MARIANA ZYLBERKAN – FOLHA DE S. PAULO
O prefeito da capital paulista João Doria (PSDB) afirmou, neste domingo (7), que a imprudência, principalmente de motociclistas, é a causa dos acidentes nas marginais Tietê e Pinheiros.
Reportagem da Folha publicada neste domingo mostra que nos dois primeiros meses depois do aumento das velocidades nas marginais, segundo dados da Polícia Militar, houve aumento de 51% nos acidentes com vítimas nas marginais em relação a fevereiro e março do ano passado, quando os limites ainda eram de 50 km/h na pista local, 60 km/h na central e 70 km/h na expressa.
Doria subiu as máximas para 60 km/h (local), 70 km/h (central) e 90 km/h (expressa) em 25 de janeiro. Sob esses novos limites, as marginais bateram um recorde em março: 143 acidentes com vítimas, maior número mensal desde janeiro de 2015, quando começou a série histórica da estatística da PM.
"Não há nenhuma correlação entre o aumento da velocidade nas marginais e o número de acidentes", disse Doria, após participar da reforma de uma praça em São Mateus, na zona Leste. A ação faz parte do projeto Calçada Nova.
"Não tivemos nenhuma morte e nenhum acidente causado por excesso de velocidade. Há muita imprudência, inclusive, de motociclistas. Por isso, iniciamos uma campanha focada em motociclistas e motoristas", disse.
Embora refute a relação entre a velocidade e os acidentes nas marginais, a prefeitura não divulgou nenhum estudo ou relatório sobre isso nem sobre as causas dessas batidas. Desde a noite deste sábado (6), um vídeo publicitário é veiculado em TVs para mostrar que a imprudência é a causa dos acidentes de trânsito na cidade.
A Folha também circulou nas duas últimas semanas em diferentes horários ao longo dos 47 km das marginais e constatou que os ambulantes ainda circulam entre os carros nos horários de pico e os moradores de rua seguem instalados nos canteiros e em favelas que vão quase até a pista. A promessa de Doria é retirá-los das marginais, por agravarem os riscos de acidentes.
Em relação à presença de ambulantes e moradores de rua nas marginais, o prefeito comentou neste domingo apenas as ações para coibir os camelôs nas vias.
"Vamos continuar com o que a guarda-civil tem feito que é incentivar a população a não usar as marginais para vender nada. [Os ambulantes] precisam ter consciência que não podem arriscar suas vidas para vender um copo de água."
MOTOS
As primeiras mortes nas marginais depois do aumento dos limites de velocidade levaram Doria e seus auxiliares a focar as atenções e justificativas nos motoqueiros -que representam os cinco mortos nessas vias em fevereiro e março.
Resultado disso foram declarações públicas nesse sentido e anúncio de medidas para conter esses acidentes.
Por exemplo, a proibição de motos na pista central da Tietê durante a madrugada a partir do próximo sábado (13) -elas já são proibidas na expressa- a previsão de aplicar multas em motociclistas a partir de imagens de câmeras.
Dados da Polícia Militar, porém, mostram avanço de acidentes com vítimas em todas as demais categorias. Em fevereiro e março, em relação ao mesmos meses do ano passado, houve crescimento nas colisões com vítimas envolvendo motos (60%), carros (10%) e caminhões (108%), além de mais atropelamentos (300%).
No caso dos caminhões, cujos acidentes com vítimas passaram de 12 para 25 nesse intervalo, técnicos explicam que, por causa do tamanho, eles acumulam mais pontos cegos e, muitas vezes, atingem motos sem perceberem.
Já os atropelamentos, de dois para oito casos, fizeram ligar um alerta da PM. "Acendeu a luz amarela. Vamos ter que acompanhar", diz Marcos Rogério da Cunha, capitão e chefe do policiamento de trânsito nas marginais.
Os dados da PM obtidos pela Folha são os únicos até agora que permitem uma comparação do número de acidentes antes e depois do aumento da velocidade -nessa base, no entanto, não está analisado se a causa está ou não ligada às novas máximas nessas pistas.
As estatísticas oficiais da prefeitura são divulgadas anualmente, por meio de balanços da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego).
Para Sérgio Ejzenberg, engenheiro e mestre em transportes pela USP, as novas velocidades influenciaram nesse aumento das estatísticas.
"Velocidade maior é compatível no limite da segurança. Não pode aumentar a mobilidade ao custo de vidas. É uma equação inaceitável."
Pelo levantamento da PM, 57% das ocorrências nos três primeiros meses deste ano nas marginais foram em colisões traseiras, condição que pode indicar a influência da velocidade nos acidentes. Na prática, quanto maior a velocidade, maior a distância necessária para um veículo parar.
"Na marginal, a quantidade de faixas é variável, gerando reduções de velocidades, em uma via com limite rodoviário [de 90 km/h]", afirma Ejzenberg, para quem as paradas repentinas podem causar essas batidas.
FATOR DE RISCO
Uma campanha lançada neste mês pelo Detran, órgão de trânsito ligado ao governo Geraldo Alckmin (PSDB), destaca a influência da velocidade "entre os principais fatores de risco no trânsito".
"A OMS [Organização Mundial da Saúde] estima que um aumento de 5% na velocidade média amplia em cerca de 10% os acidentes envolvendo lesões e de 20% a 30% as colisões fatais", afirma a divulgação da campanha do órgão.
O Detran diz que os riscos de um pedestre adulto morrer se atingido por um carro a menos de 50 km/h é de 20%. "Porém a chance de letalidade sobe para 60% se a pessoa for atropelada a 80 km/h."
O capitão Cunha, da PM, considera ainda ser cedo para atribuir a alta dos acidentes nas marginais Pinheiros e Tietê à mudança dos limites.
"A velocidade é um fator que influencia as ocorrências, mas a imprudência dos motoristas ainda é predominante."
Ele cita que 27% das autuações aplicadas a caminhoneiros nas duas marginais foram por mau estado de conservação do veículo, como trafegar com pneu liso.
O presidente da comissão de trânsito da OAB-SP, Maurício Januzzi, cita a ineficiência da fiscalização como fator para acidentes com motos.
Segundo a prefeitura, há 14 radares-pistola usados nas marginais por agentes de trânsito para multar motos. "Essa quantidade é pouca e deixa brechas", diz Januzzi.
O consultor de trânsito Flamínio Fichmann diz que os radares-pistola não são capazes de flagrar excesso de velocidade à noite porque usam um sistema por imagem.
"Seria necessário habilitar os radares fixos para multar as motos nos corredores e realizar mais blitze."
Matéria publicada na Folha de S. Paulo.
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