Lista enviada a CPI aponta 294 consumidores que pagavam menos se gastassem mais água; estatal diz que elas poderão ser multadas.
Por Rafael Italiani
Uma lista com 294 grandes consumidores de água que mantêm contratos com a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) mostra que, durante a maior crise hídrica paulista, essas empresas receberam descontos na conta quando consumiram mais. O documento da empresa está com a CPI da Sabesp, da Câmara Municipal.
Segundo a Sabesp, desde fevereiro de 2014 ela parou de assinar novos contratos desse tipo, chamados de “contratos de demanda firme”. Porém, a empresa informou que “mantém os que já haviam sido assinados”. Até aquele mês, os grandes consumidores se comprometiam a gastar pelo menos 500 mil litros de água por mês. Com a crise, a Sabesp informou que liberou esses clientes dessa obrigação e passou a incentivar que as empresas busquem “fontes alternativas” de água.
“Da mesma forma que ocorre com os clientes residenciais, as empresas com contrato de demanda também serão penalizadas com ônus se ultrapassarem a média do consumo.” A multa, cobrada a partir de janeiro, incide sobre o valor da conta após o desconto previsto no contrato – quanto maior a quantidade gasta, menor o preço cobrado do metro cúbico.
A lista divulgada nesta sexta-feira, 13, pelo El País está incompleta – são cerca de 500 empresas. Os descontos são grandes. Uma das empresas que aparecem na lista, a fábrica Viscofan, tem direito a 60 milhões de litros de água por mês. Em dezembro, o valor pago para cada mil litros fornecidos era de R$ 12,54. Sem o contrato de demanda firme, o valor seria de R$ 27,94.
A Viscofan precisa de água para lavar os invólucros que embalam cerca de 20 bilhões de salsichas por ano, de acordo com o diretor comercial da fábrica, Luís Bertoli. “O processo produtivo envolve muita água, mas tudo o que nós usamos é devolvido para a Sabesp, que vende a água para nós outra vez. Na verdade, é um ciclo porque usamos a mesma água”, explicou.
Além da Viscofan, outros grandes consumidores são listados no documento da Sabesp, como shoppings e clubes. Segundo o presidente da comissão de Defesa do Consumidor do Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP), Marco Antonio Araújo Júnior, os contratos são legais, mas devem estar “equilibrados” com o fornecimento da população. “Não acredito que os contratos sejam ruins.” Segundo ele, em períodos de crise, como o atual, os contratos deveriam prever regras, tornando as empresas “sujeitas ao rodízio e a alguma forma de racionamento.”
Incentivo
A demanda firme foi estabelecida em 2002 para clientes comerciais e industriais. Para a Sabesp, ela era uma forma de incentivar os grandes consumidores a comprar água da companhia, em vez de buscar fontes alternativas, como os poços artesianos.
No começo, os clientes precisam consumir mais de 5 milhões de litros por mês. Desde 2010, a Sabesp foi autorizada a celebrar contratos de demanda firme de 500 mil litros por mês.
A companhia explicou, em nota, que “a tarifa praticada para grandes consumidores sempre teve preço maior em comparação a clientes residenciais”. Segundo ela, isso significa que, “em determinados volumes de consumo, a tarifa residencial é quase que totalmente subsidiada pelo valor da tarifa não residencial”. “Um exemplo disso é que, nas maiores faixas residenciais, o preço do metro cúbico de água é de R$ 5,85.”
Matéria originalmente publicada no jornal O Estado de S. Paulo