Região central deve ganhar 5 mil moradores com novos edifícios

MARCELO COPPOLA, COLABORAÇÃO PARA A FOLHA DE S. PAULO

O bairro dos Campos Elíseos deve ser o eixo principal da transformação de uma das regiões mais degradadas do centro de São Paulo. Em uma área equivalente a três campos de futebol, ao lado da estação Júlio Prestes, estão sendo construídos oito edifícios, com 1.202 apartamentos.

O primeiro prédio será entregue em março. Dois outros ficarão prontos até junho, segundo a Secretaria Estadual da Habitação. O conjunto todo estará finalizado até o fim de 2019. O complexo abrigará ainda a nova sede da Escola de Música Tom Jobim e uma creche para 200 crianças. Haverá comércio no térreo dos edifícios, e eles estarão ligados à rua Santa Ifigênia por um boulevard.

A poucos quarteirões dali, em quatro terrenos na rua dos Gusmões, serão erguidos outros 440 apartamentos. Todas essas obras fazem parte de uma parceria público-privada, a chamada PPP da Habitação, firmada entre o governo do Estado, a prefeitura (ainda na gestão Fernando Haddad) e a construtora mineira Canopus.

Outros projetos devem movimentar a região. A prefeitura já anunciou que passará o terminal Princesa Isabel, na avenida Rio Branco, para a iniciativa privada. A concorrência será aberta no primeiro semestre de 2018. A proposta prevê que o futuro administrador do terminal possa construir novos pisos, que poderão abrigar shoppings, escolas ou outras atividades.

Ainda na avenida Rio Branco, começam no ano que vem as obras do novo Hospital Pérola Byington, com 218 leitos, 22 UTIs e dez salas cirúrgicas.

No mês que vem, a um quarteirão do hospital, o Palácio dos Campos Elíseos será ocupado pelo Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), que abrirá um espaço de economia criativa, com ambiente de co-working e incubadora de projetos. O casarão, sede do governo estadual até 1965, abrigará ainda um museu que reproduzirá o modo de vida de outras épocas.

NOVOS MORADORES

Com o objetivo de aproximar trabalhadores de seus empregos, a PPP prevê que 80% das 1.642 unidades do complexo Júlio Prestes e dos prédios da rua dos Gusmões sejam ocupados por quem mora fora do centro, mas trabalha lá. Os outros 20% serão habitados por quem mora e trabalha no centro.

Significa que o bairro ganhará mais de 5.000 moradores no futuro próximo, sem contar o número de pessoas que transitarão pelas lojas do complexo Júlio Prestes, pela nova estação Princesa Isabel, pelo hospital e pela escola do Sebrae. É uma boa notícia em uma região na qual proliferam imóveis vazios e abandonados.

O esvaziamento dos Campos Elíseos acompanhou a fuga de moradores de toda a região central. A população do centro caiu de 500 mil habitantes em 1980 para 370 mil em 2000. Apesar do aumento de 15% da população na década seguinte, a região continua com espaços ociosos em muitas áreas.

Para a urbanista Regina Meyer, o centro precisa ser repovoado. "A região tem uma enorme infraestrutura subutilizada. Só o adensamento populacional pode acabar com esse desperdício", diz a pesquisadora, uma estudiosa das metrópoles.

DRAMA SOCIAL

O complexo Júlio Prestes está situado em uma área classificada como Zona Especial de Interesse Social (Zeis) 5, de acordo com o Plano Diretor. Por conta disso, 1.130 unidades serão destinadas para famílias com renda mensal entre R$ 810 e R$ 4.344. As outras unidades serão habitadas por moradores que ganham entre R$ 4.344 e R$ 8.100.

Apesar de atender, pelo menos em parte, a uma parcela da população de baixa renda, o empreendimento não terá a capacidade de mudar as condições sociais do seu entorno. "Boa parte dos moradores da região ganha menos do que a renda mínima exigida pelo projeto", afirma a urbanista Simone Gatti, pesquisadora na FAU-USP. Para ela, essa população seria mais bem atendida por meio da locação social, pela qual famílias mais vulneráveis têm subsídio no aluguel.

A Secretaria Municipal de Habitação montou uma proposta que, se for avante, atenderá ao menos os moradores dos dois quarteirões da antiga Cracolândia. Usuários de drogas migraram para a praça Princesa Isabel depois da ação deflagrada em maio pelo prefeito João Doria.

O plano da prefeitura prevê a construção de 394 unidades para famílias com renda inferior a três salários mínimos. A desapropriação dos terrenos ainda não foi feita, e o projeto precisa ser aprovado pelo comitê gestor dos dois quarteirões, composto por representantes dos moradores, sociedade civil e poder público.

A PPP de Habitação prevê a construção de 3.683 apartamentos no total. O investimento do Estado será de R$ 465 milhões, e o da iniciativa privada, de R$ 919 milhões.

ACUPUNTURA URBANA

A expectativa dos governos é que o complexo Júlio Prestes gere efeitos positivos por toda a região da antiga Cracolândia. A aposta é que a construção dos edifícios na Santa Ifigênia funcione como uma espécie de "acupuntura urbana", o conceito criado pelo arquiteto finlandês Marco Casagrande.

De acordo com essa visão, intervenções pontuais podem mudar aos poucos a vida dos moradores de uma cidade. "Acredito que as unidades de interesse social mudarão a cara da Santa Ifigênia e terão um efeito positivo sobre toda a região", afirma Fernando Chucre, secretário municipal de Habitação.

Nabil Bonduki, arquiteto e urbanista que trabalhou nas gestões de Luiza Erundina e Fernando Haddad, também acredita nos efeitos positivos do complexo. Para o colunista da Folha, "parece ser uma boa saída para toda a área central, ao criar habitação de interesse social e de baixa classe média em combinação com um comércio especializado", no caso as ruas de comércio eletroeletrônico da Santa Ifigênia.

Apesar da melhoria da imagem da região, o complexo não atrairá necessariamente novos investimentos. "Por se tratar de moradores de renda mais baixa, não deve haver mudanças importantes no mercado de imóveis nem no perfil do comércio", diz Mauro Peixoto de Oliveira, consultor da Embraesp (Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio), especializada em consultoria imobiliária.

Confira aqui todas as matérias do caderno Fórum Revitalização do Centro, da Folha de S. Paulo.

Matéria publicada na Folha de S. Paulo.
 

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