Um Plano de Metas fora do tempo

Mudanças contribuem ainda mais para o descrédito com os políticos

Por Jorge Abrahão e Américo Sampaio 

A Prefeitura de São Paulo anunciou recentemente um Plano de Metas modificado e a esse processo deu o nome de “repactuação”. No entanto, na visão da Rede Nossa São Paulo, o documento não é somente uma revisão das metas originais, como prevê a lei das metas, mas, sim, um novo Plano de Metas para a cidade.

A legislação que instituiu a obrigatoriedade do programa de metas, aprovada por unanimidade na Câmara Municipal em 2008, é uma emenda à Lei Orgânica do Município. Ela define, entre outras coisas, que o Plano de Metas deve conter as principais ações e projetos do governo para os quatro anos de mandato e não apenas para dois anos.

É preocupante a enorme modificação empreendida no Plano de Metas e também a naturalidade com que a gestão municipal o fez. Por mais que o prefeito Bruno Covas (PSDB) diga que foram feitos apenas ajustes nas metas do governo, os dados revelam o contrário.

Se analisarmos com o mínimo de critério e atenção, observaremos que 26 metas não foram absorvidas pelo novo plano, o que representa 49% das metas originais. Isso significa que metade do Plano de Metas apresentado em 2017 foi abandonada.

Uma modificação dessa envergadura é inquietante, pois pode abrir um precedente perigoso para futuros prefeitos da capital paulista e acarretar na desmoralização do principal instrumento de planejamento, gestão e controle social da cidade: o Plano de Metas.

Soma-se a isso o fato de que a legitimidade das metas do governo reside no processo de diálogo com a população, do qual participaram diversos setores da sociedade e que resultou no encaminhamento de mais de 20 mil sugestões no primeiro trimestre do governo. A prefeitura, por sua vez, considera razoável promover mudanças dessa natureza sem ouvir a sociedade. Mesmo sabendo que essa medida alija de informação todos os munícipes.

Reconhecemos que a legislação permite que a gestão municipal promova mudanças programáticas nas metas ao longo dos quatro anos de governo. Porém, estas devem estar, obrigatoriamente, acompanhadas de justificativas por escrito.

Dessa forma, o documento publicado pela prefeitura viola a Lei Orgânica em dois sentidos. Primeiro, por não fazer apenas uma alteração programática, e sim construir um outro plano. E, segundo, ao não apresentar justificativas convincentes com o necessário detalhamento, responsabilizando à recessão econômica pelas alterações promovidas no Plano de Metas.

Esse tipo de justificativa é demasiadamente genérica e não deveria sustentar o fato de metas estarem sendo abandonadas sem o crivo do debate público.

A função do Plano de Metas é a de justamente garantir que as eleições municipais sejam éticas, fortalecendo a responsabilidade do chefe do Poder Executivo eleito por concretizar suas promessas.

Contudo, essa mudança nas metas da cidade mostra que aquilo que foi prometido ao longo da campanha eleitoral de 2016 ficou no passado, o que contribui ainda mais para o descrédito dos políticos e o enfraquecimento da democracia.

O prefeito erra ao descaracterizar o Plano de Metas original sem promover nenhum diálogo com a população. E demonstra submeter o mais importante instrumento de planejamento e controle social da cidade à dinâmica eleitoral, pois fica evidente que a única e real razão para as mudanças promovidas no Plano de Metas é antecipar para 2019 o debate sobre a não execução de suas promessas de campanha, deixando para 2020 apenas suas realizações.

Bruno Covas perde a oportunidade de promover um amplo debate público sobre as prioridades da cidade de São Paulo e, com isso, atender ao espírito da lei das metas e se destacar no cenário nacional como um prefeito que quer incorporar em seu planejamento a perspectiva da população.

Jorge Abrahão
Coordenador-geral da Rede Nossa São Paulo e do Programa Cidades Sustentáveis
Américo Sampaio
Sociólogo, é coordenador da Rede Nossa São Paulo

Artigo publicado originalmente no jornal Folha de S.Paulo

 

Leia também:

Balanço do Plano de Metas da Prefeitura mostra 29 itens sem nenhum avanço, 20 iniciados e 4 concluídos

Compartilhe este artigo