ARTUR RODRIGUES E RODRIGO RUSSO – FOLHA DE S. PAULO
A implementação de faixas com velocidades diferentes na pista local das marginais Pinheiros e Tietê a partir do final de janeiro aumentará os riscos aos motoristas e não contribuirá para reduzir o número de acidentes. Essa é a avaliação consensual de especialistas em transporte consultados pela Folha.
Para esse grupo, ter dois limites máximos em uma mesma pista (50 km e 60 km/h) contribui para uma maior confusão no trânsito -o que, por sua vez, eleva a possibilidade de acidentes. Com mais ocorrências, fica também prejudicada a fluidez.
"Isso pode não só confundir o motorista como gerar acidentes", declara o consultor em mobilidade Sérgio Ejzenberg, mestre em transportes pela USP. Também crítico da redução de velocidade implementada em junho de 2015 pela gestão Fernando Haddad (PT), Ejzenberg avalia que 60 km/h seria o limite máximo ideal para todas as faixas da pista local das marginais.
"A pista local não pode ter o mesmo limite de velocidade das avenidas Angélica e Morumbi [50 km/h], que têm muitos pedestres, são sinuosas, têm semáforos e são vias de mão dupla", pondera.
Já o engenheiro Luís Antonio Seraphim, consultor de transportes, acredita que qualquer aumento de velocidade seria equivocado, e que o ideal seria não fazer nenhuma alteração aos limites adotados pela gestão Haddad.
"Qual é o ganho ao aumentar a velocidade? Nenhum. Aparentemente, é só para cumprir uma promessa eleitoral mesmo", diz Seraphim, que trabalhou na assessoria técnica da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), órgão ligado ao município.
Outro especialista a defender que não se misture limites na mesma pista é Luiz Carlos Mantovani Néspoli, superintendente da ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos). Ele argumenta que a pista local é uma via urbana com grande quantidade de acessos e que continuará a ter entrelaçamentos durante o trajeto dos motoristas.
"Vai ter gente entrando na avenida, gente saindo da avenida. Como as marginais têm distâncias muito curtas entre uma ponte e outra, entradas e saídas, o importante é que a pista tenha velocidade uniforme", afirma Néspoli.
Durante a apresentação do programa Marginal Segura, o futuro secretário de Transportes, Sérgio Avelleda, afirmou que o aumento de velocidade nas marginais está amparado por questões de engenharia: o projeto e a geometria dessas vias permitiriam velocidades mais altas que as atuais com segurança.
Os especialistas, contudo, refutam esse discurso. "Não levo em consideração só se o projeto permite determinada velocidade ou não, mas penso também na questão de segurança no trânsito, que tornou a redução de velocidade uma tendência mundial. Se você reduz os riscos, reduz também os acidentes sem vítimas e melhora a fluidez", diz o superintendente da ANTP.
Sergio Ejzenberg, por sua vez, afirma que a proposta de Doria não segue o padrão para vias expressas como as marginais. "O padrão para vias expressas urbanas, como a pista expressa da marginal, é 80 km/h. Não há justificativa para colocar 90 km/h, principalmente na marginal Tietê, que tem um projeto geométrico muito ruim, com muitos desvios para a direita e caminhões", observa.
Outro que critica o argumento da futura gestão é Seraphim. "As marginais acabam fazendo papel de vias normais, congestionadas, não vias rápidas. A maior parte das viagens ali é de deslocamentos de até 6 km. Além disso, a geometria não é favorável, há muita declividade, que joga o veículo o tempo todo para fora das pistas."
A PÉ E DE BIKE
Presentes no evento de anúncio das novas medidas, representantes de associações de ciclistas e pedestres criticaram o plano de Doria.
Em nota que assinam em conjunto, a Ciclocidade e a Cidadeapé afirmam que esta "é a primeira vez no mundo em que gestores anunciam a adoção de medidas de acalmamento de tráfego junto com políticas que promovem a insegurança viária".
As entidades reconheceram que algumas medidas de sinalização e o reforço de fiscalização seriam bem-vindos, desde que mantidos os atuais limites de velocidade.
"Combinadas ao aumento dos limites de velocidade, no entanto, são inócuas e mascaram os riscos aos quais todos os usuários das marginais estarão mais expostos." As associações questionam ainda o fato de medidas de segurança terem sido anunciadas apenas para 20 pontos de travessia de pedestres das transversais às marginais -que têm mais de 200 pontos para tanto.
ACIDENTES FATAIS NAS MARGINAIS
Jun.2015 – Mês em que Haddad reduziu limites de velocidade, que antes eram de 70 km/h nas pistas locais e centrais e 90 km/h nas expressas
-52% foi a redução dos acidentes desde a medida
Nenhum atropelamento com morte ocorreu na marginal Tietê de jul.2015 a jun.2016
Fontes: CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), Infosiga, Polícia Rodoviária Federal e Ipea
Matéria publicada na Folha de S. Paulo.