Modelo é a Avenida Rio Branco; ideia é transformar quarteirões subutilizados em áreas para habitações sociais, comércio e serviços
JULIANA DIÓGENES – O ESTADO DE S. PAULO
Um projeto-piloto da Prefeitura de São Paulo propõe a transformação de quarteirões subutilizados na Avenida Rio Branco, no centro da capital, em áreas para habitação social, comércio e serviços. A proposta é um dos Projetos de Intervenção Urbana (PIUs), mecanismos que serão regulamentados hoje por meio de decreto do prefeito Fernando Haddad (PT). O instrumento já estava previsto no Plano Diretor.
O objetivo do decreto é dar novos usos a terrenos vazios ou edifícios não utilizados em áreas com oferta de transporte coletivo. Os próximos PIUs vão propor mudanças na Avenida Santo Amaro, inserida na Operação Urbana Faria Lima, e na Gleba Pompeia, um lote na Barra Funda que integra a Operação Água Branca.
Inserido na Operação Urbana Centro, o PIU Rio Branco delimita mais de 144 mil metros quadrados de terrenos passíveis de intervenção. Na região, 15 imóveis considerados subutilizados pela gestão Haddad já foram notificados pela Prefeitura há cerca de um ano. A área dos imóveis corresponde a quase 12 mil m². Reportagem do Estado publicada no dia 22 mostrou que a capital tem 2 milhões de m² “não utilizados”, “subutilizados” ou “não edificados” – a Prefeitura já havia identificado 1.320 imóveis e notificado 907 proprietários.
Os proprietários têm prazo para recorrer. Os imóveis inseridos no PIU Rio Branco estão sujeitos ao Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios (PEUC), instrumento que permite notificar terrenos não edificados e prédios não utilizados, com a intenção de pressionar os proprietários a cumprir a função social do imóvel.
Para Haddad, “o decreto cria mecanismos para permitir o acesso à terra”. Uma das iniciativas para requalificar o centro com habitação social, conforme destacou o prefeito, já está em andamento. É a parceria público-privada (PPP) firmada com a gestão Geraldo Alckmin (PSDB), que prevê a construção de 1,2 mil moradias populares no terreno da antiga rodoviária da capital, na Luz.
Consulta pública
Com o PIU, o poder público poderá transferir parte dos terrenos da área para que o setor privado construa empreendimentos com base no que a comunidade local deseja. O projeto da Rio Branco ficará aberto a consulta pública a partir da próxima semana.
Segundo o diretor do conselho consultivo do Sindicato da Habitação (Secovi-SP), Claudio Bernardes, o empreendedor interessado no imóvel deverá oferecer o valor mínimo que a Prefeitura gastaria para desapropriá-lo e um porcentual (ainda não definido) de remuneração para a São Paulo Urbanismo – a empresa municipal responsável pelos projetos.
Bernardes explica que o interessado deverá reservar um valor adicional para garantir a flutuação da indenização final. “Isso porque no fim da ação (de desapropriação) pode ser que o juiz arbitre um valor um pouco maior. O empreendedor paga à Prefeitura como se fosse um seguro e, na licitação, quem der o maior seguro ganha”, disse.
“Isso dá a segurança jurídica necessária para o investidor fazer um empreendimento que será de interesse da cidade. Porque o interessante para ele é ter lucro.”
Protagonismo à população
Segundo Luciana Royer, professora de planejamento urbano da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), que acompanhou o debate sobre o PIU, dar o protagonismo à população e o poder à gestão municipal é importante para garantir uma gestão democrática das intervenções urbanísticas.
"Quando o empreendimento trabalha junto com quem mora, usa, trabalha e passa por uma localidade, garantindo participação social, a chance de o equipamento ser apropriado pelos usuários é muito maior", defendeu.
Na avaliação da professora, a proposta é inovadora na forma como está sendo conduzida, mas o conteúdo não é novo. Luciana vê semelhanças do PIU de Haddad com modelos já adotados em cidades do Japão, da Colômbia e da França.
"Uma parte do PIU é inspirado em projetos de Tóquio, mas tem outras inspirações em Bogotá e Medellín também, que é juntar vários interesses, olhar para uma área com diversos proprietários, que tem vários usos, está degradada e tem potencialidades, e trabalhar nessa área, com o poder público capitaneando um programa de interesses que seja executado pelo privado", explicou.
Matéria publicada originalmente no jornal O Estado de S. Paulo.