Doria vai mudar ciclovias e adotar rota sem divisão entre bicicletas e carros

ALENCAR IZIDORO, ENVIADO ESPECIAL A SEUL, E MARIANA ZYLBERKAN, DE SÃO PAULO – FOLHA DE S. PAULO

A gestão João Doria (PSDB) fará mudanças em ciclovias implantadas pelo ex-prefeito Fernando Haddad (PT), como remanejamentos e troca de parte das pistas exclusivas por ciclorrotas -caminhos sem a separação das bicicletas do restante do tráfego.

A primeira região a receber alterações será a Vila Prudente, na zona leste, onde a proposta deve ser apresentada a partir deste mês ao prefeito regional e aos ciclistas. O secretário Sérgio Avelleda (Transportes) sinaliza também uma outra ciclovia que deve passar por mudanças: a da rua da Consolação, no centro, apontada por ele como extremamente arriscada na descida (leia mais abaixo).

As alterações são polêmicas porque a implantação de ciclovias foi uma das bandeiras da gestão Haddad, com apoio de cicloativistas. A gestão Doria diz não saber quantas sofrerão ajustes e que haverá ampla discussão de alternativas. Dos atuais 468 km de ciclovias da cidade, 400 km foram abertos sob Haddad.

A gestão Doria tende, principalmente, a trocar uma parte das pistas exclusivas por ciclorrotas, sem demarcação do espaço da bicicleta no asfalto, mas com sinalização, velocidade reduzida e lombofaixas que permitam melhor convivência com os demais veículos no trajeto. Além disso, são cogitadas mudanças no posicionamento de algumas ciclovias ao longo das vias.

"Houve construção de ciclovias muito boas, outras boas e outras que fazem muito pouco sentido. Queremos substituir essas últimas por ciclorrotas que de fato levem ao aumento do número de ciclistas", afirma Avelleda. "Há ruas tão calmas que não faz sentido segregar a bicicleta."

A implantação de ciclorrotas chegou a ser feita na gestão Gilberto Kassab (PSD), mas sem grande adesão nem impacto. A assessoria de Haddad não quis se manifestar.

Para o consultor em engenharia de tráfego Sérgio Ejzenberg, não é necessário segregar a bicicleta quando a velocidade da via é de até 40 km/h, por exemplo. "Ciclorrotas são mais benéficas inclusive do ponto de vista educativo, por mostrarem que bicicletas podem dividir espaço com carros mesmo fora de ciclovias."

Para Rene Fernandes, da Ciclocidade (Associação dos Ciclistas Urbanos de SP), "seria um retrocesso" a diminuição das ciclovias. Para ele, as ciclovias são a "única garantia" de segurança dos ciclistas. "As ciclorrotas só seriam efetivas se forem acompanhadas de medidas eficientes de redução do limite de velocidade e mecanismos de acalmamento do trânsito", afirma.

CONSOLAÇÃO

Apontada pela prefeitura como extremamente arriscada na descida, a ciclovia da rua da Consolação, na região central de SP, está com os seus dias contados. Ela será substituída por uma ciclorrota ali mesmo ou nas imediações. O secretário de Transportes da gestão João Doria (PSDB), Sérgio Avelleda, é ciclista e diz que nunca enfrentou tanto perigo quanto nessa rota.

Por isso, no caminho de sua casa, que fica na região da avenida Paulista, até o centro de São Paulo, costuma pedalar pela rua Frei Caneca. "Na subida, a ciclovia da Consolação vai bem. Na descida, é muito arriscado, gera velocidade e tem entrada para hotel, lojas, ruas, concessionária", diz Avelleda, para quem a questão não pode ser tratada "como um dogma".

"Precisa haver uma rota segura ao ciclista. Se ela deve ser na Consolação ou em outras vias, cabe discussão. Se for na Consolação, precisa de tratamento mais adequado."

Sérgio Ejzenberg, consultor em engenharia de tráfego, tem opinião semelhante. "Descer é intrinsecamente perigoso e, ao mesmo tempo, subir a via de bicicleta é um exercício brutal que faz o ciclista sobrecarregar o sistema respiratório ao lado de um corredor de ônibus que solta combustão o tempo todo."

Por ser a Consolação uma via de muitos comércios, diz Ejzenberg, muitas vezes os carros que vão entrar nas transversais ou nos estacionamentos não veem as bicicletas e o risco de acidente é enorme, principalmente à noite.

"Se a ciclovia deixar de existir nessa via, será uma opção a menos para os ciclistas, o que é lamentável", diz Rene Fernandes, da Ciclocidade (Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo). Segundo ele, criar rotas alternativas irá afastar ainda mais o ciclista da Consolação, "porque as pessoas tendem a priorizar o caminho mais curto entre dois pontos".

DEBATE

Segundo o secretário de Transportes de Doria, todas as mudanças serão levadas a debate. "Não vai ser sem negociação. Tudo que é novo tem resistência", afirma.

Avelleda esteve em Seul na semana passada, onde discutiu esse tema com a prefeitura da capital coreana, que, embora tenha uma rede ampla de transporte coletivo, ainda engatinha em medidas para ciclistas.

Enquanto a gestão Doria adotou como uma de suas bandeiras a elevação dos limites de velocidade nas marginais para até 90 km/h, em Seul a prefeitura tem fixado metas de redução, atenuando os riscos aos ciclistas. O objetivo ali é que todas as ruas de bairros residenciais tenham máxima de 30 km/h até 2030.

Matéria publicada na Folha de S. Paulo.

 

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