Mesa-redonda “O mundo da resiliência” contou com as participações do coordenador-geral da Rede Nossa São Paulo, Jorge Abrahão, e da arquiteta e urbanista Bete França
Fonte: CAU/BR – Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil
A democratização da cidade e a universalização dos serviços públicos a 11,4 milhões de pessoas que vivem nas favelas brasileiras, segundo o Censo 2010 do IBGE, foi a tônica da mesa-redonda “O mundo da resiliência”, ocorrida no último domingo (8/10), no Rio de Janeiro.
A discussão contou com as participações do coordenador-geral da Rede Nossa São Paulo, Jorge Luiz Abrahão, e da arquiteta e urbanista Bete França, que defenderam maior participação social nas políticas urbanas e soluções inovadoras para a construção de cidades mais sustentáveis. A mediação foi da suplente de Josenita Dantas, conselheira do CAU/BR e ex-diretora técnica e administrativa do Instituto de Planejamento Urbano de Natal.
Com 10 anos de existência, a Rede Nossa São Paulo desenvolveu cerca de 300 indicadores da capital paulista. Os dados são todos georreferenciados, o que permitiu a elaboração de um mapa da desigualdade, além de análises comparativas entre os 96 distritos de São Paulo. Um dos indicadores resultantes é o da gravidez na adolescência. No bairro Jardim Paulista, na Zona Oeste, a incidência de gravidez entre mulheres até 19 anos é de 0,117%. Em Perus, Zona Norte, é de 19,4%. “Percebemos que não estamos conseguindo avançar em questões estruturantes da cidade. Precisamos enfrentar a raiz dos problemas de forma geral”, afirmou Abrahão.
Segundo ele, a profunda desigualdade das cidades brasileiras não se justifica por falta de recursos. “O nosso país é a oitava economia do mundo e um dos mais concentradores. Como atuamos numa situação assim? Temos que enfrentar a questão tributária”, defendeu. Para o empresário, o tributo tem que ser fortemente progressivo, e os mais pobres não podem contribuir mais do que os ricos. “A gente ter 80% da sociedade fora do consumo é uma insanidade”, criticou.
Bete França lembrou que o esgoto de 50% dos brasileiros não é coletado, e que essa parcela da população está nas regiões mais pobres das cidades. “Para mim, essa é uma questão central. Quem não tem saneamento básico não consegue estudar, e o desenvolvimento cognitivo das crianças é prejudicado”, explicou. Ao responder a provocação do debate – o que está sendo feito para reverter a situação –, a arquiteta foi categórica: “Nada! Basta olharmos os gráficos do Ministério da Fazenda, os investimentos em saneamento básico nem aparecem. É ridículo.”
O caminho apresentado por ela para reverter o cenário das cidades brasileiras é “pensar fora da caixa”. Na opinião da arquiteta e urbanista, a estrutura tradicional de planejamento urbano, como os planos diretores e códigos de obras, é antiga e morta. “A gente (arquitetos e urbanistas) tem a tarefa de romper com a burrice que nós mesmos estabelecemos”, alertou. Ela defendeu também o “lobby do bem” da profissão: “As prefeituras carecem de arquitetos. A gente estuda para desenhar espaços de todos os tipos. Contamos ainda com um arsenal de disciplinas para executar a tarefa. A cidade precisa ser planejada e, para isso, precisa de arquitetos.”
Josenita Dantas lembrou que o perfil da desigualdade não é algo estranho da sociedade, mas que as normas e políticas não respondem à realidade. “O zoneamento, por exemplo, é muito mais segregador do que ordenador do espaço urbano. Números, normas e estatísticas a gente tem muito”, disse.
Foto: Priscila Bispo
Matéria publicada no portal do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil.