CEUs só saem se chegar dinheiro de privatizações, diz secretário de Doria

PAULO SALDAÑA – FOLHA DE S. PAULO

Há pouco mais de um ano à frente da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, Alexandre Schneider prevê um 2018 ainda de dificuldades orçamentárias –menores que as de 2017, mas ainda consideráveis, diz ele.

A retomada de obras paralisadas de 14 CEUs (Centros de Educação Unificada), por exemplo, depende do sucesso de privatizações previstas pelo prefeito João Doria (PSDB). Mesmo ao ressaltar esses desafios, Schneider comemora avanços. Cita a elaboração do currículo municipal, o projeto de tecnologia e a expansão das creches.

"Fizemos um ajuste de mais de R$ 400 milhões. E mesmo assim cumprimos os acordos salariais com a categoria, chamamos quase 9.000 professores, fizemos ampliação em creche e retomamos obras paradas", diz.

O secretário diz que continua atrás da promessa de Doria de criar até março 66 mil vagas em creche (novas 40 mil vagas em três meses). Nem sequer há orçamento para isso. "O prefeito já garantiu que tira da área que for."

Folha – Qual o cenário para a área de educação municipal neste ano eleitoral?
Alexandre Schneider – A secretaria está melhor estruturada para as metas. Conseguimos estabelecer uma regulação para as creches, ter clareza dos mecanismos para criar vagas com qualidade.
No ensino fundamental, estabelecemos sistema de avaliação, que possibilita políticas de equidade. Conseguimos nomear quase 9.000 professores, retomar obras, terminar o currículo da cidade, já tem o desenho das formações de professores. 
Quais dificuldades permanecem? O orçamento. Embora seja melhor que no ano passado, é muito difícil de ser gerenciado. Vamos ter problemas ainda este ano.

A gestão divulgou 26 mil novas vagas em creches em 2017. Todas foram ocupadas por crianças já no ano passado?
Algumas ficaram para este ano, serão ocupadas até fevereiro. São matriculas em processo, sempre contabilizadas como vagas criadas. A expansão foi possível pela melhoria do nosso sistema e a reformulação do Leve Leite [o público beneficiado foi reduzido]. 
Com relação ao sistema, havia vagas contratadas, mas não utilizadas. A prefeitura assumia um convênio para 250 crianças, reservava orçamento, mas só efetivava 200 [a verba ficava comprometida, embora não executada]. Ocorria porque o sistema só levava a um número pequeno de escolas para os pais escolherem. Ampliamos o número de possibilidades de escolha, mantendo raio de 2 km da casa da família. Esse processo criou 7.000 vagas. E quando a gente teve clareza da economia com o Leve Leite, conseguiu gerar outras 19 mil vagas.

O prefeito prometeu criar 66 mil vagas até março. É possível ter 40 mil novas vagas de creche em três meses? 
O prefeito estabeleceu uma meta evidentemente ousada. A gente está trabalhando até o limite para chegar a 31 de março com essas vagas.

O tema envolve muitas famílias e gera expectativas. Ainda mais quando se trata de um prefeito que se coloca como diferente na capacidade de executar. As famílias não merecem ouvir se dá ou não dá?
Em 2017, com as dificuldades com orçamento da Educação, imaginei que não chegaria a esse número, mas nunca desistimos. Tanto que batemos o recorde para o primeiro ano de uma gestão. Não trabalhamos com outra hipótese se não a de cumprir a meta.

Com a previsão de R$ 2,3 bilhões para convênios de creches em 2018, não há nem orçamento para essas vagas [foram R$ 2 bilhões em 2017].
Isso o prefeito já garantiu que tira da área que for. Nosso problema não é tanto o dinheiro, é a capacidade de ter os prédios, ter as organizações. A gente conseguiu gerar muita vaga porque não esperamos o dinheiro para procurar as entidades. Fizemos um movimento inédito de fazer um cadastro das entidades.

Todas as obras de creches e CEUs foram retomadas? Alguma foi iniciada nesta gestão?
O que a gente já apontava ano passado era a retomada das obras existentes. As últimas [6 de 13 obras] vão ser retomadas agora com recurso do Estado. As obras dos CEUs dependem de um estudo da demanda, que a secretaria já entregou para a secretaria de Obras. Tem CEUs propostos em áreas onde não há demanda escolar, como o do Tatuapé. E vai depender, a princípio, de recursos da privatização.

As obras dos CEUs dependem das privatizações?
De dois recursos. Das privatizações e de recursos que estão sendo negociados com governo federal.

O sinal de internet é deficiente nas escolas. Agora com o currículo de tecnologia, como a gestão pretende resolver isso?
Muitas das atividades propostas no currículo não dependem de internet, como robótica. Mas o sinal vai melhorar. A prefeitura recebeu uma doação [em maio de 2017] de equipamentos utilizados nas Olimpíadas e agora negocia um termo de ajustamento de conduta [com uma empresa de telefonia] para viabilizar recursos para instalação.

As escolas vão receber novos equipamentos?
Compramos computadores para todas as escolas de ensino fundamental, dos laboratórios à secretaria. Serão notebooks, e os alunos vão poder levá-los para sala, para projetos coletivos, como propõe nosso currículo. Como o volume é grande, são 17 mil máquinas, chegam às escolas até março. A gente também comprou kits de robótica, mínimo de três para cada escola. Os alunos vão ter aulas de programação desde o primeiro ano, robótica, e uso ético da tecnologia. Tudo isso configura um trabalho de tecnologia pioneiro no Brasil e, nessa escala, talvez no mundo.

A prefeitura finalizou o novo currículo e agora espera-se a formação de educadores. A secretaria não prevê investimento específico, mas diretores da rede apontam em pesquisas que as formações atuais são deficientes. Será suficiente para que o currículo resulte no salto esperado?
A gente acredita que a forma como o currículo foi construído, com participação de educadores e alunos, resultou em um processo mais legítimo. Fizemos o currículo olhando para a Base [Nacional Comum Curricular] e para a produção da própria rede. Isso cria um processo identitário relevante. É óbvio que o currículo não vai salvar a cidade, mas temos as orientações didáticas aos professores, alinhadas ao material de apoio e formação, uma preocupação constante de diálogo com a rede. Isso reforça a possibilidade de o currículo ir para a sala de aula. Mais do que quanto a gente vai investir em formação, é como vai investir. E escolas mais vulneráveis receberão mais apoio.

No ano passado, o embate com o MBL em torno do projeto Escola sem Partido e o anúncio feito pelo prefeito de incluir a farinata na merenda escolar expuseram uma dessintonia com o prefeito. Qual a avaliação faz após esses episódios?
O que eu tirei desses episódios é que só vale a pena ocupar uma posição pública se for para fazer valer nossos princípios: de que a escola tem de ser plural e que temos sempre de apostar numa burocracia pública de boa qualidade, o que temos na secretaria no caso da alimentação escolar. O prefeito, na questão da farinata, teve a humildade de dar um passo atrás e reconhecer publicamente que nossa gestão foi um pouco açodada do ponto de vista da comunicação dessa possível adoção.

Há um projeto em discussão na Câmara Municipal sobre Escola sem Partido. Você acha que, se aprovado, o prefeito deveria sancionar ou teria seu apoio para não sancionar?
Não posso falar sobre um projeto ainda em discussão. O que acho é que o Supremo [Tribunal Federal] já se manifestou sobre isso. O ministro Barroso se manifestou sobre lei idêntica e decidiu que ela é inconstitucional. Do ponto de vista jurídico, eu fico com o ministro Barroso. E do ponto de vista pedagógico, eu fico com a LDB [Lei de Diretrizes e Bases da Educação] que diz que a gente tem de ter uma escola plural e o professor, liberdade de ensinar. As duas coisas são meus balizadores. Entendo que os vereadores têm a sua consciência, e estão lá defendendo seus princípios, seu eleitorado, mas como secretário de Educação sou contrário a projetos desse tipo.

Alexandre Schneider, 48

Formação
é mestre em administração pública pela Fundação Getulio Vargas

Carreira
já comandou a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo na gestão Gilberto Kassab (2006-2012). Atualmente, ocupa o cargo mais uma vez desde janeiro de 2017.
Foi filiado ao PSDB antes de migrar, em 2011, para o PSD. Candidatou-se a vice-prefeito na chapa derrotada de José Serra (PSDB), em 2012

Matéria publicada na Folha de S. Paulo

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