Encaminhamento foi feito pelo ministro Marco Aurélio, que reconsiderou decisão anterior. Novo entendimento reconhece os conselhos como espaços de exercício da cidadania.
Por Airton Goes, da Rede Nossa São Paulo
O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), acatou os argumentos das organizações que defendem a constitucionalidade dos Conselhos de Representantes nas Subprefeituras e decidiu que o tema deverá ser apreciado e votado pelo colegiado do órgão.
Na decisão, datada de 6 de outubro, mas só tornada pública esta semana, o ministro reconsidera seu parecer anterior e reconhece que os Conselhos de Representantes não criam “cargos, funções ou empregos públicos” – o que seria vedado pela Constituição Federal.
Marco Aurélio afirma ainda em seu texto que o conselho é um “organismo autônomo da sociedade civil”, a ser reconhecido pelo Poder Público municipal “como órgão de representação da sociedade de cada região para exercer os direitos inerentes à cidadania de controle social, fiscalizando ações e gastos públicos, bem como manifestando demandas, necessidades e prioridades na área de sua abrangência”.
Não há definição, porém, de quando a matéria será apreciada e votada pelos ministros do STF.
Importância da nova decisão para a sociedade civil
Na avaliação do advogado Luciano Santos, que é diretor do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral e integrante da Rede Nossa São Paulo, o fato de o ministro aceitar o agravo – petição feita pelas organizações que defendem a constitucionalidade dos Conselhos de Representantes nas Subprefeituras – e decidir levar o assunto ao colegiado do STF, para decisão final, é algo positivo.
“Em sua análise, ele [Marco Aurélio] considerou que a criação dos conselhos não representa ônus para o Executivo”, destaca.
O advogado lembra que a Ação Direta de Inconstitucionalidade da Lei 13.881/2004, que criou os Conselhos de Representantes nas Subprefeituras de São Paulo, está há muitos anos no STF.
“É importante registrar que a futura deliberação do Supremo sobre o tema terá impacto na situação de todos os outros conselhos não previstos na Constituição Federal”, argumenta Santos.
Segundo ele, os municípios, em especial a cidade de São Paulo, têm inovado nos últimos anos, com a criação de vários conselhos de políticas públicas.
A avaliação do diretor do MCCE é compartilhada por Jorge Kayano, pesquisador do Instituto Pólis e integrante do Grupo de Trabalho (GT) Democracia Participativa da Rede Nossa São Paulo. “A reconsideração do ministro é importante porque afasta o risco de outros conselhos, e não apenas municipais, terem sua existência questionada”, diz Kayano.
O pesquisador do Instituto Pólis relata que o próprio Ministério Público Estadual, através do então procurador Márcio Elias Rosa, solicitou ao STF que desconsiderasse a solicitação inicial, de 2005.
Kayano explica que a expectativa das organizações empenhadas nesta questão é que, na votação do mérito da ação, o STF concorde que os artigos 54 e 55 da Lei Orgânica do Município não afrontam à Constituição. “Entretanto, é importante que o Supremo deixe a decisão sobre a Lei 13.881 para a Câmara Municipal de São Paulo, já que agora temos em vigor a lei que criou os Conselhos Participativos Municipais, de 2013.”
Para Américo Sampaio, que também integra o GT Democracia Participativa da Rede Nossa São Paulo, a decisão do ministro Marco Aurélio, de dar prosseguimento ao processo, “desconstrói a argumentação de inconstitucionalidade dos Conselhos de Representantes”.
Em sua opinião, o novo parecer do ministro traz “um ganho” ao debate. “Embora não esteja votando a favor da constitucionalidade da matéria [a votação do mérito será feita quando a ação for julgada pelo colegiado do STF], ele reconhece a importância dos conselhos como espaços de exercício da cidadania e de fiscalização do Poder Público”, explica Sampaio.
Entenda o histórico do processo
Embora tenha sido aprovada pela Câmara Municipal e sancionada, em 2004, na gestão da ex-prefeita Marta Suplicy, a Lei 13.881, que instituiu os Conselhos de Representantes nas Subprefeituras está sendo questionada no Supremo Tribunal Federal (STF).
A Lei Orgânica do Município de São Paulo prevê a participação da população nas subprefeituras por meio dos Conselhos de Representantes. Porém, em 2005, o Ministério Público Estadual ajuizou uma ação direta de inconstitucionalidade (ADIN) contra a criação dos conselhos.
O argumento do Ministério Público é que só o Executivo tem a prerrogativa de criar cargos na administração, ou seja, só a Prefeitura poderia propor a legislação que criou os Conselhos e não a Câmara Municipal. No entanto, pela lei, os conselheiros não receberiam vencimentos e, portanto, não onerariam os cofres públicos.
O Tribunal de Justiça de São Paulo considerou a Lei 13.881 inconstitucional, bem como os artigos 54 e 55 da nossa Lei Orgânica Municipal, que previam a criação dos conselhos e suas atribuições.
Em 2007, a Câmara Municipal entrou com recurso no Superior Tribunal de Justiça, que enviou o caso para o STF, em 2010. Naquela ocasião, o Ministro Marco Aurélio negou o recurso – decisão que ele reconsiderou agora, atendendo as demandas tanto do Legislativo paulistano quanto de entidades da sociedade civil, entre as quais a Rede Nossa São Paulo.
Para contornar a situação, logo no início da atual gestão – do prefeito Fernando Haddad – foi criado o Conselho Participativo, como órgão de representação popular junto às subprefeituras da cidade.
A criação do Conselho Participativo, que já está em seu segundo mandato, foi resultado de uma ampla articulação e mobilização, que envolveu organizações da sociedade civil, vereadores e cidadãos.
Entre as organizações da sociedade civil que participaram ativamente desse processo está o Grupo de Trabalho (GT) Democracia Participativa da Rede Nossa São Paulo. Inclusive, a Rede Nossa São Paulo é uma das organizações que assinam o agravo que, agora, foi acatado pelo ministro Marco Aurélio.