Minhocão tem explosão de furto e roubo e assusta frequentadores

ARTUR RODRIGUES E FABRÍCIO LOBEL – FOLHA DE S. PAULO

O professor de filosofia Fabrício Muriana, 32, andava de bicicleta pelo Minhocão, no retorno para casa ao lado da namorada após um show no Sesc Pompeia, na zona oeste. Naquela noite, o casal acabou sob a mira de uma arma e ficou sem as bicicletas e todos os outros pertences.

Crimes como esse, ocorrido numa madrugada de agosto do ano passado, se repetem cada vez mais no elevado recentemente rebatizado de presidente João Goulart.

Os furtos e roubos na região do Minhocão (incluindo a parte debaixo da via) passaram de 100 para 190, na comparação de 2015 com 2016, um aumento de 90%, mostram números obtidos pela Folha via Lei de Acesso à Informação. Se considerarmos apenas os crimes que aconteceram sobre o elevado, uma alta ainda maior: passaram de 15 para 56 (273%).

Neste tipo de crime, porém, há grande índice de subnotificação, dizem especialistas. Ainda assim, os números ajudam a revelar que o principal avanço se deu no período em que a via está fechada para carros, entre as 21h30 e 6h30.

Para efeito de comparação, em 2015, crimes cometidos nessa faixa horária representavam 13% do universo do elevado. Já em 2016, esse número saltou para 36% –o percentual pode ser maior devido à falta de horário em alguns boletins de ocorrência.

Desde que o local virou oficialmente parque, com a sanção por Fernando Haddad (PT) de lei neste sentido, gerou-se um jogo de empurra sobre a responsabilidade pela segurança sobre o elevado.

O governo Geraldo Alckmin (PSDB) diz que, por ser um parque da cidade, quem deveria fazer a prevenção é a GCM (Guarda Civil Metropolitana). Já a gestão municipal de João Doria (PSDB) diz que ações de policiamento ostensivo cabem à polícia, vinculada ao governo estadual (leia mais abaixo).

Enquanto o poder público não age coordenadamente, os criminosos se aproveitam da falta de policiamento. Não havia sinal das autoridades quando Fabrício Muriana e sua namorada foram abordados por duas pessoas, também em bicicletas.

"Eles alcançaram a gente, emparelharam, mostraram a arma e mandaram parar. Levaram meu celular, nossas bicicletas e abandonaram as bicicletas velhas deles com a gente." Após o roubo, Muriana diz não se sentir mais seguro para pedalar à noite.

Crimes como esse continuaram a acontecer. No mês passado, foi a vez da jornalista Maria Teresa Cruz, 31. Ela pedalava de volta para casa sobre o Minhocão quando foi interceptada por um homem a pé, que roubou sua bicicleta. "Levei um soco na cara, vários chutes já caída no chão", escreveu em seu perfil nas redes sociais.

CELULAR

No Minhocão, entre os casos registrados no último ano, a maioria incluiu roubo de celular (70%). Quem frequenta o lugar, se não presenciou, conhece alguém que viu os bandidos agindo. Os casos acontecem com mais frequência próximo das alças de acesso à via, por onde os criminosos fogem em seguida. Ladrões costumam passar de bicicleta e levar os aparelhos de pedestres.

Para o coronel da reserva da PM e consultor em segurança José Vicente da Silva, a segurança em uma área confinada é simples de ser feita. Apenas a presença de guardas ou policiais nos acessos ou em alguma plataforma elevada já inibiriam os criminosos, diz ele.

"Bandidos são territoriais e costumam atacar do mesmo jeito, no mesmo local, enquanto não se aumentar o risco para eles", afirma Silva.

Ativistas que defendem que o elevado vire um parque, a exemplo do High Line de Nova York, temem que a questão de segurança seja usada como justificativa para limitar o acesso ao espaço. Recentemente, a Folha revelou que a prefeitura planejava restringir o uso por pedestres.

"Para melhorar a segurança, a gente está tentando que o Minhocão que vire institucionalmente um parque, através da criação conselho gestor, que poderia cobrar a polícia e a GCM a respeito da segurança", diz empresário Athos Comolatti, 63, da Associação Parque Minhocão. A eleição do conselho está prevista por lei, mas ainda não aconteceu.

Em entrevista ao programa Roda-Viva, da TV Cultura, o prefeito disse que o elevado passará por uma requalificação e será um "Minhocão verde", sem dar mais detalhes.

JOGO DE EMPURRA

As gestões do governador Geraldo Alckmin (PSDB) e do prefeito João Doria (PSDB) fazem um jogo de empurra sobre a responsabilidade pelo policiamento no Minhocão. O governo estadual, responsável pelas polícias Civil e Militar, afirma ter reforçado o policiamento nas horas em que o local vira área de lazer.

"O comando da área monitora diariamente as ocorrências, e, na medida em que a incidência é analisada e estudada, é providenciado o efetivo adequado para a região", afirma nota da Secretaria da Segurança Pública.

A pasta cita, no entanto, o fato de o local ter virado oficialmente um parque –sob a guarda da prefeitura. "A responsabilidade de policiamento no local nesses períodos [em que a via está fechada] é da Guarda Municipal Metropolitana", diz o governo. Questionada, a prefeitura afirmou que a GCM faz rondas diariamente e promete intensificar o patrulhamento.

"Aos finais de semana e feriados, além das rondas, os agentes efetuam paradas temporárias em diversos pontos no local", afirma a gestão. A prefeitura afirma também que "ações de policiamento ostensivo e investigações sobre crimes no entorno cabem à polícia".

A respeito uso do Minhocão para pedestres, a administração Doria diz que o assunto passa por análise técnica. Qualquer alteração no funcionamento do espaço como área de lazer só "será implementada após diálogos com a população e com o Ministério Público", diz a gestão tucana.

De acordo com a prefeitura, a eleição do conselho gestor do parque depende da regulamentação da lei que transformou a via em espaço de lazer.

Histórico do Minhocão

1971 – Elevado com 3,4 km de extensão é criado por Paulo Maluf (PP)
1989 – Passa a ser fechado para carros à noite e aos fins de semana por Luiza Erundina (PT)
2015 – Passa a ser fechado para carros também aos sábados, a partir das 15h
2016 – Fernando Haddad (PT) sanciona lei que cria o parque Minhocão cordo com a prefeitura, a eleição do conselho gestor do parque depende da regulamentação da lei que transformou a via em espaço de lazer.

Matéria publicada na Folha de S. Paulo.

 

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