de dois ciclos (iniciais e finais). A reforma ampliou a possibilidade de retenção ao longo do ensino para o 3º, 6º, 7º, 8º e 9º anos.
ABANDONO
Embora o discurso pelo fim da "aprovação automática" seja disseminado, estudos mostram que a retenção tem reflexos perversos nas redes públicas. É o primeiro passo para o aluno abandonar. "Foi um erro ter aumentado a possibilidade de reprovação, o grande desafio é acompanhar a aprendizagem dos alunos e evitar que eles terminem o ano sem aprender", afirma o professor Ocimar Alavarse, da USP.
Recuperar alunos com dificuldades antes do fim do ano ou do ciclo é a essência da chamada progressão continuada, mas a maior parte das redes do país nunca obteve sucesso nessa estratégia. Alavarse lembra que o Brasil reprova muito, mas "as proficiências não são altas". "A ameaça existe, reprovam, mas isso não tem feito os alunos se concentrarem nos estudos", completa o professor.
Dados da avaliação federal de 2015 mostram que só 12% dos alunos da rede municipal paulistana terminam o ensino fundamental com o aprendizado adequado. Em língua portuguesa, são 22%.
Para Ana Lucia Sanches, chefe da coordenadoria pedagógica da secretaria de educação, a alteração dos ciclos foi importante para mexer com a "forma de fazer educação". Ela destaca a criação do "ciclo autoral" (do 7º ao 9º ano), em que os estudantes realizam projetos. "Isso ligou a tomada dos educadores e alunos de que o conhecimento é para vida."
Sanches acredita que aumentar a possibilidade de retenção foi uma ação de coragem do prefeito. "Reprovar não é o ideal, mas é o mais honesto com a realidade."
Para Neide Noffs, professora da Faculdade de Educação da PUC-SP, ainda há desigualdade na rede. "Há escolas de sucesso e muitas que são carentes", diz. "O desafio da nova gestão é entender os contextos locais das escolas."
A gestão Haddad ampliou a participação da educação no orçamento total da prefeitura. Em 2012, a pasta representava 18,6% do orçamento inicial da cidade. Chegou a 20,39% neste ano. A execução do orçamento da educação costuma ser alto, em torno de 95%. Mas em 2016, com a crise, a pasta só executou, até o meio de dezembro, 78% do previsto (R$ 8,6 bilhões). A escassez de recursos já fez a prefeitura, por exemplo, reduzir temporariamente a quantidade de leite entregue aos alunos.
Integrantes da secretaria comentam nos bastidores que Schneider enfrentará um contexto muito diferente da época em que comandou a pasta, quando a situação econômica era mais favorável. A seu favor, ele conta com simpatia dos educadores da rede. Schneider não respondeu aos pedidos de entrevista.
Entre as poucas promessas de Doria na área está a ampliação do ensino em tempo integral –modalidade que custa entre 40% a 70% mais do que a oferta tradicional. A cidade tem a modalidade em 111 das 547 escolas.
Educadores já têm garantido em lei reajustes de 8,78% em 2017 e de 8,41%, em 2018. A efetivação do aumento vai depender do prefeito.
Matéria publicada na Folha de S. Paulo.