Secretário de Transportes e presidente da CET não compareceram ao debate, onde especialistas lamentaram a postura da gestão municipal, “de culpar as vítimas pelos acidentes”
Por Airton Goes, da Rede Nossa São Paulo
A audiência pública sobre o “aumento do limite de velocidade implantado pelo Programa Marginal Segura”, que foi promovida pelas comissões de Trânsito e de Política Urbana da Câmara Municipal, não contou com a participação de representantes da Prefeitura de São Paulo.
A ausência dos integrantes da administração municipal, entretanto, não impediu as críticas de especialistas presentes ao debate às explicações da gestão Doria para os acidentes e as mortes recentes nas marginais. Segundo eles, a postura da Prefeitura é “de culpar as vítimas pelos acidentes”.
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Convidados com antecedência para o evento ocorrido nesta quarta-feira (3/5), no plenário do Legislativo paulistano, o secretário municipal de Mobilidade e Transportes, Sergio Henrique Avelleda, e o diretor-presidente da Companhia de Engenharia de Tráfego – CET, João Octaviano Machado Neto, encaminharam mensagens às comissões justiçando suas ausências.
O vereador José Police Neto (PSD) criticou o não comparecimento dos representantes da gestão municipal na audiência pública. “O prefeito esteve aqui, nesta Casa, ontem e em diversas outras oportunidades. Entretanto, parece que a equipe não segue muito as orientações do próprio prefeito”, ironizou.
Por outro lado, o vereador João Jorge (PSDB) defendeu a gestão Dória, dizendo que o secretário de Mobilidade e Transportes não poderia ser tratado como irresponsável. “Ele [o secretário] tem interesse em comparecer nesta Casa”, avalizou.
Nova audiência sobre o mesmo tema será no dia 16
Antes mesmo de abrir a palavra aos representantes da sociedade civil, os vereadores marcaram uma nova audiência pública para tratar o mesmo tema: “aumento do limite de velocidade implantado pelo Programa Marginal Segura”. O evento será no próximo dia 16 de maio, das 9 às 13 horas. “Aí, os dois representantes da Prefeitura estarão presentes”, afirmou o presidente da Comissão de Trânsito, Senival Moura (PT).
Críticas à gestão municipal
Durante o evento desta quarta-feira (3/5), os representantes das organizações da sociedade civil que atuam na área de Mobilidade Urbana foram unânimes na crítica à política do prefeito João Doria para o setor, especialmente em relação ao aumento das velocidades nas marginais Tietê e Pinheiros.
Leandro Martins, pesquisador da Faculdade de Saúde Pública da USP, destacou que é importante refletir sobre o tipo de cidade que os paulistanos desejam. “Se queremos uma cidade mais amigável para as pessoas, com menos violência, isso passa pela redução das velocidades”, ponderou.
Embora tenha ressalvado que não se sentia confortável para emitir um parecer sobre o programa Marginal Segura, em virtude da quantidade insuficiente de dados, Martins argumentou: “O que dá para dizer, com base em estudos e experiência internacionais consolidadas, é que o aumento de velocidades amplia a probabilidade de acidentes e de mortes”.
O pesquisador de Mobilidade Urbana do Idec – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, Rafael Calabria, lembrou que outras cidades do mundo estão reduzindo o limite máximo em suas vias. “Paris baixou a velocidade em suas vias expressas, e os resultados foram os mesmos [que os obtidos aqui quando, na gestão anterior, houve a redução dos limites nas marginais]. Ou seja, houve queda no número de acidentes e de mortes.”
O pesquisador do Idec lamentou as explicações da Prefeitura para os acidentes e as mortes nas marginais. “Não adianta culpar a imprudência dos motoristas, motociclistas e pedestres, pois a política de trânsito tem que levar em consideração que as pessoas erram”, argumentou ele, para em seguida complementar: “Se houve erro humano, o aumento da velocidade ampliou o risco de acidentes e mortes”.
As ausências do secretário de Transportes e do presidente da CET na audiência também foram criticadas por Ana Carolina Nunes, da Cidadeapé – Associação pela Mobilidade a Pé em São Paulo. “Todas as vezes que a sociedade civil quis discutir com eles essa questão, eles não quiseram”, registrou.
Na avaliação de Ana Carolina, “ao invés de eliminar os fatores de risco, a Prefeitura vem buscando culpar as vítimas, dizendo que elas foram imprudentes”.
Nilton Gurman, da ONG Não foi Acidente, reforçou que o mundo todo caminha em direção à redução de velocidade. Segundo ele, a gestão municipal deveria ter feito um estudo técnico antes de voltar às velocidades antigas nas marginais. “O foco principal tem que ser a vida e não tem sido”, opinou.
Segundo ele, as organizações da sociedade civil deveriam provocar o Ministério Público, para que o prefeito e o secretário de Transportes sejam responsabilizados por coautoria das mortes causadas pelo aumento das velocidades nas marginais.
Por fim, Fernando Túlio, do Instituto de Arquitetos do Brasil, destacou um estudo sobre o impacto dos acidentes de trânsito nos gastos públicos com a saúde. “De cada 10 leitos hospitalares, seis são ocupados por vítimas de acidentes de trânsito”, relatou.