O Cenpec assiste com preocupação à proposta da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo de reorganização das escolas da rede de ensino estadual, separando os alunos por nível de ensino: fundamental I – do 1º ao 5º ano; fundamental II – do 6º ao 9º ano; e ensino médio. O argumento para tal mudança é o de facilitar a gestão das unidades escolares.
Apesar da separação por níveis de ensino diminuir a complexidade da gestão escolar de fato, a proposta, no entanto, não considera os impactos negativos nas famílias e professores, além de não apresentar medidas para impedir o aumento de alunos por turma. A proposta prevê o fechamento de mais de 90 escolas no estado, o que significa redução de custos e de investimentos em educação. Para as famílias, a proposta acarretará em complicada logística com o deslocamento dos filhos para diferentes escolas, prejudicando a organização familiar e, possivelmente, aumentando os gastos com transporte escolar, além da quebra de importantes vínculos afetivos formados com alunos, professores e funcionários das escolas que frequentam. No caso do deslocamento, mesmo em um raio de 1,5 quilômetro (anunciado como a distância máxima entre as escolas), especialmente nos territórios de alta vulnerabilidade, a mudança pode gerar insegurança entre as famílias. Estudos do Cenpec indicam que nesses locais, principalmente as mães, já empreendem grandes esforços para assegurar a educação de seus filhos.
É sabido também que a transição dos anos iniciais para os anos finais do Ensino Fundamental, bem como do Fundamental para o Ensino Médio são momentos críticos. Por isso, é preciso avaliar o impacto dessas medidas para que elas não resultem em maior abandono e evasão escolar. Além disso, o possível fechamento de algumas unidades precisa ser amplamente discutido com a comunidade, pois muitas vezes a escola é o único equipamento público nos territórios.
Para agravar essa situação, as mudanças foram anunciadas “no susto”, sem que houvesse uma consulta e um debate público, com os diretamente envolvidos e com a sociedade. Famílias, comunidade escolar, governos dos municípios, sindicatos deveriam ter sido ouvidos pela Secretaria Estadual de Educação que tem o dever de promover um debate horizontal sobre o tema. As constantes manifestações de milhares de alunos e de professores, que vem ocupando as ruas da capital paulista, mostram que há um anseio destas pessoas em ter um espaço no qual tenham voz para discutir o assunto.
Vale lembrar que o estado de São Paulo ainda não aprovou seu Plano Estadual de Educação, documento com metas e estratégias que, à luz do Plano Nacional de Educação, aprovado em junho de 2014, estabelece diretrizes a serem seguidas nos próximos 10 anos. São Paulo possui três diferentes versões de PEE, que estão sendo discutidas em audiências públicas realizadas em várias cidades do estado. Curioso notar que uma dessas versões, que é a proposta elaborada pelo Governo do Estado, adicionou (sem que houvesse nenhum tipo de discussão), três metas que chancelam as mudanças já anunciadas na rede estadual de ensino, desconhecidas pelos que participaram do processo democrático de discussão do PEE.
Toda reorganização das redes de ensino tem como objetivo último garantir a qualidade do ensino ofertada aos alunos. A aprendizagem é o ponto primordial nesta discussão. Separar alunos por níveis e faixa etária pode ou não ser uma boa escolha. Quem decide isso não é a secretaria sozinha, mas o conjunto dos envolvidos: alunos, professores, famílias. Esta é uma premissa dos planos de educação.
Frente a este desafio, a transparência e o diálogo com todos os atores envolvidos são fundamentais para não desestabilizar ainda mais a rotina escolar, sobretudo em um ano letivo marcado por uma greve de professores que durou mais de 60 dias. Não há caminho que não passe pelo diálogo. É preciso ouvir toda a comunidade escolar e reconhecer as especificidades e necessidades de cada território.
Texto publicado pelo Cenpec – Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária.